Educar crianças em Kepler-22b

Esta semana, a Brotéria recomenda uma série: a mais recente produção de Ridley Scott para a televisão. Raised by Wolves é uma história insólita sobre a maternidade de um androide num cenário pós-apocalíptico.

Esta semana, a Brotéria recomenda uma série: a mais recente produção de Ridley Scott para a televisão. Raised by Wolves é uma história insólita sobre a maternidade de um androide num cenário pós-apocalíptico.

Ridley Scott é um dos produtores-executivos de Raised by Wolves, tendo realizado os dois primeiros episódios da primeira temporada. Blade Runner, Alien, Prometheus e Thelma and Louise são alguns dos muitos filmes de sucesso que realizou e produziu. Raised by Wolves é a primeira série televisiva em que participa como realizador, tendo produzido para televisão The Good Wife e a primeira temporada de The Man in the High Castle (a mais interessante até agora), entre outros.

A ficção científica e histórias com mulheres protagonistas parecem ser temas que o interessam. Raised by Wolves é uma síntese destes seus interesses. Depois de uma guerra na Terra entre ateus militantes e religiosos da ordem dos mitraicos, que acreditam num deus chamado Sol, que determinou a destruição do planeta, dois androides – Father e Mother – são reprogramados para educar crianças humanas no planeta árido Kepler-22b com o objetivo de criar uma civilização ateia.

Father tem a função passiva de garantir o sustento para as crianças, enquanto Mother tem a tarefa de dar vida aos embriões que transporta na nave, de dar à luz, bem como de educar as crianças no sentido de não acreditarem em nenhum ente superior. Mother é uma androide com vários poderes, entre os quais se encontra a capacidade de voar na posição de Cristo e de guinchar até à destruição de tudo o que a incomoda. A este pormenor vagamente misógino, embora divertido, acresce a excentricidade de ser uma figura maternal feroz. Mother é uma super-mãe, uma verdadeira mãe-galinha, atenta às suas crias, ciosa dos seus rebentos, os quais pretende encaminhar no ateísmo, minando qualquer tentação de crença religiosa ou sequer curiosidade sobre a existência de algo mais do que a matéria de que são feitos.

Nascidas de um androide fertilizado através de tubos inseridos na barriga, as crianças seguem as indicações do casal peculiar, à exceção de Campion, que desafia e questiona os pais. A sua rebeldia consiste em acreditar que existe outra coisa além daquilo que vê e experimenta. São muitas as lutas entre os androides e a fação humana crente sobrevivente que chega a Kepler-22b, com pormenores que podem cansar o espetador.

O que queremos ver em Raised by Wolves é a extraordinária personagem que é Mother, uma figura andrógina frágil e poderosa; uma fêmea alfa com aspeto de rapaz delicado, que discute com o androide masculino da mesma forma que uma mulher normal discutiria com o seu marido, mas que ao mesmo tempo tem a capacidade de parir pela boca uma criatura que concebeu com um humano, numa viagem a um futuro transdimensional com aspeto de passado, ligada na nave com que chegou a Kepler-22b.

Confusos? A criatura que nasce desta engenhosa conceção é uma espécie de enguia que também voa, não fosse ela filha da sua mãe, mas não é pelo seu aspeto esquisito que será menos amada. Temos de esperar pela próxima temporada para sabermos o que vai ser quando for grande. Amanda Collin é uma Mother perfeita, e nada mais importa a não ser a sua presença, quer esteja ligada a tubos, a sangrar leite, quer a voar como se fosse uma máquina exterminadora, uma arma de guerra implacável contra tudo o que constitui uma ameaça ao projeto para o qual foi reprogramada. Porém, Mother, contra todas as expetativas, sonha e sente como um ser humano de hoje. E não lhe falta voar.

https://www.youtube.com/watch?v=rE92bDAlPXI

RAISED BY WOLVES 

Género: ficção científica/ drama

Duração: 42–55 minutos

País: EUA

Idioma original: inglês

Criação Aaron: Guzikowski

Produção: John Cuyper

Distribuição: HBO MAX

Data de estreia: 03.09.2020

Nº de episódios: 10

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.


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Esta secção é da responsabilidade da revista Brotéria – Cristianismo e Cultura, publicada pelos jesuítas portugueses desde 1902.

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