Realizou-se entre os dias 26 de julho a 01 de agosto mais uma edição do Campo de Viajantes, a proposta da Pastoral Juvenil da Companhia de Jesus que convida os jovens dos centros universitários a reviver a experiência de peregrinação de Inácio percorrendo os caminhos espanhóis até Loiola. Esta caminhada espiritual que decorreu no período que antecedeu o término do mês inaciano, e que culminou no dia da Solenidade do fundador da Companhia, foi vivida de forma especial através da experiência dos Exercícios Espirituais.
Ao longo de 80 quilómetros, cinco etapas, os 43 participantes foram acompanhados por cinco religiosos da Companhia de Jesus e das Escravas do Sagrado Coração de Jesus – Ir. Maria Alarcão aci, Ir. José Silva, sj, P. Marco Cunha, sj, P. Miguel Pedro Melo, sj e Diogo Marques Gaspar, sj. Fizeram também parte da organização e orientação do caminho uma mamã, a Xana; uma Tia, Patrícia Boavida; o João Pedro Filipe (Jêpê); Ana Vicente e o João Melo.
Partilhamos o testemunho de como três viajantes viveram esta experiência:
Por Mariana Cardal
O medo quase que foi maior do que a vontade.
Será que vou conseguir fazer os km todos?
Será que vou conseguir entregar me à oração?
Será que me vou deixar desinstalar?
Estas foram algumas das perguntas que invadiram o meu pensamento, até ao dia da partida.
Um caminho de simplicidade pelas Montanhas Bascas, até Loyola, à casa onde Santo Inácio se converteu. Esta foi a proposta. A garantia é que seria mais peregrinação do que passeio, mais oração do que diversão, mais silêncio do que festa! E, em boa verdade, foi tudo! Atrevo-me a dizer que qualquer descrição ficará aquém do que ali se vive.
Agora percebo as palavras parcas dos meus amigos que já tinham ido.
Nos mais de 80km percorridos, descobri a liberdade de ser desprendida, de me despojar das certezas, e percebi que é possível crescer na ‘ignorância’. Não sabia o percurso, o tempo que andávamos, as paisagens que íamos viver, onde íamos dormir e, muito menos, o caminho pelo qual Jesus me conduzia.
Fui chamada a largar o que já conheço e ir mais longe, numa confiança e entrega cega nos outros.
Ali, experimentei verdadeiramente, uma frase de Santo Inácio, que oiço desde pequena: “não é o muito saber que sacia e satisfaz a alma, mas o gostar e saborear as coisas internamente”. O caminho não podia ser mais simples e rotineiro: subir a montanha, descer a montanha. No entanto, todos os dias pisámos terra sagrada.
Cada peregrino que conheci foi me conduzindo até Jesus, como na parábola do paralítico. Mesmo em silêncio, ganhamos consciência que, quer em momentos de maior fragilidade, quer de maior consolação, estávamos juntos e, que essa será sempre uma Graça que deve ser celebrada.
Não há maior beleza que estar rodeada de pessoas que oferecem o seu tempo a Jesus, numa busca incessante de servir o mundo.
Foram dias de afinar rumo, de voltar ao básico, de relembrar que ‘tudo o que tenho e possuo foi me dado e que está ao dispor da Sua inteira vontade.’
As palavras serão sempre poucas para descrever uma experiência que é inteiramente vivida. Por isso, resta-me tentar e dizer, como tantos me disseram: -VAI!
Que a vontade seja sempre mais forte do que o medo.
Por Leonor Banha da Silva
o corpo tem muito espaço
para que eu reze
o Senhor toca-lhe
em pradarias imensas no topo de montanhas
nas florestas do coração dos montes, que é o Seu
nas estrelas a sondar o céu de palavras antigas
no nevoeiro que cobre a vergonha dos cumes
no musgo fresco sobre árvores inteiras
no vento, murmura o meu nome
e nas aves, nos rebanhos, no santuário de Aránzazu
e nas flores, sobretudo nas flores
com que encanta o passo do peregrino
Por Fábio Penafria
O peregrino faz um caminho igual ao que percorre a água que encontrámos algures numa clareira, durante uma subida de algumas horas. Da nascente misteriosa e em que confiamos à fonte, tosca e muito útil. Tínhamos sede e sede de ter sede. Levámos pouco mais do isto para este Campo de Viajantes, e o que de mais levámos fomo-lo deixando cair. Fizemo-nos peregrinos com Inácio.
Cada paisagem ficou em nós impressa como a realidade colorida duma vida própria e animada, e, ainda assim, tão apenas como a imagem duma beleza anterior, duma verdade em todas e acima de todas as coisas. Insufladas por este princípio criador, as montanhas bascas foram o cenário da nossa oração, que repartíamos em rostos, com os conhecidos e com os que conhecemos, assim como quem reparte um bolo de chocolate que a mãe nos pôs na mochila à pressa, que nem queríamos, e que nos soube tão bem.