1. Como mel para a boca
No último vídeo de Maître Gimms, La même, Vianney diz uma frase evangélica «Podemos amar até os nossos inimigos». Partimos à descoberta da origem da letra desta música no Evangelho segundo S. Mateus.
2. Um texto bíblico
Este texto situa-se na continuação do Sermão da Montanha (onde se encontra, entre outros, o texto das Bem-Aventuranças).
«Ouvistes o que foi dito:
– Olho por olho e dente por dente.
Eu, porém, digo-vos: Não oponhais resistência ao mau. Mas, se alguém te bater na face direita, oferece-lhe também a outra. Se alguém quiser litigar contigo para te tirar a túnica, dá-lhe também a capa. E se alguém te obrigar a acompanhá-lo durante uma milha, caminha com ele duas. Dá a quem te pede e não voltes as costas a quem te pedir emprestado.»
«Ouvistes o que foi dito:
– Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo.
Eu, porém, digo-vos:
Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem. Fazendo assim, tornar-vos-eis filhos do vosso Pai que está no Céu, pois Ele faz com que o Sol se levante sobre os bons e os maus e faz cair a chuva sobre os justos e os pecadores. Porque, se amais os que vos amam, que recompensa haveis de ter? Não fazem já isso os cobradores de impostos? E, se saudais somente os vossos irmãos, que fazeis de extraordinário? Não o fazem também os pagãos? Portanto, sede perfeitos como é perfeito o vosso Pai celeste.»
Mateus 5, 38-48
3. O esclarecimento
| Confronto de titãs entre Amos Oz e Hilário de Poitiers |
Uma das personagens de Uma pantera na Cave, um romance de Amos Oz (1939-2018, escritor israelita), oferece-nos um ponto de vista cáustico sobre o amor aos inimigos:
«Amar o inimigo é pior do que passar informações.
É pior do que trair os seus irmãos.
É pior do que denunciar.
É pior do que lhe vender armas.
É ainda pior do que tornar-se desertor.
Amar o inimigo é a pior das traições.»
Amos Oz, Uma pantera na Cave, trad. de Sylvie Cohen, Gallimard : Paris, 2004.
Hilário de Poitiers, Padre da Igreja do século IV, prefere ver no amor aos inimigos uma solução para a violência. Eis o que escreve no seu comentário ao Evangelho de Mateus:
«A fé quebra os movimentos de violência no espírito do Homem, não apenas impedindo-o de se vingar furiosamente, como também apaziguando-o até conseguir amar aquele que não tem razão».
O amor pelos inimigos pedido por Jesus é uma das maiores exigências do Evangelho. É uma exigência de tal forma elevada que é sinal de filiação divina. Aquele que alcançar este amor é filho de Deus. E Aquele que profere este discurso é:
- Aquele que se deixará cruxificar pelos seus inimigos em silêncio, sem oferecer resistência;
- Aquele que manifestará em simultâneo o amor pelos inimigos e a Sua filiação divina, aceitando a cruz.
4. E ainda uma palavra final…
A grande Hannah Arendt fala-nos sobre a essência da ação humana e do caráter inesperado do perdão:
«Ao contrário da vingança, que é a reação natural e automática à transgressão e que, dada a irreversibilidade do processo da ação, pode ser esperada e até calculada, o ato de perdoar nunca pode ser previsto; é a única reação que atua de modo inesperado e, por isso, sem deixar de ser uma reação, conserva algo do caráter original da ação. Por outras palavras, o perdão é a única reação pela qual não se re-age apenas, mas se age de maneira nova e inesperada, sem ser condicionada pelo ato que a provocou e que consequentemente liberta tanto o que perdoa como o que é perdoado».
Hannah Arendt (1906-1975, filósofa alemã de origem judaica),
A Condição Humana, trad. de Condition de l’homme moderne,
Calmann-Lévy Agora : Paris ,1988
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.
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