Identidades religiosas na Área Metropolitana de Lisboa

Lisboa apresenta-se como uma das regiões onde o peso relativo dos católicos é menor. Coordenador do estudo, Alfredo Teixeira, faz aqui uma análise das principais conclusões.

Lisboa apresenta-se como uma das regiões onde o peso relativo dos católicos é menor. Coordenador do estudo, Alfredo Teixeira, faz aqui uma análise das principais conclusões.

Alfredo Teixeira (coord.)

Helena Vilaça, Jorge Botelho Moniz, José Pereira Coutinho, Margarida Franca, Steffen Dix

– Segundo o estudo Identidades Religiosas na Área Metropolitana de Lisboa (CITER 2018)[1], um pouco mais de metade da população desta região declara-se católica (54,9%). Esta região apresenta-se, assim, como uma das regiões onde o peso relativo dos católicos é menor. Em contrapartida, o número de indivíduos que declara não pertencer a nenhuma religião é cada vez mais significativo, situando-se em quase 35%. Dentro deste grupo, o peso dos não crentes aproxima-se dos 22% e o grupo dos crentes sem religião ultrapassa ligeiramente os 13%, confirmando a sua tendência de afirmação. O conjunto dos crentes fora do universo católico ascende aos 9,2%, número que mostra alguma estabilidade relativamente aos dados anteriores. É então possível afirmar que, nesta região, se verifica uma diminuição da maioria histórica dos católicos, a progressão dos sem religião e a estabilização, em termos gerais, do conjunto das chamadas minorias religiosas.

Número de indivíduos que declara não pertencer a nenhuma religião é cada vez mais significativo, situando-se em quase 35%. Dentro deste grupo, o peso dos não crentes aproxima-se dos 22% e o grupo dos crentes sem religião ultrapassa ligeiramente os 13%, confirmando a sua tendência de afirmação.

– A maior parte população inquirida conheceu na infância, quer na escola, quer na família, algum tipo de socialização religiosa. Essa socialização primária pode contribuir para um mínimo de literacia religiosa e para a manutenção de uma memória religiosa familiar, mas não garante a reprodução das posições religiosas. Para além dos católicos, os sem religião, as Testemunhas de Jeová e, em menor número, os evangélicos/protestantes, conheceram uma ascendência católica.

– Não abundam as trajetórias de alteração de posição religiosa ao longo da vida. Um pouco mais de metade da população inquirida nesta região não conheceu qualquer alteração da sua posição religiosa. A alteração mais acentuada diz respeito aos que deixaram de ser praticantes, mas continuam a acreditar (perto de 24%), indiciando uma certa desarticulação entre crer e pertencer.

– A região de Lisboa é marcada pela experiência da mobilidade territorial. 32,4% da amostra é natural da sua área de residência, 52,4% natural de outros concelhos de Portugal e 15% tem nacionalidade estrangeira. No que concerne aos cidadãos estrangeiros, a população é maioritariamente natural de Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, do Brasil e de países da União Europeia. Quanto aos católicos nascidos no estrangeiro, África é a sua principal origem (66,7%). No caso dos evangélicos/protestantes, sobressai o Brasil (65,8%) como país de origem. A vasta maioria das Testemunhas de Jeová nascidas no estrangeiro provem de África (66,7%) e do Brasil (33,3%). Os muçulmanos nasceram sobretudo em África (66,7%), mas também na Ásia (33,3%).

– As práticas de fim de semana estão entre os fatores que mais caracterizam os estilos de vida. O estudo deu conta de uma certa polarização entre as práticas mais ligadas ao espaço doméstico e à família e as atividades mais associadas ao espaço não-doméstico e ao indivíduo. As práticas religiosas rituais e coletivas não chegam a 12% dos casos. O ato de ir à missa, ao culto ou a outro ato religioso tem um peso similar a outras práticas, como «passar o fim des emana fora» ou «fazer desporto». Em todo o caso, continua a ser mais frequente do que ir a um espetáculo, sair à noite e ter aulas ou estudar.

As práticas religiosas rituais e coletivas não chegam a 12% dos casos. O ato de ir à missa, ao culto ou a outro ato religioso tem um peso similar a outras práticas, como «passar o fim des emana fora» ou «fazer desporto». Em todo o caso, continua a ser mais frequente do que ir a um espetáculo, sair à noite e ter aulas ou estudar.

– Encontram-se alguns indícios de privatização do religioso. Mais de metade dos respondentes não falou, no último mês, sobre assuntos religiosos. Genericamente, o religioso parece ser entendido pelos inquiridos como algo reservado à sua esfera social mais íntima ou privada. Neste contexto, há diferenças importantes entre os católicos e os crentes sem religião e as chamadas minorias religiosas.

– Na análise sobre as redes de amizade, descobriu-se que os católicos estão amplamente distribuídos por todas as posições religiosas – como seria de esperar, por se tratar de uma maioria amplamente inscrita nesta sociedade. Mas também é necessário destacar o facto de um pouco mais de 16% dos inquiridos não saber ou não ter querido responder à pergunta sobre a posição religiosa da maioria dos seus amigos.

– O inquérito mostrou dificuldades em captar o lugar que as Igrejas e outras comunidades religiosas desempenham nas redes de ajuda. Tendo em conta o que se conhece de outros estudos, parece existir uma dificuldade em identificar o enquadramento religioso de muitas ações neste domínio. Quando se cruzam estes dados com as posições religiosas, descobre-se uma certa correspondência entre o envolvimento religioso (frequência à missa, ao culto ou outros atos religiosos) e a consciência de que se beneficia de apoio das Igrejas ou de outras comunidades religiosas.

– Neste estudo, a esmagadora maioria dos indivíduos, praticamente 91%, afirma nunca ter sentido qualquer tipo de discriminação baseada na sua posição religiosa. Entre os poucos que dizem ter sido vítimas de situações de discriminação, as ocorrências tendem a concentrar-se nas esferas de sociabilidade amical e familiar.

Regra geral, os crentes sem religião aproximam-se mais dos pertencentes a uma religião do que dos não crentes – é nesta população que mais se aprofunda uma certa desarticulação entre os planos da crença e da pertença.

– Como seria de esperar, é no domínio das crenças que se evidencia um contraste maior entre os não crentes (indiferentes, agnósticos e ateus) e os crentes (incluindo os crentes sem religião). Por um lado, o primeiro conjunto tende a discordar das afirmações que pressupõem a existência de Deus, mostrando uma inclinação para entender Deus como uma criação humana ou ainda para a identificação de Deus com a natureza. Por outro lado, mostra uma maior confiança na ciência e na democracia. Regra geral, os crentes sem religião aproximam-se mais dos pertencentes a uma religião do que dos não crentes – é nesta população que mais se aprofunda uma certa desarticulação entre os planos da crença e da pertença.

– Segundo este estudo, 32,3% da população inquirida não apresenta indícios de qualquer prática orante, enquanto 49,3% apresentam uma prática regular de oração. Observou-se que as práticas orantes tendem a distribuir-se por uma grande parte da população inquirida, sob formas preponderantemente individualizadas e espontâneas.

– A prática cultual distribui-se de forma precária nesta população. 15,8% dos católicos declaram ir uma vez por semana ao culto. Mas, tendo em conta a autonomia com que parte dos católicos gere o seu regime de prática cultual, é importante não esquecer o peso dos que declaram frequentar o culto comunitário uma a duas vezes por mês (13,3%). As frequências relativas à prática cultual dos evangélicos/protestantes documentam a vitalidade destas comunidades. A prática cultual comunitária, no seu ritmo semanal, é mencionada por 25% dos pertencentes a este conjunto denominacional. Para além disso, 35% destes fiéis declaram frequentar o culto comunitário mais do que uma vez por semana.

– A religiosidade tende a ser uma prática de proximidade. 67% da população crente pertencente a uma religião, frequenta lugares de culto que estão localizados na sua área de residência e apenas 33% frequenta contextos cultuais que estão fora do seu perímetro residencial.

– Neste estudo, apenas uma pequena parte da população inquirida entende que frequentar os lugares de culto é uma obrigação (1,4%). A crescente autonomia face às instituições religiosas, a par da liberdade crescente no que diz respeito às práticas cultuais comunitárias, faz com que as questões religiosas sejam cada vez mais compreendidas como uma opção pessoal e menos como um dever ou obrigação.

[1]A conceção do questionário, bem como a definição da estrutura do projeto de investigação, esteve a cargo do Centro de Investigação em Teologia e Estudos de Religião da Universidade Católica Portuguesa (CITER). O processo de construção da amostra, aplicação do questionário e constituição da base de dados foi conduzido pelo Centro de Estudos e Sondagens de Opinião (CESOP) da mesma universidade. Para além da Fundação Francisco Manuel dos Santos, este projeto contou com o apoio da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e do Patriarcado de Lisboa.

 

Conheça melhor este estudo consultando o DOCUMENTO da Fundação Francisco Manuel dos Santos.

Conheça melhor este estudo consultando a INFOGRAFIA do Fronteiras XXI.

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.