Sonhar em conjunto

Sonhar em conjunto

O sonho é esta palavra quase mágica que representa uma linguagem universal mas, na verdade, não há nada mais pessoal do que um sonho. Isto porque um sonho é mais que uma simples vontade ou desejo: um sonho é mais um caminho que um momento. Um sonho não é algo para agora ou para amanhã.

Este sonho, que para todos tem moldes e formas diferentes (podendo passar por palavras, imagens e ideias e que faz parte de cada um), nada tem de imediato – e não há problema.

O tempo não é um obstáculo ao sonho, não é “o que falta para lá chegar”, mas sim o que mais ajuda a encontrá-lo. Tal como num caminho, o sonho vem com o cansaço que é parte de todo o esforço e trabalho investido. Tal como numa estrada percorrida, o sonho vem com os seus atalhos, com os seus mistérios, com as mudanças de rumo, com os obstáculos (claro) e com os que caminham ao meu lado.

O sonho vem também com Deus, que me deu este tempo para construir o meu sonho com Ele. O tempo não é um embaraço, não é mais um entrave… É antes a oportunidade de ir observando tudo isto e de ir moldando o meu caminho para que o meu sonho se aproxime mais daquele que é o Nosso sonho, aquele que sonhei com Ele.

Nós não temos de construir um sonho sozinhos e a verdade é que nem sempre este caminho é como o idealizámos… Nem sempre sabemos o que procurar quando escolhemos sonhar em conjunto!

Estamos agora a chegar ao Natal e encontramos em Maria um exemplo de quem sonha em conjunto! Maria não pensou que o seu sonho fosse o de se tornar a Mãe do menino Jesus, este menino que veio para nos salvar, mas é isto que é sonhar em conjunto! É ter Deus comigo, a dar forma e tempo ao meu sonho, e a lembrar-me de que, como eu sonho com Ele, Ele também sonha comigo!

Inês Botelho

Esperar a sonhar o sonho dos Gambozinos

Esperar a sonhar o sonho dos Gambozinos

De certeza que quem está a ler este texto já ouviu a palavra vocação e, se for alguém que já fez campos de férias, certamente que já teve um momento de campo em que o tema eram as vocações e “qual será a minha vocação?”. Não quero então alongar-me sobre o que se entende por vocação – para isso há quem saiba muito mais do que eu – e por isso deixo a interpretação do que é uma vocação para quem perceber verdadeiramente disso. Contudo, tenho de escrever este texto que toca no tema da vocação e, por isso, dos vários significados que se podem fazer desta palavra. Aquele que quero realçar é a vocação como um chamamento, no fundo uma vocação é algo a que nos sentimos chamados.

E então e os Gambozinos? Ao contrário do tema da vocação, sobre os Gambozinos (e peço desculpa se isto parece arrogante), já me sinto com mais capacidade para falar. Ao longo dos meus anos como animador, fui ouvindo uma série de formas de definir os Gambozinos. Somos uma associação que tem estatutos e tudo, somos um voluntariado, somos campos de férias, somos um sítio onde as pessoas se sentem em casa. Ora, todas estas coisas têm uma certa verdade e certamente que haverá muitas outras formas de descrever os Gambozinos, mas para mim – e depois de muitos anos a viver isto – os Gambozinos são uma missão. Esta missão pode ser vivida de várias formas e intensidades, tem é de ser vivida de coração cheio e com uma vontade enorme de servir.

Chegando a esta parte do texto, depois de olharmos um pouco para o que é uma vocação e para o que são os Gambozinos, temos de nos perguntar: “existe uma relação entre os dois?” Aqui vou direto ao ponto, existe sim! A missão dos Gambozinos é uma missão pela qual somos chamados e que, por isso, deve ser visto como uma vocação. Isto a mim sempre me ajudou pois ser animador dos Gambozinos não é fácil e é nos momentos de dúvida que nos devemos lembrar que podíamos estar noutro voluntariado, podíamos estar noutro movimento de campos férias, mas não estamos. Escolhemos estar nos Gambozinos e escolhemos isto porque nos sentimos chamados a servir nesta missão e porque olhamos para isto como uma vocação, tendo de ter coragem de assumir que é isto que Ele quer para nós.

Acredito verdadeiramente nisto, que os Gambozinos são uma vocação e quero servir esta missão durante toda a minha vida – com intensidades diferentes, claro – mas sei que continuo a ser chamado e que quero continuar a dizer que sim. Em tudo o que fazemos somos chamados, quer seja a estar na direção nacional ou a arrumar a sede, a ser diretor de um campo, ou a animar um dia de Natal. Não interessa o número de horas ou dias que estamos aqui, interessa que queremos estar porque sabemos que este sonho é maior do que nós.

Eu já sou animador de Gambozinos há quase sete anos e, mesmo que veja isto como uma vocação, admito que às vezes ainda questiono esta missão e se estamos a fazer alguma diferença. No entanto, é exatamente nestes momentos que nos devemos lembrar que o sonho dos Gambozinos não é para nós, não somos nós que vamos colher os frutos, nem somos nós que fazemos a verdadeira diferença. Os Gambozinos existem para Jesus e é por Ele que aceitamos este chamamento. E, enquanto damos o melhor de nós mas não vemos os frutos, só nos resta esperar e sonhar com o momento em que o sonho dos Gambozinos se realiza. E que bom que isto é.

Gonçalo Marques de Almeida

Gambozinos: Amantes furiosos

Gambozinos: Amantes furiosos

Gambozinos: Amantes furiosos; Fiéis ao romance

Os Gambozinos são um grupo de super-heróis que acreditam que os problemas desta civilização terrivelmente equivocada podem ser resolvidos. Eles propõem-se a devolver o Reino aos homens, a encontrar os lugares de Deus no Mundo e a fazer deles morada de todos.

A sua brava dança acontece desta maneira:

Oferecer a todos a possibilidade de um desenvolvimento pessoal, espiritual e humano, através de uma experiência de relação e comunidade que destrói as muralhas sociais e ergue pontes entre margens separadas pelo preconceito, pelo medo, pela indiferença, pela ignorância, pelo mundo. É precisamente este o trabalho de engenharia que distingue os Gambozinos de outro grupo de cariz social.

Estas margens sociais dividem-se por bairros carenciados em Peniche, Braga e Pragal, e pela generalidade da classe média alta de Lisboa, Porto, Coimbra e o resto do País. O desafio assenta no crescimento, fundamentado na espiritualidade inaciana, destas crianças e adolescentes de tal maneira que os muros caiam e surjam possibilidades de relação. Como numa canção do Paulinho Moska, na qual a certa altura o Chico César canta “Todos somos filhos de Deus, só não falamos a mesma língua”.

Há uma intuição fundamental que o projeto é uma coisa assimétrica: o Gambozino é um híbrido, um mestiço, alguma coisa nova que surge da união de partes diferentes, muito diferentes: na cultura, nas raízes, na pronúncia, no desenvolvimento intelectual, na conta bancária, na educação, nos horizontes.

Os Gambozinos exigem, também, uma aliança entre os Animadores e o sonho – do trabalho anual com os núcleos regionais, à experiência privilegiada de relação que são os Campos de Férias no Verão.

É na recusa dos Gambozinos como apenas movimento de campos de férias que são abertas as janelas de uma ideia de família. Ao assumi-lo como uma opção de vida, dizemos que não ficamos satisfeitos com a recordação e queremos, exigimos de nós próprios uma entrega incondicional a esta missão. Cada um à sua maneira, tentando compreender os desafios e de que maneira pode servir o outro, de que maneira pode levar o outro ao lugar de Deus.

Parece-me que, de alguma maneira, como numa história, os Gambozinos têm, também, um princípio, um meio e um fim. E estes têm nome, têm figuras muito concretas que os representam.

princípio traduz-se em Santo Inácio de Loyola: o Risco, a Visão, a Coragem – erguer a cruz como uma espada e levar por diante um sonho, aparentemente, impossível, conseguindo vislumbrar, para lá dos nevoeiros, uma possibilidade criativa e necessária de recuperar Deus para os seus filhos;

meio é São Francisco Xavier: a Paixão, a Compreensão, a Conquista – tal como o Santo Padroeiro dos Gambozinos, também nós nos aventuramos no mar alto das relações humanas. Tal como ele, também nós temos necessidade de procurar a melhor maneira de levar por diante estes objetivos. No Japão, Xavier compreendeu que a melhor maneira de ser aceite na corte do Imperador seria mostrando alguma da avançada tecnologia europeia, uma apresentação formal e cuidada. Também nós vamos percebendo que a melhor maneira de conquistar as realidades mais distantes da nossa vivência passa por compreendê-las para as poder conquistar, e quem diz realidades diz o outro. Este talvez seja um dos grandes desafios dos Gambozinos, o apuramento da sensibilidade. Só assim é possível discernir qual o método para mostrar os lugares de Deus no Mundo a um núcleo, a três rapazes, a uma família, a um bairro, a uma rapariga…;

O fim é o Reino.

 Manuel Barbosa de Matos,

Um desses amantes

Saber parar e recentrar

Saber parar e recentrar

Os animadores dos gambozinos chegam de todos os lados, de todas as idades e de todas as realidades. Uns já trabalham, outros estão na faculdade, uns quase a reformarem-se disto que é animar, outros frescos, prontos para a sua primeira atividade. Aqui nada disso interessa, apenas o seu “sim”, basta. Mas rapidamente se percebe que nestas velocidades diferentes de movimentação do espírito, há que ter tempo para parar, recentrar e perceber em concreto, o que é isto que ando aqui a fazer e para que fui chamado. Este convite a fazermos parte dos gambozinos e, em concreto, de um núcleo, não só nos torna dignos de lá estarmos, pois foi Ele que nos escolheu e nos enviou, como também traz consigo a responsabilidade de estarmos inteiros e não só a ocupar mais uma tarde de sexta-feira.

Neste sentido, os núcleos fazem um serão de formação que se pode limitar a uma tarde ou estender por um fim de semana inteiro, conforme o mais indicado. Este mês, todos os núcleos tiveram o seu serão de formação. Neste, todos são chamados a estar, independentemente da quantidade de campos que já animaram, pois serve para reordenar os corações e também para ambientar os novos animadores. A cereja no topo do bolo é quando o serão termina no bairro, o que dá para alguns animadores matarem saudades dos gambozinos que já não vêm desde o verão e para outros conhecerem os gambozinos que vão animar e as suas famílias, que acabam por também fazer parte.

Sempre ouvi dizer que quem vai sozinho vai depressa, mas que quem vai acompanhado vai mais longe. E, nos gambozinos, temos ido muito longe.

 

Alice Burguete

Fui eu que te escolhi e te enviei

Fui eu que te escolhi e te enviei

Os Gambozinos escolheram como linhas de força para nos guiarem ao longo do ano uma frase tirada do Evangelho de S. João (Jo 15,16): “Fui Eu que te escolhi e te enviei”. Esta frase é dita por Jesus no contexto da Última Ceia, quando estava prestes a entregar a Sua vida, no maior gesto de amor. É fácil de perceber que palavras ditas em tal contexto têm um peso enorme; no fundo, são a vida de Jesus condensada em palavras.

Neste texto – Jo 15,1-17 – Jesus começa por nos dizer para permanecermos n’Ele, como os ramos permanecem ligados à videira. Era muito bom que reconhecêssemos que somos escolhidos, cada um, e que Jesus quer que n’Ele encontremos vida e alegria.

Jesus, que nos escolhe, que Se antecipa, também nos envia, como somos, a sermos sinal do Seu amor e da Sua alegria. De uma forma muito concreta, envia-nos para que os Gambozinos sejam, neste mundo e na vida de cada um daqueles que servimos, sinal da verdade, da liberdade, da justiça, da alegria e da paz do Reino. Somos enviados para que os Gambozinos sejam sinal do Céu.

Jesus precisa dos Gambozinos e dos seus animadores para continuar a fazer maravilhas, para continuar a fazer milagres, daqueles milagres de todos os dias, tão habituais nos Gambozinos.

Por tudo isto, somos convidados a conhecer, a renovar ou a redescobrir a nossa missão nos Gambozinos, confiando neste Deus que Se antecipa, que nos escolhe e envia, que nunca nos deixa sós (como isto é tão verdadeiro nos Gambozinos!). Somos convidados a fazer frutificar as relações entre os ramos, entre animadores e animados, e destes com a videira, lugar da verdadeira vida e da verdadeira alegria.

 

Duarte Rosado, sj

A alegria que colecionámos

A alegria que colecionámos

Num campo somos chamados a servir, quase de uma forma contínua, e, por algum motivo (acho que todos sabemos bem qual é), todos os desafios e tarefas que vão aparecendo sabem sempre a oportunidade para estar melhor e mais inteiro.

Do muito que fui aprendendo e continuo a aprender dos Gambozinos, vai-me sempre sendo relembrado o bom que é poder estar, com leveza e liberdade, ao serviço. Não contabilizar o muito ou pouco que cada um dá e faz, mas treinar o olhar para ver o que cada um oferece de si com admiração e humildade.

De repente, com esta mudança de olhar, fazer um aplauso na roda ganha a mesma força e dimensão que construir uma jangada, consolar um gambozino mais triste ou cortar cebola para o jantar!

Depois deste verão, o convite é regressar a casa, às aulas e ao trabalho, com a Alegria que colecionámos!

Somos chamados a olhar a nossa To-Do List, não como uma coluna entediante e interminável de quadrados, à espera do check que nos dá 2 segundos de tranquilidade e satisfação, mas a olhar os nossos dias, cheios e atarefados, com a leveza de um campo de férias.

Somos chamados a encarar as tarefas rotineiras (e tantas vezes aborrecidas!) com a alegria que descobrimos em lavar a loiça no rio, enquanto conversamos com o gambozino ao nosso lado. A entregar a mesma atenção e resiliência que dedicamos à pessoa nova que conhecemos na roda, aos colegas de turma com quem estamos todos os dias.

Acima de tudo, depois de um verão como o que passou, torna-se quase impossível não regressar com o coração cheio e com vontade de viver os nossos dias de uma forma leve e verdadeiramente gambozínica! No final de contas, como se descobre ao fim de 10 dias de campo, só assim somos verdadeiramente felizes!

 

Marta Pereira