“A nova aproximação às famílias será um dos grandes legados de Francisco”

Austen Ivereigh, biógrafo do Papa e o P. James Keenan, jesuíta americano e teólogo moral, falaram diante de mais de 400 pessoas sobre o modo como o Papa Francisco tem convidado a Igreja a uma conversão no âmbito da pastoral da família.

O auditório do Colégio São João de Brito encheu-se na noite desta última quinta-feira, dia 18 de julho, para a conferência “O Papa das famílias” organizada pela Pastoral da Família da Companhia de Jesus e pela Brotéria. Austen Ivereigh e o P. James Keenan, SJ, juntaram-se para ajudar a compreender o contexto no qual surgiu a exortação apostólica Amoris Laetitia (AL), qual é a visão do Papa sobre a Igreja e sobre a família, bem como o modo como tem sido acolhida e implementada a exortação apostólica em diversas partes do mundo.

Na abertura da conferência, o P. Miguel Almeida, sj, responsável pela Pastoral da Família da Companhia de Jesus, sublinhou que o objetivo do encontro era o de “não deixar morrer a preocupação do Papa com a Pastoral das famílias”. O jesuíta deu vários exemplos de como a ação de Francisco neste campo tem sido impulsionadora de mudanças em diferentes grupos da Igreja portuguesa.

Na sua intervenção, Austen Ivereigh mostrou-se convencido de que “a nova aproximação às famílias será um dos grandes legados de Francisco”. O jornalista inglês enfatizou o facto de não haver com Francisco nenhuma mudança no que respeita à doutrina sobre o Matrimónio. O que a aconteceu foi uma mudança  “na mentalidade da Igreja no que respeita à aproximação da realidade do Matrimónio”. Segundo o biógrafo do Papa, passámos de um modo de encarar o casamento “como uma instituição suportada por uma convenção, pela lei e validado pela Igreja” para a consideração do casamento como “um caminho de conversão e de abertura à graça”. Este modo de olhar “é muito mais próximo do Evangelho”, concluiu Ivereigh. Trata-se de um modo exigente de entender o Matrimónio no meio de uma cultura marcada pela transitoriedade. Para Austen Iverigh mais do que “culpar a cultura” a Igreja deve perguntar-se em que deve mudar “para evangelizar num novo contexto.”.

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O auditório do Colégio São João de Brito encheu-se para refletir sobre a família. Foto: João Ferrand/Companhia de Jesus

Por seu turno, o teólogo James Keenan escolheu sete palavras para sintetizar a visão de Francisco que se reflete na AL. A primeira das palavras escolhida pelo jesuíta foi pastoral. Keenan explicou que na exortação apostólica que se seguiu ao Sínodo da Família “emerge uma nova compreensão da Igreja como profundamente pastoral”. Por outro lado, “a palavra “pastoral” liga o Papa Francisco ao Vaticano II que foi o Concílio de doutrina pastoral”. A dimensão pastoral da Igreja está intimamente ligada à segunda palavra enunciada pelo jesuíta: local. É a cada Igreja local que compete compreender o modo como se deve concretizar o acompanhamento das famílias, sem que isso implique a perda do vínculo com a Igreja universal.

A misericórdia é a decisão de entrar livremente no caos de outra pessoa.

Ao escolher ainda a palavra sínodo Keenan destacou o facto de Francisco apostar claramente numa Igreja que escuta sabendo que “escutar é mais do que ouvir”. Esta atitude de escuta também se reflete na quarta ideia sublinhada pelo teólogo moral, a centralidade da consciência. Recordando o número 37 de AL o teólogo recordou que como Igreja “fomos chamados a formar consciências, não a substituí-las”. No entanto, o jesuíta não deixou de referir que “a consciência verdadeira só funciona com humildade”. O apelo à proximidade e à formação da consciência seriam impossíveis sem mais duas dinâmicas enunciadas por Keenan: discernimento moral e acompanhamento. A última das sete palavras escolhidas por Keenan está profundamente associada ao pontificado do Papa Francisco e é central para compreender AL: misericórdia. Definindo misericórdia como “a decisão de entrar livremente no caos de outra pessoa”, o sacerdote americano sublinhou que antes de nos aproximarmos de outros, precisamos de compreender o que Cristo fez por nós, até onde é que Ele foi.  

James Keenan terminou a sua intervenção dando exemplos do modo como a receção da AL tem transformada as práticas da Igreja em diferentes níveis e contextos. 

Coube ao P. Francisco Mota, sj encerrar  a conferência em nome da Brotéria, sublinhando a importância de organizar momentos de reflexão como este que vão ao encontro das questões com que as pessoas se debatem no dia a dia.

 

Foto de capa: João Ferrand/Companhia de Jesus.