Visita guiada à torre de Babel

André Dussollier, Pieter Brueghel e Alexandre Schmemann foram convocados para tentar compreender a história da famosa...

André Dussollier, Pieter Brueghel e Alexandre Schmemann foram convocados para tentar compreender a história da famosa...

1. Como mel para a boca

André Dussollier conta a história da torre de Babel, ilustrada por Serge Bloch.
No PRIXM gostámos muito deste vídeo, que dura menos de 5 minutos e é uma ótima forma de praticar esse francês, ou o espanhol (legendas!) ou, quem sabe, o esloveno (mais legendas!)…


2. Um texto bíblico

Em toda a Terra, havia somente uma língua, e empregavam-se as mesmas palavras. Emigrando do oriente, os homens encontraram uma planície na terra de Chinear e nela se fixaram. Disseram uns para os outros:

– Vamos fazer tijolos, e cozamo-los ao fogo.

Utilizaram o tijolo em vez da pedra, e o betume serviu-lhes de argamassa. Depois disseram:

– Vamos construir uma cidade e uma torre, cujo cimo atinja os céus. Assim, havemos de tornar-nos famosos para evitar que nos dispersemos por toda a superfície da Terra.

O Senhor, porém, desceu, a fim de ver a cidade e a torre que os homens estavam a edificar. E disse o Senhor disse:

– Eles constituem apenas um povo e falam uma única língua. Se principiaram desta maneira, coisa nenhuma os impedirá, de futuro, de realizarem todos os seus projectos. Vamos, pois, descer e confundir de tal modo a língua deles que não consigam compreender-se uns aos outros.

E o Senhor dispersou-os dali por toda a superfície da Terra, e suspenderam a construção da cidade. Por isso, lhe foi dado o nome de Babel, visto ter sido lá que o Senhor confundiu a língua de todos os habitantes da Terra, e foi também dali que o Senhor os dispersou por toda a Terra.

Génesis 11,1-9


3. O esclarecimento

Em meados do século XVI, Brueghel cria vários quadros que representam a torre de Babel. Propomos-lhe entrar rapidamente — mas, claro, de modo pertinente­! — no mistério desta pintura tão célebre 🕵️.

 

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Pieter Brueghel, o Velho (1525-1569), A Torre de Babel (1563), Museu Kunsthistorisches, Viena.

| Um monumento, três ideias |

  • O pintor decidiu representar uma torre maciça, de uma verticalidade esmagadora, que contrasta com as vastas planícies de Nínive (ou, melhor, da Holanda). Esta planície onde as pessoas teriam de viver e multiplicar-se resume-se a uma cidade toda orientada para a torre, ao passo que o campo fica ocultado e desaparece na perspectiva.

 

  • O orgulho (a hybris) do homem é representado por esta torre que toca o céu e o cimo do quadro. Algumas nuvens evocam a sua altura vertiginosa, uma vertigem proporcional à dimensão deste projecto humano desmedido.

 

  • Não há nenhum elemento particular que se destaque nesta construção, é sobretudo a uniformidade dos arcos e das aberturas que dá o ritmo a toda a arquitectura. É verdadeiramente uma língua, um projecto, uma arquitectura única.

 

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Detalhe de Pieter Brueghel, o Velho (1525-1569), A Torre de Babel (1563).

| Mais do que uma punição, uma libertação |

Em baixo, à esquerda do quadro, aparece o rei Nimrod que, segundo a tradição, é o impulsionador da construção da torre. Nesta presença discreta revela-se a idolatria e o pecado da humanidade. Vários homens prostram-se diante do rei, veneram-no e suplicam-lhe. Os tijolos brancos que servem para a construção evocam os tijolos que os Hebreus tiveram de fabricar no Egipto e que continuam a ser o símbolo da escravatura.

No mito da torre de Babel, a energia da criação é invertida: já não é o homem que é criado e visitado por Deus. É o homem que sonha tornar-se deus, que acredita poder dispensar Deus. A intervenção de Deus, quando acontece, liberta as pessoas da idolatria e da escravidão: a aparente punição é, de facto, uma libertação.

 


4. E ainda uma palavra final…

“Coisa espantosa: todo o ‘criador’ autêntico é humilde, mas a ‘civilização’ produzida por estes criadores é orgulhosa. O homenzinho que sai do carro turístico para olhar um quadro de Miguel Ângelo declara: ‘Vejam aquilo de que nós somos capazes, nós, a humanidade! Eis o que nós criámos!’ Tudo aquilo que inspirou o artista à humildade (e todo o criador é-o apenas na medida em que permanece ‘humilde’ perante o seu dom de criação) transforma-se em fonte de orgulho para a humanidade”

Alexandre Schmemann, Journal (1973-1983), Cahier IV (Mai 1976 – Mai 1977).

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.


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