O Papa interveio hoje na assembleia sinodal, que decorre no Vaticano, para deixar críticas ao clericalismo e ao carreirismo, na Igreja, condenando atitudes de “machismo” por parte de membros do clero.
“O povo de Deus, o santo povo fiel de Deus, segue em frente com paciência e humildade, suportando o desprezo, maus-tratos, marginalizações por parte do clericalismo institucionalizado. Com quanta naturalidade falamos de príncipes da Igreja ou de promoções episcopais, como subidas na carreira”, referiu Francisco, numa intervenção enviada aos jornalistas, após a 18ª reunião geral.
A primeira sessão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, com o tema ‘Para uma Igreja sinodal: comunhão, participação, missão’, começou a 4 de outubro e decorre até sábado; Francisco decidiu que a mesma terá uma segunda etapa, em 2024.
Na segunda reunião geral desta quarta-feira, em que foi aprovada uma carta dos participantes às comunidades católicas, o Papa manifestou-se particularmente crítico dos membros do clero que “ultrapassam o seu serviço e maltratam o povo de Deus”. “Desfiguram o rosto da Igreja com atitudes machistas e ditatoriais”, denunciou.
É doloroso ver, nalguns cartórios paroquiais, a ‘lista de preços’ dos serviços sacramentais, como num supermercado. A Igreja ou é povo fiel de Deus, em caminho, santo e pecador, ou acaba por tornar-se numa empresa de serviços diversos”. Francisco rejeitou a ideia de que a Igreja seja um “supermercado da salvação”, em que os sacerdotes funcionam como “empregados de uma multinacional”.
Francisco rejeitou a ideia de que a Igreja seja um “supermercado da salvação”, em que os sacerdotes funcionam como “empregados de uma multinacional”.
“É a grande derrota, que nos leva ao clericalismo, isto com muita pena e escândalo. Basta ir às alfaiatarias eclesiásticas de Roma para ver o escândalo de jovens sacerdotes, experimentando batinas e chapéus, ou albas e roquetes com rendas”, apontou.
O Papa falou do clericalismo como um “chicote” e uma forma de mundanidade que “suja e provoca dano ao rosto” da Igreja e “escraviza o santo povo fiel de Deus”. A intervenção recordou que Jesus fugiu aos “esquemas políticos do seu tempo” e não quis fazer da Igreja uma “corporação fechada”.
“Gosto de pensar na Igreja como este povo simples e humilde, que caminha na presença do Senhor, o povo fiel de Deus”, prosseguiu, destacando que uma das caraterísticas desse povo é a sua “infalibilidade” ao acreditar (infabilitas in credendo).
“Gosto de pensar na Igreja como este povo simples e humilde, que caminha na presença do Senhor, o povo fiel de Deus”, prosseguiu, destacando que uma das caraterísticas desse povo é a sua “infalibilidade” ao acreditar (infabilitas in credendo).
“O povo fiel, o santo povo fiel de Deus, tem alma. E porque podemos falar da alma de um povo, podemos falar de uma hermenêutica, de um modo de ver a realidade, de uma consciência. O nosso povo fiel tem consciência da sua dignidade, batiza os seus filhos, enterra os seus mortos”, insistiu.
O Papa destacou a importância das mulheres na transmissão da fé, que se faz “geralmente em dialeto feminino”, nas famílias. “São as mulheres quem sabe esperar, sabem descobrir os recursos da Igreja, do povo fiel, arriscam para lá dos limites, talvez com medo mas corajosas, e no alvorecer de um dia que começa, aproximam-se de um sepulcro com a intuição (ainda não esperança) de que possa haver algo de vida”, declarou.
A assembleia sinodal, presidida pelo Papa, tem 365 votantes, entre eles 54 mulheres, a quem se somam, sem direito a voto, 12 representantes de outras Igrejas e comunidades cristãs (delegados fraternos), oito convidados especiais e colaboradores da Secretaria-Geral do Sínodo. A Conferência Episcopal Portuguesa está representada pelo seu presidente e vice-presidente, respetivamente D. José Ornelas e D. Virgílio Antunes.
Fotografia: Ricardo Perna
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.