“Sinto necessidade de expansão do papel dos leigos mais jovens”

Ana Mano Costa, do CNE, pede mais protagonismo e autonomia para os jovens, nomeadamente nas paróquias, onde ajudam a unir a dimensão paroquial à vida dos grupos e movimentos. E defende alternativas para quem já não estuda mas não casou.

Ana Mano Costa, do CNE, pede mais protagonismo e autonomia para os jovens, nomeadamente nas paróquias, onde ajudam a unir a dimensão paroquial à vida dos grupos e movimentos. E defende alternativas para quem já não estuda mas não casou.

Como descobriste a Igreja? 

Sinto que ainda estou a descobri-la. Esta Igreja tão diversa, espalhada por tantos lugares e rostos, continua a surpreender-me a cada dia. É sempre uma novidade! São tantas as pessoas, comunidades e movimentos que a constituem que me sinto pequenina ao lado de tamanha grandiosidade e riqueza. Ainda descobri tão pouco e tenho tanta vontade de descobrir muito mais!

A minha história de Amor com Jesus, e desse Amor através da Igreja, começou na minha família. Não somos todos católicos em casa por isso, desde cedo, a semente de Jesus que foi em mim plantada, teve de ser regada e muito bem cuidada ao longo dos anos. Graças a este Amor, foi uma semente que cresceu.

A minha paróquia foi um terreno bem lavrado e preparado para acolher este crescimento. O meu grupo de amigos mais próximo foi também, com a graça de Deus, um adubo ultra discreto mas muito eficiente que me acompanhou em cada aventura em que fui dizendo o meu “SIM”.

Depois de crescer nessa terra fértil, com tantos nutrientes e cheio da Graça de Deus, descobrir a Igreja foi como olhar à volta e perceber que eu não era a única planta do jardim mas que havia centenas, milhares, milhões ali à volta. E o melhor: cada uma delas tinha uma história de amor única com Jesus, diferente da minha, mas com uma Beleza singular e irrepetível.

Como vives a fé no dia-a-dia, na escola, no trabalho, em casa?

Procuro que o meu trabalho e a minha família sejam os cenários privilegiados de missão como católica. São Francisco de Sales diz-nos que o Senhor nos chama à “perfeição extraordinária das práticas ordinárias da vida cristã”.

Sou estudante, por isso desvendar Jesus na faculdade é um desafio que requer que nos recriemos a cada novo dia. A postura com que estamos numa aula, a dedicação ao estudo, a amizade com os colegas e até com os próprios funcionários da faculdade são pequeninas coisas onde podemos ser testemunhas de Amor.

Em casa, com a minha família, mesmo havendo ideias diferentes em relação à espiritualidade, é possível trazer Jesus para dentro das nossas quatro paredes! Tento fazê-lo através de algo muito simples que se chama cuidar. Cuidar significa interessar-se pelo outro, procurar a sua felicidade, estar atento, comprometer-se com o seu bem. Procuro que a minha vida seja reflexo destas belas palavras de Paul Claudel: “Fala de Cristo apenas quando te perguntarem. Mas vive de tal maneira que te perguntem por Ele.”

Para mim, o maior desafio, todos os dias, é transformar a minha intimidade com Deus numa “fé que atua pelo amor”. Nunca esquecendo que “somos chamados a viver a contemplação mesmo no meio da acção, e santificamo-nos no exercício responsável e generoso desta missão”, como nos diz o Papa Francisco. Jesus só pode amar através de mim se eu deixar que, através da oração, ele me alimente esta doação diária.
As árvores conhecem-se pelos seus frutos. Se estes frutos forem uma vida repleta de Alegria verdadeira e Caridade, é Jesus quem eu estou a anunciar.

Em que sentes que precisas de mais ajuda da Igreja?

Sinto alguma necessidade de expansão do papel dos leigos mais jovens, sobretudo a nível paroquial. Seria bom que a Igreja lhes desse mais protagonismo e autonomia. A sua ajuda é muito necessária para unir a dimensão paroquial aos movimentos e grupos que existem, uma vez que ainda há alguma falta de integração destas duas dimensões.

Existe ainda, infelizmente, alguma persistência num dinamismo altamente regulado por números e centrado em quantidade de actividades, grupos e movimentos para jovens e nem sempre centrado na sua profundidade e capacidade de transformação.

Ana Mano Costa

Existe ainda, infelizmente, alguma persistência num dinamismo altamente regulado por números e centrado em quantidade de actividades, grupos e movimentos para jovens e nem sempre centrado na sua profundidade e capacidade de transformação.

Embora não seja a minha realidade pessoal, penso que há falta de alternativas para jovens mais velhos que já não estudam mas que ainda não estão em fase de constituição de família. É necessário procurar diferentes opções para este estado de vida distinto, que consigam ir para além daquilo que são os grupos de jovens e centros universitários.

Como podes colaborar mais com a Igreja? 

Em primeiro lugar, penso que um aspeto essencial é informar-me e estar atenta à realidade em constante mudança que me rodeia. É importante acompanhar o Papa naquilo que ele nos transmite, por palavras e pela escrita, e sobretudo atender ao seu pedido incessante de rezar por ele e pela Igreja.

Depois, é fundamental estar disponível. Procurar o meu lugar na Igreja e servi-la da melhor forma possível através da minha vocação, sendo exemplo como estudante, colega, como filha, irmã, neta, namorada, em todas as dimensões, tempos e lugares da minha vida.

Para além de tudo isto, nunca esquecer que “não existe identidade plena sem a pertença a um povo” e por isso somos enviados “dois a dois”. A minha colaboração com a Igreja deve partir desta união a ela, como membro do povo através do qual Deus nos transforma e envia. O Papa São João Paulo II dizia que “a Igreja só será jovem quando o jovem for Igreja” e eu acredito firmemente que a chave é esta.

 

A Ana pertence ao Corpo Nacional de Escutas – Escutismo Católico Português (Agrupamento 1208 Miraflores) mas nesta entrevista dá-nos o seu testemunho pessoal.

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.