When They See Us: rever certezas

A Brotéria sugere uma série que nos obriga a pensar sobre o racismo. Um convite a rever as nossas “certezas” em relação a determinados grupos sociais e um aviso: a tolerância não é uma medalha, mas uma tarefa.

A Brotéria sugere uma série que nos obriga a pensar sobre o racismo. Um convite a rever as nossas “certezas” em relação a determinados grupos sociais e um aviso: a tolerância não é uma medalha, mas uma tarefa.

O racismo não é uma decisão. Ninguém acorda uma manhã e “decide” começar a ser racista ou adotar uma visão xenófoba dos outros. O conjunto dos preconceitos, pré-juízos, expetativas positivas e negativas que condicionam (e caracterizam) a nossa perceção de uma determinada etnia, raça ou grupo nacional, incluindo o nosso próprio, são fruto da nossa história individual e coletiva, do que ouvimos, vimos e vivemos. Refletem também, ainda que só raras vezes disso sejamos conscientes, essa ânsia de categorizar o mundo que nos dá segurança e que transforma a realidade num espaço familiar, previsível, ordenado, mesmo que isso acarrete o custo de “pôr rótulos” nalguns ou de marginalizar outros.

A minissérie When They See Us (em Portugal: Aos olhos da justiça) coloca, diante de nós, as nefastas consequências deste fenómeno tão dramaticamente humano. Ao centro do palco está o caso da violação de uma jovem mulher no Central Park (Nova Iorque), na noite de 19 de abril de 1989. Nessa mesma noite, nesse mesmo lugar, um grupo de umas dezenas de jovens de raça negra decide fazer a ronda do parque naquilo que eles próprios chamaram wilding, isto é, num misto de jogo e de luta com quem com eles se cruzou. Cinco desses jovens acabarão por ser detidos pela polícia e confessar sob pressão um crime de violação que não cometeram. Julgados e condenados, passarão entre seis e treze anos detidos em centros de correção ou na prisão, no caso de Korey Case, tendo sido absolvidos do crime apenas em 2002, quando um outro detido, Matias Reyes, confessou ter sido ele o autor.Série

Porém, e isto é o seu mérito principal, a série não quer ser uma reflexão sobre os erros judiciais, ou aquele erro judicial em particular. Também não pretende simplesmente “corrigir” a História, mostrando que “os bons” (a polícia, a procuradora de justiça, o júri, etc.) afinal é que eram “os maus” e vice-versa. Aquele caso é o pretexto para uma visão panorâmica sobre uma sociedade “infetada” pelo “vírus” do racismo. Ou melhor, uma sociedade onde os estereótipos dominam o discurso e o olhar de quem julga, de quem é julgado, de quem assiste, de quem comenta nas rádios e nas televisões, a ponto de reduzir tudo, com maior ou menor subtileza, a uma questão de “nós” e “eles”, “humano” e “bárbaro”.

Escrito e dirigido com mestria por Ava DuVernay, When They See Us é, simultaneamente, um convite e um aviso. Um convite a rever as nossas “certezas” em relação a determinados grupos sociais, os quais temos a tendência, individualmente e em sociedade, a “demonizar”. Um aviso: a tolerância não é uma medalha, mas uma tarefa, sempre urgente e sempre inacabada.

https://www.youtube.com/watch?v=InMokMK3ji4

Ficha técnica:

Género: drama policial
Duração: 64-88 min
Criadores: Ava DuVernay
País: EUA
Idioma original: Inglês
Produtores: Jeff Skoll, Jonathan King, Jane Rosenthal, Robert De Niro, Berry Welsh, Oprah Winfrey e Ava DuVernay;
Distribuição: Netflix
Data de estreia: 31 de maio de 2019;
Nº de temporadas: 1
Nº de episódios: 4

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.


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Esta secção é da responsabilidade da revista Brotéria – Cristianismo e Cultura, publicada pelos jesuítas portugueses desde 1902.

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