18 Jan 2018 | Testemunhos de Gambozinos e Famílias
Um campo de “Gambozinos”!
Corria o ano de 1997 (ou seria 98). Fomos desafiados para fazer um campo de férias de “Gambozinos”? Repita lá isso! Mas o que eram os “Gambozinos”? Até àquela data gambozinos eram aquelas “coisas” imaginárias, que nas noites das férias (normalmente de Verão), em casa dos nossos avós, desafiados pelos primos mais velhos (ou mesmo algum tio mais brincalhão), fingíamos que caçávamos no jardim. Às escuras, sem lanterna, procurávamos nas sombras “coisas” que não tínhamos a certeza se existiam e nas quais não sabíamos se havíamos ou não de acreditar (sem nunca dar “parte fraca”, claro… que podia dar mau resultado)! Não nos lembramos bem como acabava a “caça”, e que sustos levávamos, pelo meio, até nos esquecermos completamente desses tais de gambozinos até ao próximo Verão, ou até nos atrevermos a assustar algum outro mais novo do que nós…
Nesse ano, contudo, tudo mudou. Venham fazer connosco um “campo de Gambozinos” foi a proposta do Lourenço Eiró! Um campo que mistura gente de sítios e realidades diferentes, juntos no essencial. Já tínhamos participado em campos do Camtil e dos Campinácios (já sabíamos que um campo era sempre uma semana inesquecível, uma semana de aproximação e de maior intimidade com Deus, em companhia com outros. Uma semana que não queríamos nunca ver terminar). Vamos a isso!
Assim foi, o local foi fácil de arranjar, a Quinta do Pouchão, em Abrantes. Muita sombra, muita água (de uma lagoa e de um tanque), bons sítios para o jogo do Pisca (sem este jogo não havia campo) e muita alegria! O Lourenço liderava as tropas e o Abel Bandeira era o capelão, de sorriso largo e viola em punho. Os animadores vinham de sítios diferentes (Lisboa, Santo Tirso, Coimbra, Braga e Viana do Castelo!). Mas o melhor foi, sem dúvida, o conjunto dos participantes: vieram de Lisboa (do Colégio de São João de Brito) e de Braga, muito diferentes e, afinal, todos iguais – de coração cheio e luz própria, prontos para a alegria verdadeira. Gambozinos, de raça, a sério. De quem nunca mais nos esquecemos.
18 Jan 2018 | Testemunhos de Gambozinos e Famílias
O Célio Dias, um gambozino judoca do Pragal agora com 23 anos, marcou presença nos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro. Alegramo-nos muito com as suas conquistas e quisemos saber mais sobre elas.
Como foi o percurso antes dos Jogos Olímpicos e como foi chegar ao Rio de Janeiro como atleta olímpico?
Chegar aos Jogos Olímpicos e ter a honra (e orgulho!) de representar Portugal no mais importante evento desportivo do Mundo foi a melhor experiência da minha carreira; nunca me tinha sentido tão agradecido, não só pelo meu talento, mas também pelo facto de viver a experiência na primeira pessoa – como protagonista. O percurso até este objetivo foi sinuoso como qualquer outro – as dificuldades fazem parte de tudo na vida -; no entanto, voltaria a repetir todos os treinos e ultrapassar todos os obstáculos para estar novamente nesse palco – como disse um amigo meu – de sonhos.
O que mudou agora na tua vida? Há um antes e depois de ser atleta olímpico?
Infelizmente, perdi na primeira ronda na fase de qualificação. Foi uma experiência muito dura; portanto, sim: existe um antes e depois de ser atleta olímpico. O que existe em mim de diferente é a aceitação de que mesmo quando fazemos tudo certo, há fatores que não conseguimos controlar – o meu adversário, no meu caso. Temos que ter a humildade de aceitá-lo e guardar todos estes “desaires” como lições para a nossa vida. Como diz Oprah Winfrey: nós nunca erramos ou perdemos, ganhamos sempre.
Ser gambozino influenciou a tua postura nos J. O. ou em alguma parte da tua vida? Se sim, como?
A experiência dos Gambozinos influenciou a minha vida em dois sentidos: Muitas vezes, temos que ter a capacidade de ver para além da realidade; no meu caso, sempre acreditei que existia um projeto maior para além do dia a dia decadente no bairro. Neste sentido, os Gambozinos foram a primeira de muitas concretizações desta ambição pois desde muito cedo tive a oportunidade de viver experiências e conviver com o “diferente”, sair da minha zona de conforto. Por outro lado, sendo eu anteriormente bastante individulista, foi aqui – nos Gambozinos – que percebi como trabalhar em equipa é muito mais gratificante do que um percurso solitário – uma lição essencial no meu percurso como atleta de alta competição: “Se queres ir rápido, vai sozinho. Se queres ir mais longe, vai junto”.
Que mensagem deixas aos gambozinos mais novos?
Quero deixar duas mensagens. A primeira: “Saiam da vossa zona de conforto”. Enquanto atleta de alta competição, ao realizar os treinos que não gosto (treino de ginásio e treino cardiovascular), ao permitir-me sair da minha zona de conforto, foi nesses momentos que evolui mais e cresci como pessoa. O Judo (“via da suavidade” em japonês) é uma proposta de caminho para a felicidade tal como são os Gambozinos. Por isso, quero dizer aos mais novos: “Tenham a coragem de sair e ver o mundo à vossa volta”. Segunda mensagem: “Lutem sempre – sempre – pelos vossos sonhos”. Isto funciona como o imperativo categórico de Kant: não existe outra forma de viver a vida sem ser a lutar por aquilo que mais nos apaixona nela.
Célio Dias
18 Jan 2018 | Testemunhos de Gambozinos e Famílias
Tudo começou quando faltavam vagas para um tal minicampo dos gambozinos (mal sabia eu o que era aquilo) e fui, por isso, chamada para embarcar nessa aventura. Foi um acantonamento de 4 dias a cantar, a rir, a aparvalhar, a rezar, e que começou a fazer de mim uma gambozina.
Alguns anos se passaram (anos esses em que a atividade gambozínica se baseava nas Tardes Fixes e nos minicampos do núcleo Norte) até que – finalmente! – atingi a idade para poder fazer o meu primeiro campo. Um campo é muito diferente de um minicampo, logo a começar pelos 6 dias de diferença entre os dois. Para além desta diferença, um campo é no meio do mato, o que significa que o nosso quartinho é substituído por uma tenda, que a banheira passa a ser o rio e que a casa de banho dá lugar à latrina.
Todas estas mudanças faziam crescer em mim uma emoção muito esquisita (qualquer coisa entre o entusiasmo e o medo). Foi assim que eu parti para uma aventura nova e, digo-vos, que quando regressei à estação de comboios com a cara preta, com uma mochila gigante às costas, mas com um sorriso enorme, apesar do meu cansaço, nunca mais fui a mesma pessoa. Tinha mudado. Havia qualquer coisa no meu olhar que era diferente.
Na altura não percebi como é que um simples campo no meio da floresta poderia mudar tanto uma pessoa, mas agora, passados 3 anos depois do meu primeiro campo (cada um deste 3 anos com mais um campo pelo meio), consigo perceber que os Gambozinos são, de facto, muito especiais. Ensinam-me a aceitar e a viver com as diferenças dos outros. Dão-me a oportunidade de criar novas AMIZADEs; de estar em contacto com a NATUREZA e de perceber como ela é tão bela; de me pôr ao SERVIÇO dos que me rodeiam; e de conhecer DEUS cada vez melhor.
18 Jan 2018 | Testemunhos de Gambozinos e Famílias
Olá! Sou a Ana, tenho 16 anos e vivo no Pragal. Venho aqui falar um pouco sobre o quanto os Gambozinos me ajudaram. Os Gambozinos é uma comunidade em que nos ajudam muito, ensinam a saber estar, a saber esperar, a saber partilhar e além de tudo ajudam-nos a conhecer melhor a nossa pessoa. Para mim os Gambozinos ensinaram-me a deixar de ser teimosa, a deixar de ser respondona e ajudaram-me na relação em casa, desde ajudar a mãe até brincar com os irmãos e também apoiaram imenso as explicações na igreja do Pragal. Nos Gambozinos preocupamo-nos uns com os outros!
Bem, eu vivo num bairro. Para os que falam dos bairros como ambientes não apropriados para crianças, isso não é verdade. Porque eu vivo num bairro e até gosto de viver lá mas penso em sair de lá, quero ter uma casa, um carro, as minhas coisas. Por mim, não quero depender “de ninguém”; percebi isso quando entrei num curso de apoio técnico de ação educativa, pois eu quero ajudar as crianças que não têm uma infância equilibrada. Os meus amigos, muitos deles afastaram-se de mim porque eu comecei a estudar mais, a deixar de faltar às aulas. Para mim foi difícil porque para mudar radicalmente a minha pessoa e os meus objectivos tive de me entregar a Deus e os Gambozinos estiveram sempre presente, para me ajudar a sério, sim, eu acho que muitas pessoas concordam com o meu novo “eu” e algumas devem estar orgulhosas.