A Paixão do Senhor em Santo Inácio

Tudo é superlativo, excede infinitamente a nossa apreensão, impele-nos a ir com Jesus, “obriga-nos” a consentir entrar nas entranhas do coração de Deus.

Tudo é superlativo, excede infinitamente a nossa apreensão, impele-nos a ir com Jesus, “obriga-nos” a consentir entrar nas entranhas do coração de Deus.

O mistério pascal do Senhor (paixão, morte e ressurreição) encontra, sobretudo na 3ª e 4ª semanas dos Exercícios Espirituais (EE), uma formulação coerente: a união com Cristo e em Cristo.

Ao acompanhar os passos da via dolorosa, Santo Inácio convida-nos a desenrolar, com Jesus, “o sacratíssimo sacrifício da eucaristia, em grandíssimo sinal de seu amor” (EE 289), considerando “como a divindade se esconde… e como deixa padecer a sacratíssima humanidade tão crudelissimamente” (EE 196). Tudo é superlativo, excede infinitamente a nossa apreensão, impele-nos a ir com Jesus, “obriga-nos” a consentir entrar nas entranhas do coração de Deus.

Nas estações (ou “aparições”) da via gloriosa, “a divindade que parecia esconder-se na paixão, aparece e mostra-se agora tão miraculosamente na santíssima ressurreição, pelos verdadeiros e santíssimos efeitos dela” (EE 223). Se a celebração da Ceia eucarística percorre e impregna o caminho da Cruz, é o mesmo amor que brilha na intimidade do encontro de Jesus ressuscitado com sua Mãe e dela transborda para toda a igreja.

A graça a pedir, na 3ª semana, “dor, sentimento e confusão, porque por meus pecados vai o Senhor à paixão” (EE 193), pode ser formulada em termos de compaixão que nos leva a acompanhar Jesus, sem arredar pé, sentindo internamente “dor com Cristo doloroso, quebranto com Cristo quebrantado” (EE 203).  Já tínhamos implorado “confusão”, também no sentido de nos deixarmos fundir na entrega radical de Jesus, ao dar-nos “o seu santíssimo corpo e precioso sangue” (EE 191, 2). A transfusão em eucaristia, oferenda permanente, oblação “de maior estima e de maior valor” (EE 97, 2), consiste em permanecer na companhia de Jesus, identificar-se com os seus sentimentos (cf. Fl 2, 5-11), considerando, finalmente, como uma espécie de ponte de sábado santo, “a soledade de nossa Senhora com tanta dor e fadiga” (EE 208, 11).

A graça a pedir, na 3ª semana, “dor, sentimento e confusão, porque por meus pecados vai o Senhor à paixão” (EE 193), pode ser formulada em termos de compaixão que nos leva a acompanhar Jesus, sem arredar pé (…)

“Eu não sei o que será de nós: talvez sejamos crucificados em Roma”, comenta Santo Inácio depois da visão na capela de La Storta, em 1537.  Ele vê Jesus com a cruz às costas, ouve a voz do Pai e do Filho que o aceitam como seu servidor. Trata-se da confirmação do seguimento de Cristo nosso Senhor, que ao longo dos Exercícios se vai pedindo, de modo particular na 3ª Semana. Agora, o peregrino terá parte “na vitória, como a teve nos trabalhos” (EE 93, 4). Nada, talvez, resuma melhor a graça da consolação da Cruz do que estas súplicas que Santo Inácio convida cada um de nós a dirigir a Jesus: Paixão de Cristo, confortai-me; nas vossas chagas, escondei-me.

Pontos de oração:

1) Conversa com Cristo, “assim pendente na cruz” (EE 53, 3), espelho da humanidade, “nosso sumo pontífice, modelo e regra nossa” (EE 344, 2).

2) Deixas-te comover por alguma cena ou personagem que mais tenha tocado o teu coração? Permanece, “sem ter ânsia de passar adiante” (EE 76, 3).

3) Caminha com Jesus, ouve cada uma das suas sete palavras (cf. EE 297), assiste ao descimento da cruz, “em presença de sua Mãe dolorosa” (EE 298).

Fotografia de Thuong Do – Unsplash

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.