Não podemos ceder ao medo

No dia Mundial do Refugiado, que hoje se assinala, o Serviço Jesuíta aos Refugiados (JRS) lamenta que a Europa continue a falhar no acolhimento das pessoas. E diz que estas devem ser vistas como um bem e não uma ameaça.

Todos os anos, por ocasião desta data, o Serviço Jesuíta aos Refugiados (JRS) apela a uma posição de solidariedade, hospitalidade e respeito pelos Direitos Humanos de todos os que procuram na Europa um local seguro para recomeçar as suas vidas e esperar, se for o caso, pelo regresso aos seus países de origem em paz. Hoje, à luz dos recentes acontecimentos nas fronteiras da Europa, e numa altura em que ressurgem discursos xenófobos e populistas e ações que os materializam, violando completamente os Direitos Humanos e o Direito Internacional, é necessário, mais do que nunca, reforçar esta mensagem e tomar uma posição.

A Europa não pode continuar a falhar. A União Europeia (EU) tem revelado, desde o início da intitulada “crise” de refugiados, no final de 2015, falta de planeamento e preparação para o acolhimento de um maior fluxo migratório do que o expectável e, principalmente, uma grande falta de solidariedade entre os seus Estados-Membros. O mecanismo de recolocação de emergência criado pela UE para levar a cabo a distribuição de requerentes de asilo da Itália e da Grécia, países mais sobrecarregados com o fluxo migratório, é disso exemplo e, concretamente, reflexo das condições de acolhimento completamente díspares entre os diferentes países. É preciso, por isso, que haja uma real solidariedade entre os Estados-Membros, uma resposta coesa e um planeamento a longo prazo, que aposte nas vias de acesso legais e seguras à Europa, e não apenas em planos de emergência ou respostas securitárias que condicionam ainda mais o impacto que esta realidade tem na opinião pública. As respostas de violência, hostilidade e desconfiança não têm prevenido ou impedido os movimentos migratórios.

Não podemos ceder ao medo.

Podemos, sim, aprender com os exemplos positivos que daqui advieram, nomeadamente a ação de alguns países. Entre eles, Portugal, que tem feito um esforço louvável principalmente através de uma mobilização notável da sociedade civil que criou respostas, por todo o país, para o acolhimento de cerca de 1500 pessoas. Esta experiência tem, no entanto, de nos levar também a fazer um balanço do acolhimento que olhe para lá da vontade, disponibilidade e hospitalidade que marcou este processo. O governo português anunciou recentemente a reinstalação de 1010 refugiados atualmente a viver na Turquia e no Egito, pelo que é necessário refletir sobre o que passou e o que ainda é preciso melhorar para estarmos preparados para o futuro. Temos de aprender com os erros da Europa e conseguir acionar um plano estruturado de acolhimento que desburocratize alguns processos essenciais para a integração, nomeadamente os de concessão de asilo, para que o país possa estar mais preparado do que está atualmente.

Por fim, defendemos que estas pessoas têm de ser vistas como um bem para as sociedades e não como uma ameaça. Defendemos também que comecemos a mudar a narrativa. Há milhares de pessoas por toda a Europa que abriram as suas portas, que deram a mão a seres humanos fragilizados e que viram o seu potencial. Há casos de refugiados que, sem nada, conseguiram criar o seu próprio trabalho, aprenderam a língua do seu país de acolhimento e que fizeram e fazem todos os dias os possíveis para se integrarem. Falta contarmos mais histórias destas.

Hoje, foi divulgado também um manifesto sobre refugiados e migrações, assinado por várias organizações católicas. O JRS foi uma delas. O documento pode ser lido aqui.