Outra vez Moisés e a sarça, com o Euro 2016 e Chagall

A sarça ardente, episódio 2: a promessa de Deus pintada por Marc Chagall.

A sarça ardente, episódio 2: a promessa de Deus pintada por Marc Chagall.

1. Como mel para a boca

A cena da sarça ardente no filme de animação O Príncipe do Egipto, produzido pelos estúdios DreamWorks em 1998.


2. Um texto bíblico

Moisés estava a apascentar o rebanho de Jetro, seu sogro, sacerdote de Madian. Conduziu o rebanho para além do deserto, e chegou à montanha de Deus, ao Horeb. O anjo do Senhor apareceu-lhe numa chama de fogo, no meio da sarça. Ele olhou e viu, e eis que a sarça ardia no fogo mas não era devorada. (…)

O Senhor disse:

Eu bem vi a opressão do meu povo que está no Egipto, e ouvi o seu clamor diante dos seus inspectores; conheço, na verdade, os seus sofrimentos. Desci a fim de o libertar da mão dos egípcios e de o fazer subir desta terra para uma terra boa e espaçosa, para uma terra que mana leite e mel (…). E agora, vai. Eu te envio ao faraó, e faz sair do Egipto o meu povo, os filhos de Israel.

Moisés disse a Deus:

– Quem sou eu para ir ter com o faraó e fazer sair os filhos de Israel do Egipto?

Ele disse:

– Eu estarei contigo. Este é para ti o sinal de que Eu te enviei: quando tiveres feito sair o povo do Egipto, servireis a Deus sobre esta montanha. (…) Eu bem sei que o rei do Egipto não vos deixará partir senão obrigado por mão forte. Estenderei então a minha mão e ferirei o Egipto com todas as maravilhas que farei no meio dele. Depois disso, deixar-vos-á partir.

Êxodo 3,1-2.7-8.10-12.19-20


3. O esclarecimento

 

Mois%C3%A9s%20diante%20da%20sar%C3%A7a%20ardente%2C%20Marc%20Chagall%2C%201960-66%2C%20Museu%20Nacional%20Marc%20Chagall%2C%20Nice%2C%20Fran%C3%A7a.
Moisés diante da sarça ardente, Marc Chagall, 1960-66, Museu Nacional Marc Chagall, Nice, França.

Marc Chagall também pintou a cena da sarça ardente. Na pintura exposta no museu da Mensagem Bíblica de Nice, ele relaciona este episódio com o milagre da passagem do Mar Vermelho. O quadro apresenta-se como uma espécie de relato:

No cimo da quadro, no arco-íris, símbolo da aliança, Deus surge sob a forma de um anjo sobre a sarça ardente que não se consume. Aqui, a luz de Deus ilumina, sem destruir.

Deus dá a Moisés a missão de libertar o povo hebreu e de o conduzir para fora do Egipto. O anjo de Deus abre enormemente os braços e sorri. Este gesto de acolhimento e de abertura, anuncia uma outra abertura, a do Mar Vermelho.

À esquerda na pintura, Chagall evoca o cumprimento da promessa com a cena da passagem do Mar Vermelho. Moisés, cuja cabeça irradia luz, olha para as tábuas da Lei,  e carrega como um manto o povo. Este último é protegido dos seus perseguidores pela onda que submerge os cavalos e os cavaleiros. O povo perseguido e humilhado caminha agora em direcção à vida.

O tema do cumprimento das promessas de Deus atravessa todo o Antigo Testamento: Deus promete descendentes a Abraão e dá-lhe Isaac, Deus promete uma terra ao povo escolhido e dá-lhe a Terra Prometida.

 

O episódio da sarça ardente também é relatado no Corão, onde o nome de Moisés se escreve “Mûsa”. Isso deu origem ao nome Moussa, como o do jogador da equipa francesa, Moussa Sissoko, o homem forte da final do Euro 2016, de gloriosa memória… para os portugueses!


4. E ainda uma palavra final…

A história da sarça ardente revela o tema da promessa que Deus se encarregará de cumprir. Este mesmo tema é retomado em poesia por Paul Verlaine em Sagesse (Sabedoria), II (Paris, 1880):

 

“Quem sou eu?”, perguntas tu.

O meu nome curva os próprios anjos.

 

Eu sou o coração da virtude,

Eu sou a alma da sabedoria,

O meu nome queima o teimoso Inferno.

 

Eu sou a doçura que se endireita,

Eu amo todos e não culpo ninguém,

O meu nome, só, é nome de promessa.

 

Eu sou o único convidado oportuno,

Aquele que fale com o rei a verdadeira linguagem,

Da manhã rosa e do entardecer escuro.

 

Eu sou a Oração, e o meu penhor

É o teu vício que se perde ao longe.

 

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.


Ajude os Frades Dominicanos da École Biblique et Archéologique Française de Jerusalém a difundir a sabedoria e a beleza que nasceram das Escrituras. Obrigado pela sua generosidade e por acreditar no projeto!

Eu contribuo


PRIXM Logo

Um projeto cultural, destinado ao grande público, da responsabilidade dos Frades Dominicanos da École Biblique et Archéologique Française de Jerusalém.


Sob a direção dos Frades Dominicanos de Jerusalém, mais de 300 investigadores do mundo inteiro estão a desenvolver um trabalho de tradução e anotação das Escrituras, que será oferecido numa plataforma digital que recolherá mais de 3000 anos de tradições judaico-cristãs. Para saber mais, clicar aqui.

PRIXM é o primeiro projecto, destinado ao grande público, fruto deste trabalho. A iniciativa quer estimular a redescoberta dos textos bíblicos e dar a conhecer tudo o que de bom e belo a Bíblia inspirou ao longo dos séculos e até aos nossos dias.