Nota prévia:
Quando a Ginjinha (a chefe da redação do Jornal dos Gambozinos) me ligou a pedir um artigo para o dia seguinte, apeteceu-me, claro, mandá-la passear. Acontece que, quando ela me disse qual seria o tema do artigo, perdi logo a lata…
O tema era o Sim. Melhor: a alegria que vem com o Sim.
(irónico… pois)
Não sei se este era verdadeiramente o tema que estava pensado ou se foi tudo um logro, por parte da Ginjinha, para me convencer a aceitar, mas aceitei a provocação. Afinal de contas, era preciso ser muito Grinch para me recusar a escrever um artigo sobre “A Alegria do Sim”.

 

A Alegria do Sim

Qualquer Sim é antecedido, ora de uma pergunta, ora de um convite. Vamos focar neste segundo cenário: do Sim ao convite.

Há dois momentos de alegria distintos que vêm com cada Sim:

Num primeiro momento, sentimos a alegria de ser convidados. Desde logo, porque qualquer convite é, de certa forma, uma lisonja: significa que alguém acha que somos a pessoa certa para alguma coisa (o que é fixe).
A alegria do convite é a alegria de quem se sente desejado. Há sempre algumas borboletas que começam a circular na barriga quando somos convidados para alguma coisa. Uma borboleta tímida, se formos convidados para uma tarefa banal (“ao menos lembraram-se de mim”), duas ou três, se for um convite para um café com amigos, ou todo um panapaná [PT/BR: bando de borboletas] se o plano for, numa noite de cinema, partilhar um filme com aquela rapariga por quem estamos perdidamente apaixonados.

Há, depois, um segundo momento de alegria:
Quando percebemos que queremos e, antes sequer de dizermos que Sim, já nos inundou a alegria que vem de imaginar o que aquele sim trará: o desenrolar da aventura para o qual se foi convidado. Se, numa primeira fase, estamos felizes por, muito simplesmente, termos sido convidados, logo se segue uma alegria maior, que nasce da antecipação daquilo que se irá viver.
São momentos, mais prolongados ou mais fugazes, em que conseguimos prever o futuro: em que nos vemos com os amigos com quem não estávamos há tanto tempo ou em que quase nos sentimos a dar a mão à pessoa ao nosso lado quando começam a rolar, no ecrã escuro, os créditos finais.

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Ainda nada aconteceu. Ainda nem dissemos que sim. Mas já sentimos, por uma qualquer magia, uma quota-parte da felicidade que o futuro nos reserva.

Mas porquê dizer que sim?
Estamos nós perfeitamente satisfeitos na nossa vidinha e, sem motivo aparente, alguém nos oferece um presente: um convite.
Mas, bolas!, fomos apanhados de surpresa e não temos nada para lhe dar… O Sim é, muito convenientemente, o presente que se pode sempre dar a quem nos oferece um convite.
Não temos de dar um Sim, mas este vem mesmo a calhar….

O problema é que o Sim dá-se, mas, quando caímos em nós mesmos e percebemos que não o devíamos ter dado, é difícil recuperá-lo.
É tenso.
Ninguém gosta de quem falta ao compromisso. Daquele tipo que fica tantas vezes “debaixo de água” que mais valia arranjar um submarino. É preciso ser muito cuidadoso com os Sins que se dá, sob pena de ficar sem stock. Como numa das melhores passagens do Senhor dos Anéis: “like butter scraped over too much bread”.

O Não é uma chatice, embora seja muitas vezes a resposta certa. É uma palavra rude, demasiado redonda, que grita “confronto!”: é o desenhar de um limite, por vezes uma ofensa e, tantas vezes, o prelúdio de uma revolução.
Ainda assim, é o Sim que, muito sorrateiramente, costuma trazer as loucuras que mais se prolongam no tempo. O Sim marca o início de qualquer contrato, salto, aventura, trabalho, ideia posta na prática, de qualquer namoro ou casamento.

(estes dois últimos, claramente, os Sins mais arriscados… com o dia 14 aí à porta é preciso dizê-lo com franqueza)

E há muitos tipos de “Sim”.
Há o Sim eufórico, o Sim de mártir (de quem sabe o que aquilo lhe vai custar e faz questão de o dar a entender), o Sim de quem claramente não percebeu a questão, o Sim apaixonado, entre muitos outros…
Para além disto, há muitos convites que, na prática, não precisam de um “Sim” para ficarem firmados. Muitas vezes basta acordar, ouvir, deixar crescer…
basta um sinal, um gesto
ou um beijo.

Miguel Santos