Portugal na era dos homens fortes: democracia e autoritarismo em tempos de covid

O mais recente livro de Bernardo Pires de Lima é a sugestão de leitura da Brotéria para esta semana. Uma análise pertinente sobre democracia, liberdade e política internacional.

O mais recente livro de Bernardo Pires de Lima é a sugestão de leitura da Brotéria para esta semana. Uma análise pertinente sobre democracia, liberdade e política internacional.

Este ensaio é precisamente aquilo que pretende ser: «uma fotografia panorâmica» (p.14) do momento que a política internacional atravessa, com todas as vantagens e inconvenientes que acompanham um exercício tão ambicioso. A partir de uma perspetiva abertamente anti-Trump, multilateralista, anti-nacional-populismo, social-democrata, europeísta e liberal, Bernardo Pires de Lima, analista de política internacional, divide as suas observações sobre o tempo que vivemos em duas partes.

Primeiro, aborda a «reemergência autoritária» a nível internacional, dividindo-a em três: do perfil dos «homens fortes» (Trump, Bolsonaro, Orban, Erdogan, Xi Jinping, Putin, e a lista continua), aos «despotismos digitais», passando pela pandemia. Sobre esta última, julgo que ainda é cedo para avaliar as considerações do autor. Muito interessante revela-se a reflexão sobre os «despotismos digitais», que inclui um olhar sobre o crescimento das redes sociais e das fake news, a descredibilização dos meios de comunicação social tradicionais e as novas formas de comunicação e controlo político, através de meios digitais. A convicção com que Bernardo Pires de Lima defende e insiste na importância do jornalismo para a democracia e para a liberdade é rara nos dias que correm, mas necessária.

A sua mensagem, resumida de forma simples, é a de que é possível colmatar a reduzida importância geopolítica portuguesa através de uma nova cultura de antecipação. «Estudar, antecipar, preparar» (p. 149).

A segunda parte da obra, sob o título “Democracia Antecipatória”, reúne os principais traços do pensamento do autor. Para combater do lado certo da história, em defesa da liberdade e da democracia, Portugal deve antecipar-se no plano internacional. O autor propõe passos a seguir, do mais abrangente (como o investimento na relação transatlântica) ao mais concreto (a criação de um embaixador para as alterações climáticas [p.146]). A sua mensagem, resumida de forma simples, é a de que é possível colmatar a reduzida importância geopolítica portuguesa através de uma nova cultura de antecipação. «Estudar, antecipar, preparar» (p. 149).

Não é possível, num só ensaio, descrever com o maior detalhe e rigor toda a atualidade política internacional durante uma pandemia global, e simultaneamente apresentar inúmeras propostas exequíveis para a política externa nacional. Não é possível, nem é esse o objetivo deste ensaio. Bernardo Pires de Lima aponta, antes, um caminho para a política externa portuguesa, guiado por critérios orientadores tais como o investimento na diplomacia, o desenvolvimento de uma cultura de antecipação, a inclusão de expertise nos centros de decisão políticos, e uma maior vocação europeia. Numa altura em que «toda a política é internacional»(p.14), Portugal, em especial através dos seus (nossos) decisores políticos, deve investir no seu papel na política internacional. «Há quanto tempo não ouvimos um primeiro-ministro proferir um grande discurso sobre política externa? Pois, eu também não me lembro» (p. 39). É preciso alterar este cenário.

Fotografia:  Jørgen Håland – Unsplash

 

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.


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