Foram 650 quilómetros em 26 dias. Nesta peregrinação de Loiola até Manresa, pelo interior de Espanha seguindo os passos de Santo Inácio de Loiola (fundador da Companhia de Jesus, cuja festa se celebra amanhã), Abel reconhece que houve uma dose forte de sacrifício. Um esforço físico que nem sempre foi fácil de superar para o corpo mas que também exigiu muito da mente e da alma.
Foram muitas horas a andar, por vezes em condições difíceis, debaixo de chuva ou de sol, por entre as silvas, ou até mesmo sem sapatos, como aconteceu logo nos primeiros dias quando o peregrino ficou sem sandálias e teve de caminhar descalço durante cinco horas. “Sentia as pedras, sentia os picos nos pés. Escorreguei, caí na lama e levantei-me. Tinha de continuar”, conta o sacerdote jesuíta, de 55 anos, reconhecendo, contudo, que as dores e o cansaço não deixaram mazelas de maior.
O embate físico foi logo no primeiro dia, quando Abel fez quase 38 quilómetros só numa etapa, subindo a montanha e descendo-a pelo outro lado. “Sentia-me esgotado. À entrada do Santuário (de Nossa Senhora de Aranzazu) ia caindo de cansaço. Se não fosse um senhor dar-me um sumo de laranja, não tinha aguentado”, recorda, agora já com a clareza que um olhar à distância de dois meses sobre os acontecimentos impõe. Mas porquê este sacrifício, questiona em voz alta, tal como se questionaram os que com ele se cruzaram pela estrada e puderam testemunhar a dureza desta missão. Nada disto foi em vão, diz convictamente. Não foi um sacrifício sem sentido. “Fiz esta caminhada por amor. Entreguei-me a Deus na minha pobreza e quis oferecer a Deus as minhas dores e dificuldades para que, com isso, Ele pudesse espalhar graças por outras pessoas”, garante o P. Abel Bandeira.
Foi uma oração de reparação e intercessão, explica o jesuíta. Um caminho orante ou uma oração em caminho, através da qual o peregrino quis “dar a vida para que o mundo ficasse um pouco melhor”. Nesta atitude de oração profunda, o P. Abel Bandeira identificou-se com o sofrimento do próprio Jesus. “Para percebermos o que Cristo sentiu, temos de andar nos passos dele. E eu identifiquei-me com o Cristo que sofreu. É o mistério do sacrifício, dar a vida de forma diferente. O sacrifício faz parte da vida”.
E eu, consigo confiar as minhas dores e dificuldades a Deus?
Nos passos de Inácio VI
Nos passos de Inácio VIII
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.