Dominicanos. Arte e Arquitetura Portuguesa. Diálogos com a modernidade

Exposição no Convento de São Domingos, em Lisboa, termina no dia 10 de junho e apresenta o contributo dominicano na renovação da arte sacra e da arquitetura religiosa do século XX.

Exposição no Convento de São Domingos, em Lisboa, termina no dia 10 de junho e apresenta o contributo dominicano na renovação da arte sacra e da arquitetura religiosa do século XX.

Ao longo da sua história, a Igreja Católica foi conseguindo reinventar-se e, através da arte e da arquitetura, foi-se transformando para melhor transmitir a sua mensagem. Em tempos de reconstrução do pós-guerra, tudo é repensado e questionado em todas as vertentes da sociedade. Também a igreja enfrenta esta mudança e com o Concílio Vaticano II (1962-1965) abre definitivamente as portas à modernidade.

No seguimento das comemorações dos 800 anos do primeiro convento dominicano em Portugal, a Ordem dos Pregadores (Dominicanos), em conjunto com o Centro de Estudos de História Religiosa da Universidade Católica, e pelo Instituto São Tomás de Aquino, apresenta o contributo dominicano na renovação da arte sacra e da arquitetura religiosa do século XX.

A exposição “Dominicanos. Arte e Arquitetura Portuguesa. Diálogos com a modernidade”, comissariada por João Alves da Cunha, João Luís Marques, Paulo Miranda e Pedro Castro Cruz, está a decorrer no convento de São Domingos no Alto dos Moinhos em Lisboa até 10 de junho de 2018 e apresenta quatro obras de conventos e igrejas de cariz moderno em Portugal.

Das diversas novas casas, encomendadas pela Ordem dos Pregadores para o seu restabelecimento em Portugal em 1962, após a expulsão das ordens religiosas em 1834, foram selecionadas para a mostra o Convento de Cristo Rei (Porto, 1950-54), a Igreja de Nossa Senhora do Rosário (Fátima, 1962-65), a capela do Seminário do Olival – Aldeia Nova (Ourém, 1964-67) e o Convento de São Domingos (Lisboa, 1989).

Algo de curioso e diferente, face à maioria das exposições, é o facto do espaço expositivo ser, ele também, objeto de estudo, o que torna ainda mais interessante a sua leitura, neste “Diálogo com a Modernidade” que nos é proposto.

A exposição “Dominicanos. Arte e Arquitetura Portuguesa. Diálogos com a modernidade”, comissariada por João Alves da Cunha, João Luís Marques, Paulo Miranda e Pedro Castro Cruz, está a decorrer no convento de São Domingos no Alto dos Moinhos em Lisboa até 10 de junho de 2018 e apresenta quatro obras de conventos e igrejas de cariz moderno em Portugal.

A exposição ocupa o átrio e a sala do capítulo do convento de São Domingos em Lisboa. No átrio, tomamos conhecimento do que ocorre no contexto internacional à época, principalmente em França, onde a revista L’Art Sacré, pela autoria do padre dominicano Marie-Alain Couturier OP (1897-1954), se torna um grande contributo para o debate sobre a renovação da arte e arquitectura religiosa. Podemos também nos deixar impressionar sobre a forma como Couturier promoveu importantes obras, com a colaboração de grandes nomes da arte e arquitetura mundial como Le Corbusier, Matisse, Chagall, entre outros.  Exemplo disso são a capela Notre-Dame du Haut (Ronchamp, 1955) e o Convento Dominicano de Sainte Marie de La Tourette (Lyon, 1960). Modelos impares do modernismo que tiveram eco nas periferias.

Ainda no átrio, é-nos apresentada a forma como os dominicanos se distribuíram em Portugal a partir de 1962 e as quatro obras selecionadas.

Já na sala do capítulo, as obras são apresentadas através de fotografias, desenhos e maquetes, esculturas, objetos e documentos provenientes de várias instituições. Obedecem à geometria da sala, centralizada entre os quatro pilares e não sobre uma óbvia ordem cronológica ou temática. Desta forma, a exposição oferece ao visitante a possibilidade de deambular pelo espaço e, em cada quadrante, conhecer cada obra, com as maquetes ao centro, painéis entre pilares e peças de arte sacra na periferia da sala.

O Convento de São Domingos, inaugurado em 1994, da autoria de José Fernando Gonçalves e Paulo Providência, de linguagem contemporânea, está ainda inacabado (faltando a biblioteca e o centro cultural). É possível perceber na exposição, através da maquete, dos painéis do concurso e pelo próprio espaço em si como a modernidade vive e convive com a espiritualidade dominicana veiculada por uma arquitetura de linhas simples e de volumes marcados, depurados, materiais crus e o uso surpreendente da iluminação.

No caso do Convento de Cristo Rei (Porto, 1950-54) é apresentada a dicotomia entre o moderno e o conservador. Inserido no plano de urbanização de Gomes da Costa (1945-1949), Fernando Távora propõe um moderno centro cívico, regular, com os edifícios definindo a praça, marcando uma unidade sem hierarquias. Por outro lado, justificado por uma solução mais “simples e modesta”, Eduardo Martins e Manuel Passos Júnior projetam o convento ao estilo nacionalista conservador. É possível comparar, através dos vários estudos e com a maquete do centro cívico, o contraste destas duas correntes contemporâneas.

A arquitetura modernista vai chegando de forma tímida às periferias da Europa, perdendo fôlego na imposição das suas regras universais, mas adaptando-se de forma intencional à cultura e construções tradicionais. O Movimento Moderno em Portugal amarra-se às raízes locais, impulsionado pelo Inquérito da Arquitectura Tradicional Portuguesa (1950) como no caso de Álvaro Siza na Casa de Chá da Boa Nova (Leça da Palmeira, 1958-1963). A capela do Seminário do Olival – Aldeia Nova, do arquiteto Diogo Lino Pimentel – pertencente ao Movimento de Renovação da Arte Religiosa (MRAR) – é exemplo desta realidade. Inserida numa cobertura em telha cerâmica de duas águas e atravessada pela torre sineira em betão aparente, desafia e rompe com os cânones do espaço litúrgico em pleno Concílio Vaticano II (1962-1965). É possível ver na exposição a imagem de Nossa Senhora com o Menino (1967) em gesso policromado da autoria de Maria do Carmo d’Orey, com a colaboração de Manuel Costa Cabral, e da imagem da pintura de Espiga Pinto evocando São Domingos.

A exposição Dominicanos. Arte e Arquitetura Portuguesa. Diálogos com a modernidade, mostra como a Ordem dos Pregadores acreditavam que a modernidade não era oposta aos valores da Igreja, antes pelo contrário, era essencial à busca constante do Homem para uma maior aproximação a Deus.

Também a Igreja de Nossa Senhora do Rosário (Fátima, 1962-1965) do arquiteto Luiz Cunha, junta a cultura local com as mais atuais técnicas e expressões artísticas. Pode ler-se na apresentação da obra que “os materiais são os comuns na região. Pedra para as paredes resistentes, madeiramento e telha para a cobertura. Um outro elemento de betão deixado à vista mostra que não houve uma preocupação retórica de fazer uma arquitetura pseudo-regionalista.”  A forma e organização do espaço litúrgico, conjuntamente com a extraordinária pintura de da Árvore de Gesse (1966) de Ferdinand Gehr, sobre o teto de betão armado, a escultura de Maria Luísa Marinho e José Grade e a paramentaria de Isolda Norton, mostram como a comenda dos dominicanos para os lugares de culto gritava modernidade e se opunha com grande qualidade aos modelos tradicionalistas.

A exposição “Dominicanos. Arte e Arquitetura Portuguesa. Diálogos com a modernidade” mostra como a Ordem dos Pregadores acreditavam que a modernidade não era oposta aos valores da Igreja, antes pelo contrário, era essencial à busca constante do Homem para uma maior aproximação a Deus. Culto e Cultura estiveram desde sempre associados, pela arte e arquitetura num papel preponderante na relação do Homem com o Divino.

Nota: este artigo integra o Caderno Cultural do número Maio-Junho da Revista Brotéria

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.


Brotéria Logo

Sugestão Cultural Brotéria

Esta secção é da responsabilidade da revista Brotéria – Cristianismo e Cultura, publicada pelos jesuítas portugueses desde 1902.

Conheça melhor a Brotéria