O céu estrelado

Estamos todos debaixo do mesmo céu e, como refere o Papa Francisco na encíclica Laudato Si', “antes de te haver formado no ventre materno, Eu já te conhecia. (Jr 1,5)”.

Estamos todos debaixo do mesmo céu e, como refere o Papa Francisco na encíclica Laudato Si', “antes de te haver formado no ventre materno, Eu já te conhecia. (Jr 1,5)”.

 

“Como é maravilhosa a certeza de que a vida de cada pessoa não se perde num caos desesperador, num mundo regido pelo puro acaso ou por ciclos que se repetem sem sentido! O Criador pode dizer a cada um de nós: “Antes de te haver formado no ventre materno, Eu já te conhecia.” (Jr 1,5)” Laudato Si’ (65), Papa Francisco

 

Olhar para o céu, observar as estrelas, tentar decifrar as constelações, esse mapa de imagens que os antigos nos deixaram, pode ter um efeito paradoxal entre nos fazer sentir esmagados e insignificantes e entendermos que estamos aqui por uma razão!

Em todos os tempos, o céu sempre foi algo misterioso e intrigante para o Homem. O espaço que está sobre nós e todas as coisas visíveis tem sido alvo de estudo do ser humano, que tem tentado desvendar os seus segredos.

As estrelas, esses pontos luminosos que nos cativam, foram sendo ligadas por linhas imaginárias, desenhando figuras mitológicas e usadas como referência. As constelações criadas serviram como bússola, marcaram estações do ano e também ajudaram a definir um calendário. Muitos povos viram no céu/universo um caminho para melhor compreenderem o mundo em que viviam!

Não precisamos ser Copérnico ou Galileu para nós mesmos olharmos para o céu e disfrutarmos de um belo espetáculo! Apesar da gratuidade do mesmo, em alguns sítios do planeta o que parece simples já não o é. O crescimento das cidades, a poluição, as luzes, interferem de tal ordem que fazem com que uma parte da população já não tenha bilhete para esta sessão!

Não é por acaso que o nosso Alentejo está no top 10 dos melhores locais do mundo para observar as estrelas. A ausência de poluição luminosa e atmosférica contribui para o que já é um privilégio só para alguns!

Foi com o meu avô Francisco que ganhei o gosto e o hábito de olhar para o céu estrelado. Começávamos sempre pela Ursa Maior, de seguida a Cassiopeia até encontrarmos a Ursa Menor. Como sabem, a Estrela Polar está na cauda e indica o Norte. Mesmo em pequena percebi que saber o Norte traz sempre satisfação e segurança!

Observar as estrelas tem também cheiro a verão, sensação de terra quente bem acompanhada de uma sinfonia estival de grilos e cigarras que pareciam competir entre si. Trazem à memória as férias grandes na aldeia, em casa dos meus avós paternos, quando nos juntávamos com tios e primos e o serão era passado sem pressas, deitados no terraço às escuras, e, entre risos e conversas descontraídas contávamos as estrelas cadentes que víamos. Mais parecíamos pescadores de estrelas, pois cada um, “apanhava” mais que os outros!

Depois também há alturas na vida em que “não há estrelas no céu”, já cantava Rui Veloso. Alturas em que não há ursa que nos salve nem norte que se encontre! O céu está sempre enevoado, em risco de trovoadas, chuvas e ventos fortes! Outras há em que nos sentimos vencedores do “Chuva de Estrelas”, tudo corre de feição, o vento está a favor e a nossa vida veleja rápido sem tempo de olhar para o céu!

Fases à parte, olhar para o céu com deleite sempre foi algo que me deixou extasiada dado a dimensão e espetacularidade do universo, quase que esmagada pelo manto celeste que se estende sobre nós.

Contemplar o céu, ou seja, admirar e pensar sobre, ou num contexto religioso, alcançar Deus através desta experiência, mete-nos no sítio, reduzindo qualquer tipo de ego inchado ou pensamento do tipo “sou mais que este ou aquele”! Estamos todos debaixo do mesmo céu e, como refere o Papa Francisco na encíclica Laudato Si’, “antes de te haver formado no ventre materno, Eu já te conhecia. (Jr 1,5)”. Apesar de nos mostrar a nossa pequenez, a nossa insignificância perante tanta grandeza, também eleva a nossa singularidade, no sentido que fomos escolhidos, queridos e profundamente amados para estarmos aqui e agora, dignos de tanta beleza, peças fundamentais no puzzle da vida! Citando novamente a encíclica, “Fomos concebidos no coração de Deus e, por isso, “cada um de nós é o fruto de um pensamento de Deus. Cada um de nós é querido, cada um de nós é amado, cada um é necessário.” (Laudato Si’ 65.)

Que neste verão se disfrute do tempo quente passado mais na rua, dos serões que se prolongam noite dentro e que se proporcione olhar para o céu. Sozinho ou acompanhado, em casal ou com a família e amigos que se aproveitem as noites estreladas que se adivinham, as chuvas de estrelas características desta altura do ano. E que se lembre de saborear o momento, agradecer e sentir este efeito paradoxal que nos devolve ou reforça o sentido de serviço e a certeza de sermos filhos muito amados!

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.