Brotéria vai ter novo espaço cultural

Situado no Bairro Alto, o espaço integrará o novo pólo cultural de São Roque e decorre de uma parceria com a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Acolherá a revista Brotéria, sua biblioteca e arquivo, composto por mais de 160 mil volumes.

Situado no Bairro Alto, o espaço integrará o novo pólo cultural de São Roque e decorre de uma parceria com a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Acolherá a revista Brotéria, sua biblioteca e arquivo, composto por mais de 160 mil volumes.

A Brotéria vai abrir um centro cultural no Bairro Alto, no próximo ano. O espaço resulta de uma parceria com a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) e destina-se a promover o diálogo entre a fé cristã e as culturas urbanas contemporâneas. Será um espaço de reflexão viva, a muitas vozes, e contará com um programa de exposições, debates e conferências, espetáculos e uma área de galeria. Para este novo edifício virá também a revista Brotéria, bem como a sua biblioteca e arquivo, composto por mais de 160 mil volumes.

“O objetivo é expor-nos ao diálogo e ao debate, para com isso pôr em evidência as convergências que existem entre a fé, a cultura e as ciências. Um diálogo entre a fé cristã e as culturas urbanas contemporâneas, para construir uma sociedade mais justa e humana”, explica o P. Francisco Mota, sj responsável pela comissão instaladora deste novo centro, sublinhando que o cristianismo pode e deve contribuir para a construção do bem-comum, apelando para a justiça e o respeito pela vida das pessoas, das culturas, das sociedades e do próprio planeta.

Com este novo centro, a Companhia de Jesus poderá colocar também ao serviço da sociedade o seu vasto património histórico, cultural, científico, espiritual e artístico, procurando entender a sua pertinência em face das questões levantadas pelo mundo contemporâneo.

O novo centro situar-se-á no Palácio dos Condes de Tomar, edifício que já foi ocupado pela Hemeroteca de Lisboa, e está localizado junto à Igreja de São Roque, na fronteira entre o Bairro Alto e o Chiado. Este projeto decorre de uma parceria com a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, assinada em 2010, (durante a administração do Dr. Rui Cunha), e integra-se num programa mais vasto de dinamização cultural desta zona da cidade.

 

Brotéria será um dos equipamentos que integrará este novo pólo cultural de São Roque dinamizado pela SCML, juntando-se à Igreja de São Roque, ao Museu de São Roque, ao Arquivo Histórico e Biblioteca da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, e ao Museu Casa Ásia – Coleção Francisco Capelo (para breve)

Assim, a Brotéria será um dos equipamentos que integrará este novo pólo cultural de São Roque dinamizado pela SCML, juntando-se à Igreja de São Roque, ao Museu de São Roque, ao Arquivo Histórico e Biblioteca da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, e ao Museu Casa Ásia – Coleção Francisco Capelo (para breve).

Este pólo cultural será apresentado no dia 13, através do Hospitalidade, um dia de atividades artísticas centrado na hospitalidade. (programa já disponível no site da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa).

A abertura da Brotéria está prevista para meados do próximo ano.

Conheça melhor o projeto, através das entrevistas:

P. Francisco Mota, sj e P. Rui Fernandes, sj 

Margarida Montenegro – diretora da Direção de Cultura da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa

 

5 perguntas ao P. Francisco Mota, sj

(responsável pela comissão instaladora do centro)

1. Como se foi desenvolvendo este projeto e em que fase estamos?

A ideia do pólo cultural nasceu organicamente, quando se percebeu que tanto a Direcção de Cultura da SCML quanto a Brotéria tinham interesse em coordenar a sua actividade cultural. A SCML terá na zona da igreja de São Roque dois fantásticos museus (o Museu de São Roque e a Casa Ásia – Colecção Francisco Capelo); o arquivo e biblioteca da SCML; e a igreja de São Roque. Por outro lado, como direi adiante, a Brotéria será um espaço dinâmico, aberto à rua, que atrairá pela sua programação variada e atenta às questões atuais que quem vive numa cidade como Lisboa enfrenta. O pólo cultural permite retirar maior proveito de todas estas colecções e espaços, potenciando um tipo de participação nestes espaços culturais que é envolvente (em que a ida à igreja, por exemplo, convida a visitar um dos museus e o museu, por sua vez, leva a visitar a Brotéria – etc).

Articular esforços ajuda também a ter visibilidade. Numa cidade como Lisboa, onde a oferta cultural começa a ser significativa, ter escala significa captar a atenção de quem nos visita. O pólo cultural ganha maior visibilidade se for capaz de oferecer, num curto espaço (que, em rigor, é o espaço que rodeia o Largo Trindade Coelho), linguagens, colecções, ou experiências que ajudem a tornar mais significativa a visita que se faz.

2. Qual a sua missão e os seus objetivos principais?

Pensamos na Brotéria como o espaço em que a fé cristã se encontra com as culturas urbanas contemporâneas. A nossa identidade é claramente cristã e inaciana. Temos duas grandes portas abertas à cidade, mas não pretendemos esconder o que somos e diluí-lo numa identidade vaga. A abertura à cidade não é contrária a esta identidade fortemente cristã. Pelo contrário, potencia-a. Ver a nossa missão como um encontro não é, no fundo, diferente daquilo que já fazemos nas nossas vidas. E encontrarmo-nos com as culturas urbanas contemporâneas é também relevante. As grandes questões económicas, políticas, urbanistas, artísticas, sociológicas, históricas, etc, são o contexto no qual a fé se move. É aí que a Igreja tem que estar, porque é aí que estão as pessoas – com as suas preocupações, desafios, esperanças.

Os inícios são sempre tempo de ambição. Por essa razão, propomo-nos três objectivos principais na linha do que têm sido as grandes linhas da Companhia de Jesus ao longo das últimas décadas: estabelecer pontes entre fé e cultura, criando espaços de encontro e de cooperação que possam colocar a tradição cristã em diálogo com as culturas urbanas contemporâneas; empreender uma transformação social justa e humana, analisando de maneira pluridisciplinar, e com diversos parceiros, os aspectos sociais que estejam na base de situações eticamente injustas, procurando e testando alternativas concretas com vista a uma transformação da sociedade; e particular a herança histórica, cultural e científica da Companhia de Jesus.

Propomo-nos três objectivos (…): estabelecer pontes entre fé e cultura, criando espaços de encontro e de cooperação que possam colocar a tradição cristã em diálogo com as culturas urbanas contemporâneas; empreender uma transformação social justa e humana (…) E partilhar a herança histórica, cultural e científica da Companhia de Jesus.

P. Francisco Mota, sj

3. A nova Brotéria atuará em cinco eixos estratégicos. Quais e como?

A intuição de fundo para este projecto é a de que não se pode pensar na cultura sem se pensar nas ações que a compõem. A cultura funciona por verbos: investiga, comunica, dialoga, expõe, transcende. Esta é sempre a nossa ideia. Para pensar verdadeiramente numa cultura cristã, é preciso ao mesmo tempo jogar nestes cinco eixos. Teremos uma dimensão de investigação, onde será feita uma análise rigorosa e porventura mais técnica das questões com as quais as culturas urbanas contemporâneas se debatem; uma dimensão de comunicação, onde poremos ao serviço via web e com o precioso contributo da Revista Brotéria os conteúdos que no nosso espaço forem produzidos; uma dimensão de diálogo, onde se poderá – em conferências, seminários, mesas redondas, etc – discutir publicamente com veemência mas com desejo de bem aquilo que aflige os nossos tempos; uma dimensão artística, onde no nosso espaço de galeria daremos uma linguagem visual aos temas que tratamos; e uma dimensão de espiritualidade, onde procuraremos ajudar a igreja a viver e celebrar a sua fé, a apropriar-se da liturgia, a desenvolver uma catequese que seja fiel à tradição da Igreja e também às grandes questões que vivemos.

4. A Brotéria funcionará tendo por base uma ideia de cultura redonda. De que forma isso se concretizará?

O que temos pensado é que não queremos deixar que a nossa relação com a cultura se cristalize demasiado depressa. A vida no mundo urbano contemporâneo é complexa. E por ser complexa, é preciso garantir que não cedemos a abordagens simplistas quando abordamos as questões que a marcam. Pensamos nisto, por exemplo: para tratar de um tema como a pobreza urbana escondida, será importante ter ao mesmo tempo um seminário de investigação sobre empregabilidade e custo de vida urbano; uma conferência sobre a relação entre urbanismo e saúde mental; um webdoc associado a um número da Revista Brotéria que retrate o dia-a-dia de quem trabalha com pessoas sobre-endividadas; uma fotoexposição que retrate rostos de habitantes de zonas pobres e ricas da cidade; e uma série de catequeses sobre o mandamento de acolher o órfão, a viúva e o estrangeiro na tradição do Antigo Testamento, procurando entender o que isso significa para nós quando pensamos em acolher o pobre nas nossas cidades.

Chamámos a isto um “produto redondo”. Uma cultura assim não tem esquinas nem ângulos. Tudo tem que ver com tudo. Toda a linguagem pode ajudar a compreender melhor aquilo que se tem em mãos. É uma forma de integração de linguagens novas às quais a Igreja não está habituada. Mas é também uma forma de nos obrigar a aprender com quem sabe mais do que nós como trabalhar em algumas das linguagens que nós não dominamos. Depositamos grande esperança nesta forma de trabalhar.

5. Haverá também uma cafetaria, um espaço de lazer. Como será este espaço?

Queremos que este seja um espaço distendido. É uma riqueza ter uma biblioteca como a nossa, com o que isso permite a investigadores e leitores recreacionais. Todo este espaço deve ser posto ao serviço de quem o quer usar. O projecto para a cafetaria nasce desse desejo de criar um ambiente no qual se possa estar, aproveitando o que a Brotéria é como espaço cultural, mas para uso de quem nos visita. A cafetaria pode ser um espaço de estudo; de um almoço-palestra; de reunião; ou só de leitura de fim de tarde. Não queremos ter uma cafetaria que poderia estar em qualquer sítio e que, por coincidência, acaba por estar dentro de um centro cultural. Queremos ter uma cafetaria que seja reflexo do que é o nosso centro cultural – e que seja parte deste desejo de encontro entre a fé cristã e as culturas urbanas contemporâneas, com os seus ritmos, preocupações e linguagens.

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Detalhe de fluxograma (hospitalidade), 2018, de Rodrigo Oliveira

A partir do dia 13, dia do lançamento do novo pólo cultural, a cobrir toda a fachada do edifício da Brotéria pode observar-se fluxograma (hospitalidade), 2018, uma peça de Rodrigo Oliveira que tem diferentes layers de interpretação. Entre a figuração e a abstração, a peça parte de uma vasta coleção de etiquetas que o artista foi recolhendo ao longo de anos, provenientes de várias partes do mundo. Ao colar e reconfigurar todas essas etiquetas, quase como se fossem carimbos ou selos de passaporte ou até mesmo de autocolantes que se colocavam nas bagagens, o artista origina um novo sistema e uma nova maneira de colocar estes espaços de informação, criando novos sentidos de circulação, de trânsito e de hospitalidade.

A explicação do fluxograma (hospitalidade), 2018, pelo seu autor Rodrigo Oliveira 

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.