Quando, em 2019, o Papa Francisco, convidou os jovens economistas, empreendedores e agentes de mudança de todo o mundo para um encontro em Assis, onde se buscaria “uma economia diferente, que faz viver e não mata, inclui e não exclui, humaniza e não desumaniza, cuida da criação e não a devasta”, estávamos longe de imaginar que esse encontro teria de ser adiado três anos devido a uma pandemia causada por um vírus respiratório. Estávamos também longe de imaginar que esse evento adiado, que podia ter morrido perante todas as dificuldades, se tornaria num movimento mundial com milhares de jovens do mundo inteiro envolvidos. Da mesma forma, havia alguma dificuldade em compreender o que era esse movimento chamado “Economia de Francisco”.
Três anos depois, entre 22 e 24 de setembro, foi finalmente possível encontrarmo-nos em Assis, mais de 1000 jovens de 120 países! Durante três dias, Assis foi uma verdadeira aldeia global, onde se partilhou uma vocação comum a criar uma nova economia, talvez com mais perguntas que respostas.
Ao contrário do que se possa pensar, a Economia de Francisco não é uma nova ideologia político-económica ou o pensamento económico do Papa Francisco posto em prática; tampouco tem soluções “prontas a vender” para os desafios que hoje enfrentamos.
Ao contrário do que se possa pensar, a Economia de Francisco não é uma nova ideologia político-económica ou o pensamento económico do Papa Francisco posto em prática; tampouco tem soluções “prontas a vender” para os desafios que hoje enfrentamos. A Economia de Francisco, cujo nome deve ao santo de Assis, é simplesmente uma comunidade global de jovens que partilham o desejo e o empenho de promover uma economia que não deixe ninguém para trás, cuide da casa comum e seja geradora de paz. O seu mérito, como disse o Papa no encontro com os participantes, foi “reuni-[los], dar-[lhes] um horizonte mais amplo, fazê-[los] sentir parte de uma comunidade mundial de jovens que têm a mesma vocação”. Parece pouco, mas é muito. Porque, se nos encontramos com outras pessoas que partilham connosco a missão, mesmo que os pontos de vista e os lugares de origem sejam muito diferentes, ganhamos ânimo – pois descobrimos que não vamos sozinhos – e torna-se possível o diálogo, de onde podem surgir muitas ideias e oportunidades de colaboração.
Um projeto muito concreto que nasceu da Economia de Francisco, por exemplo, é a Farm of Francesco, criada por 9 jovens de 8 países diferentes, que procura praticar uma agricultura mais resiliente, sustentável e justa, enquanto defende as preocupações dos agricultores em eventos internacionais como a COP26. Existe já uma “quinta-piloto” na Nigéria. A Economia de Francisco é, pois, um processo, um lugar de encontro e profecia, que abre caminhos novos de pensamento e trabalho em conjunto.
Estar em Assis permitiu sentir esta comunidade de forma mais real, já sem a distância dos ecrãs, e ganhar novo fôlego para o tanto que há para fazer, em Portugal e no mundo. A presença do Papa foi também muito animadora, pela sua visão entusiasmante e pela confiança que deposita nos jovens, que desafiou a serem “artesãos e construtores da casa comum”: “isto vos digo a sério: conto convosco! Por favor, não nos deixeis tranquilos, dai-nos o exemplo! E eu digo-vos a verdade: para viver sobre esta estrada, quer-se coragem e, às vezes, uma pitada de heroicidade.”
Mas não é só o Papa Francisco que confia na juventude, é também o próprio Deus: na Bíblia, são muitos aqueles que o Senhor chama ao seu serviço para grandes missões, quando são ainda jovens, tais como Samuel e Jeremias, Ezequiel, Daniel ou David.
O encontro de Assis foi também ocasião de o Papa Francisco assinar com os jovens um pacto pela Economia, que aponta linhas orientadoras para o futuro, que faziam falta ao movimento.
O encontro de Assis foi também ocasião de o Papa Francisco assinar com os jovens um pacto pela Economia, que aponta linhas orientadoras para o futuro, que faziam falta ao movimento. Não sendo diretrizes rígidas, são linhas de fundo inspiradoras, que apontam o fim a que aspiramos – uma “economia do Evangelho” –, mas sem definir os meios para lá chegar. De facto, os desafios da economia de hoje não se comprazem com as soluções de sempre já predefinidas.
Com o horizonte bem claro, porém, será mais fácil de avaliar se estamos a ir pelo caminho certo ou não. E, neste caminho, podem surgir soluções de todo o tipo, quiçá totalmente novas e cruzando fronteiras de pensamento, se tivermos o espírito aberto e livre de preconceitos ideológicos. Na linguagem do Princípio e Fundamento, trata-se de ter bem presente o fim a que apontamos e de usar os meios tanto quanto eles nos ajudem a alcançar esse mesmo fim.
A Economia de Francisco é, pois, um movimento a fazer-se, um exercício de diálogo e de salvar a proposição do próximo, cheio de perguntas e à procura de respostas, com os olhos postos no Bem Comum, inspirado no Evangelho e em S. Francisco de Assis. É e quer ser um movimento liderado por jovens – apoiados por seniors, certamente –, que dá voz às periferias e a várias dimensões da realidade, abrindo-se à novidade que daí possa vir. Por isso, com alguma ousadia, podemos mesmo dizer que a Economia de Francisco encaixa perfeitamente e nos dá um modelo inspirador para abordar a terceira preferência apostólica da Companhia de Jesus: “acompanhar os jovens na criação de um futuro promissor”.
Fotografia de Beth Macdonald – Unsplash
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.