“Ao terceiro dia” é um grupo de cristãos com doença grave e/ ou crónica e seus cuidadores, que juntos procuram encontrar sentido e luz, num caminho de maior aceitação e integração da realidade.
É um grupo bonito, necessário, discreto mas cheio de força, é um grupo salvador.
Vivo agora em paz com as minhas doenças, mas nem sempre foi assim.
Quando descobri que tinha doença de crohn, há 24 anos, a minha circunstância era diferente dos dias de hoje. Os meus filhos eram pequenos, com dois e quatro anos, tinha ainda muitos sonhos e muita força, mas não tinha a serenidade nem a paz interior que hoje tenho.
A minha vida mudou totalmente desde esse dia, o primeiro dia.
Ainda assim, agradeci a Deus não ter morrido, como tudo fazia prever. Achei então que tinha que ser forte e mostrar-me sempre muito bem com a doença, vivendo em esforço constante, numa luta inglória, que me sugava as forças e o ânimo, acabando numa depressão e tristeza profundas. Esta forma de viver a doença, não era certa nem errada, era a única que eu conseguia viver. Custa tanto aceitar que precisamos que cuidem de nós! Custa tanto deixar que façam parte da nossa fragilidade!
Percebi então que tinha que viver com o crohn como parte integrante da minha vida, para conseguir viver pacificada com isso. Afinal, a doença faz parte de mim, como outra coisa qualquer.
E assim acordava para o segundo dia.
Os momentos mais tristes que passei, não foram por causa da doença. Não a culpo de nada. Sou muito grata pela minha vida, pelas imensas graças que Deus me dá todos os dias, pelas pessoas que fui conhecendo, pelos grupos que me permitem crescer na fé, pela família maravilhosa que tenho, por conseguir viver muitos dias ao terceiro dia, o dia da alegria e da ressurreição!
Há cinco anos, tive que parar com o tratamento para o crohn, porque comecei a piorar, pondo-se a hipótese de ter outra doença autoimune. E uma nova fase da minha vida começou: a espera. Esperei meses angustiados e longos até a certeza do lúpus chegar, de uma maneira violenta e brutal. O lúpus tem uma parte visível e eu não sabia que não lidava bem com isso! Fiquei dias e dias sem conseguir reagir, pensar ou rezar. E voltei ao primeiro dia. Não é por estar habituada a ter dores, que dói menos. Não é por já ter passado por uma doença, que se aceita outra da mesma forma.
A oração tornou-se a única maneira possível de viver com a doença. Tornou-se o meu refúgio, a minha nascente inesgotável de paz.
A espera, que ao princípio me parecia angustiante e estática, com o passar dos meses tornou-se numa experiência frutuosa e enriquecedora. Espera de esperança, de abandono, de entrega. Porquê deixar o coração expectante com o amanhã, se o hoje, o agora, tem tanto para fazer e para amar? E de novo o amanhecer para o segundo dia.
A oração tornou-se a única maneira possível de viver com a doença. Tornou-se o meu refúgio, a minha nascente inesgotável de paz. Com a oração, preencho o tempo que sobra ao tempo da espera, ao tempo de debilidade, em que não tenho força para nada e sou obrigada a parar. É o meu tesouro mais bem guardado, a parte de mim que permanece inalterável.
Amar o tempo é o que mais tenho aprendido com o grupo ao terceiro dia. O tempo do hoje, do agora, como o tempo favorável. Amar os meus limites, a minha fragilidade, neste tempo preciso que estou a viver. Tal como um poema, em que o tempo da pausa dá sentido ao verso, o mesmo tempo faz-me respirar e balançar entre os dias da doença. É isso, o grupo ao terceiro dia é poesia na minha vida!
A partilha, o testemunho e a comunhão profunda com outros doentes, faz-me sentir parte de um todo, faz-me sentir unida a todas as pessoas que sofrem, faz muito sentido em comunidade.
O Grupo “Ao terceiro dia” conta já com quatro núcleos, no Porto, Lisboa, Braga e Vila Real.
Na próxima quinta-feira, dia 3 de Março, às 21h15, haverá uma sessão de apresentação online, aberta a todos. É necessária inscrição que pode ser feita aqui.

Fotografia: Masaaki Komori – Unsplash
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.