Correram como loucos

Para Bono, Cristo ou ressuscitou ou era louco. Pedro e João correm confusos para o sepulcro. Eugène Burnard pinta-os. Em resposta a Amin Malouf, lembramos uma história que ultrapassa todas as esperanças humanas.

Para Bono, Cristo ou ressuscitou ou era louco. Pedro e João correm confusos para o sepulcro. Eugène Burnard pinta-os. Em resposta a Amin Malouf, lembramos uma história que ultrapassa todas as esperanças humanas.

1. Como mel para a boca

Bono Vox nunca escondeu a sua fé cristã. Em 2014, numa entrevista a propósito da ressurreição, disse: «Acho difícil imaginar que milhões de pessoas desde há dois mil anos tenham sido tocadas por aquela presença, tenham mudado a própria vida por terem sido inspiradas por um louco. Não, não o creio.»

Mas as suas músicas também deixam transparecer essa convição. Em Magnificient grita:

«Only love, only love can leave such a mark
But only love, only love can heal such a scar»

(Só o amor pode deixar  uma marca como essa. Mas só amor pode curar essa cicatriz.)

O próprio vídeo mostra-nos uma realidade desvelada, uma luz que vai tocando os olhares e os rostos. Uma excelente banda sonora para uma manhã de tempo Pascal.

♪ ♫ ♬


2. Um texto bíblico

Durante o tempo de Páscoa, que vai do Domingo de Páscoa até ao Domingo de Pentecostes, propomos um mergulho nos relatos da Ressurreição.

«No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ao túmulo logo de manhã, ainda escuro, e viu retirada a pedra que o tapava. Correndo, foi ter com Simão Pedro e com o outro discípulo, o que Jesus amava, e disse-lhes: “O Senhor foi levado do túmulo e não sabemos onde o puseram.”
Pedro saiu com o outro discípulo e foram ao túmulo. Corriam os dois juntos, mas o outro discípulo correu mais do que Pedro e chegou primeiro ao túmulo.»

João 20, 1-4


3. O esclarecimento

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Eugène BURNAND, Os discípulos Pedro e João correm para o sepulcro na manhã da Ressurreição (óleo sobre tela, 1898), Museu d'Orsay, Paris

Qual o resultado do encontro entre um pintor realista e uma cena bíblica?

Aqui, Eugène Burnand dirige o olhar e o espírito do espectador para o fazer correr com os discípulos. A imagem é construída de maneira a atrair o olhar para cada um dos dois personagens.

  • Logo para começar, são representados sobre um fundo simples e pouco identificável: um campo pintado com pinceladas largas, sem cuidado com os detalhes.
  • O quadro não é convencional, fechando-se em direção ao lado esquerdo. Isso desestabiliza e leva o nosso olhar a fixar-se na expressão dos personagens.
  • A inclinação simétrica dos dois corpos para a esquerda, o vento que se mete nas roupas, os seus olhares insistentes e confusos, o gesto inacabado de Pedro, empurram-nos para uma cena que está algures fora do quadro… O pintor força-nos a observar os efeitos, mais do que o acontecimento em si.
  • O espectador descobre, num movimento de vaivém entre as duas cabeças, estados de espírito de uma precisão rara. As emoções variadas e surpreendentes dos dois homens põem-nos em marcha.

Realista?


4. E ainda uma palavra final…

A paixão desviou os discípulos, que tinham, sem dúvida, esperado o que Amin Maalouf imagina em Os jardins de Luz.

«Imaginamos Jesus […] depois de ter pregado nas vilas e aldeias da Galileia, a partir em direção a Roma, entrar em casa de Tibério e sair do Palatino munido de um édito que o autorizava a difundir o seu ensinamento na cidade e nas províncias e com ordem absoluta a todos os Herodes e a todos os Pôncios Pilatos, para que facilitassem a sua missão?»

Não, claro que não! A história de Jesus ultrapassa as esperanças humanas. Este túmulo vazio, este corpo ressuscitado, a esperança dos discípulos reavivada, são a grande vitória desta vida doada e sacrificada.

Amin Maalouf, Os jardins de Luz, 1991

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.


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