Advento: a escola do inesperado

Ilumina-se a quarta vela e poderíamos pensar: já está! Mas há ainda advento por viver. E no encontro de Maria e Isabel talvez possamos aprender alguma coisa sobre o inesperado como lugar em que Deus se revela.

Ilumina-se a quarta vela e poderíamos pensar: já está! Mas há ainda advento por viver. E no encontro de Maria e Isabel talvez possamos aprender alguma coisa sobre o inesperado como lugar em que Deus se revela.

As velas foram-se acendendo uma a uma. Chegámos ao quarto domingo do advento, ilumina-se a quarta vela e poderíamos pensar: já está! Mas há  ainda advento por viver. E no encontro de Maria e Isabel talvez possamos aprender alguma coisa sobre o inesperado como lugar em que Deus se revela.

Foi inesperada a gravidez de Maria. Veio antes do tempo e foi sinal de um modo inimaginável de Deus se revelar. Deus importa-se com a nossa humanidade e habita na vida de uma jovem como outra qualquer, sem estatutos ou pergaminhos. Maria não se sentia preparada. Aquele inesperado superou-a. Mas ela não disse: “esquece Senhor, não sou capaz”, disse antes: “Aqui estou, faz Tu”. A consciência claríssima do seu limite não foi razão de bloqueio, mas antes de assentimento, de confiança e adesão. E foi também ponto de partida, saída apressada ao encontro de Isabel.

Os nossos limites e inesperados são muitas vezes razão de bloqueio, desistência e fechamento. Pensamos que já não há nada a fazer por nós, desistimos da possibilidade da nossa conversão. Podemos até achar que as guerras interiores, que tantas vezes nos aprisionam e dividem, nos tornam indignos de sair ao encontro dos outros. Maria processou o inesperado e a consciência da sua pequenez (“eis a serva”) confiando, saindo, indo ao encontro.

Foi inesperada a gravidez de Isabel. Veio depois do tempo. Uma mulher, idosa, a quem haviam chamado estéril é também lugar em que se revela o inesperado de Deus. Ao acolher em si esta surpresa, Isabel torna-se sensível ao modo de atuar de Deus. E a sua voz pode também ser eco do Espírito Santo, capaz de reconhecer a presença que Maria trazia no seu seio.

Talvez a nossa indiferença à presença de Deus, a dificuldade em encontrá-lo se deva ao desfoque das nossas expectativas: esperamos Deus no programado, nas “pessoas apropriadas”. Não ouvimos a voz e o sopro do espírito nas vidas que há muito etiquetámos de estéreis.

Não há limite, nem inesperado mais forte do que a escolha de Deus pela humanidade, do que a sua decisão de ser Deus connosco. Não há esterilidade mais forte do que a ação do Espírito da vida.

Esperamos Deus. E Deus espera-nos para que o possamos encontrar em todos os nossos inesperados. Ainda há advento por viver. Que o possamos atravessar aprendendo a viver o inesperado como lugar em que Deus se revela. Deus escolheu Isabel e Maria. E nestas mulheres arriscou inscrever a Sua imagem, a Imagem de Jesus escondido no mais pequeno e humilde, o Filho que se manifesta como servo de todos.

É escondendo-nos, sendo servos, reconhecendo-nos como filhos que podemos, com Maria e Isabel, aprender a viver o inesperado.

Fotografia: Adrien Olichon – Unsplash

 

 

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.