“Positivos, agradecidos e não demasiado complicados” e “mantendo, em cada situação, um espírito flexível, aprendendo a adaptar-nos” é a receita para sermos felizes do Papa Francisco, no ponto 127 da Exortação Apostólica “Alegrai-vos e Exultai!” Embora desconcertante e simples, esta é a experiência comum a todos os que, já na Terra, sabem ser felizes e antecipam, assim, a felicidade no Céu porque acredito que, como São Josemaria dizia, “a felicidade do Céu é para os que sabem ser felizes na Terra”. A verdadeira felicidade anda por caminhos de verdade e vida e esse andar vai-nos fazendo desfrutar de momentos felizes: um bem-estar, uma alegria tranquila e serena que nos invade de uma forma somática a partir de algum ponto de ignição: um sorriso, um abraço, umas palavras trocadas, um pensamento ou decisão que tomámos e levámos em frente. Esta felicidade encontramo-la, na maioria das vezes, quando temos a noção, muitas vezes inconsciente, de que fizemos o que deveríamos ter feito e estivemos por inteiro nisso mesmo. Esta dinâmica de discernimento e entrega é o que torna a felicidade sinónimo de santidade.
E por isso quando se trata de equacionar o tempo e a energia que dedicamos a cada dimensão da nossa vida, seja à família, seja ao trabalho profissional, seja a iniciativas de voluntariado, seja aos amigos, seja a nós mesmos, seja a Deus, o principio é também o mesmo: discernimento e entrega. Discernir sobre as prioridades e metas de curto-prazo, para o dia de hoje: o que hoje tenho de fazer, no trabalho, com a família, com todos. Tudo na mesma agenda, de preferência escrito a lápis, para que durante o dia possamos ir ajustando à realidade. E discernir também as prioridades de longo-prazo, ou seja, para a vida inteira. E em relação a essas é bom parar e revê-las periodicamente: à semana, ao mês ou uma vez por ano, recolhermo-nos e olharmos a agenda. Se formos verdadeiros na agenda, ficará claro onde está a nossa vida e, com alguma criatividade, encontraremos o pormenor que podemos mudar ou a grande decisão que temos de tomar para começar a mudar. Já a entrega, significa estar por inteiro no que fazemos: quando estamos a trabalhar, fazê-lo com entusiasmo, brio e eficiência; quando estamos em família, conviver com os outros; quando descansamos, dormir profundamente; etc. Parece simples, mas não é sobretudo num tempo em que tendemos a preocuparmo-nos em demasia, como se tudo dependesse de nós, a estar todo o tempo ligados a todos – estamos à mesa a responder a emails e em reuniões trocando mensagens com os filhos.
“A primeira necessidade é estar presente: próximo do marido, para compartilhar tudo, alegrias e preocupações, dificuldades e sonhos. Desta partilha se alimenta a amizade e cumplicidade que permite construir e gerir toda a vida. Mas também, estar muito perto dos filhos e do seu crescimento.”
Hoje centro-me na família já que celebramos o seu dia. Quando são pequenos é quando brincam e quando estudam, e, ao longo de toda a vida, quando estão descontraídos e quando se sentem preocupados, quando não se calam ou quando estão silenciosos, quando hesitam ou quando avançam e ousam. Estar perto não para os controlar, mas, sobretudo, para os olhar atentamente, para os acompanhar, para conversar com eles e deles a Deus. E já jovens adultos, o interessante é que cada um continua a necessitar que estejamos perto à sua maneira: um continua a gostar que nos sentemos mesmo ao lado dele, precisa de nos sentir tão próximos que nos pode tocar; o outro precisa apenas de nos sentir por perto, muitas vezes à distância de um whatsapp; o terceiro precisa que tenhamos tempo para ouvir e conversar, antes e depois de tomar decisões e nas suas reflexões muito próprias sobre a vida. Cada um necessita da presença e sente a ausência de forma diferente, à sua maneira. Por isso é tão importante conhecer cada um, de forma individual, ouvi-los com simplicidade e entendê-los já que a medida da necessidade é a deles e não a nossa.
Mas na família, a presença é também importante pelo exemplo acompanhado por palavras, em que se transmite princípios, valores, regras de vida que os formam e lhes dão identidade: o apelido familiar. Curiosamente, muito de tudo isto se passa à mesa – é a partilha da refeição,mas também da ternura, das histórias, dos eventos – e é também à mesa que se sente, imediatamente, quando alguém tem algum problema. Por isso é tão bom reunir a família à volta da mesa, na refeição diária, nas festas de aniversário, nas celebrações ou só para estarmos juntos. E não só a família mais próxima: também os avós, os tios, os sobrinhos, os amigos. A beleza das mesas de família é mesmo essa: a de serem grandes o suficiente para caber sempre mais um.
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.