Conhecemos pelos olhos, pelo coração e até pelos ouvidos… já encontrámos Jesus com todos os nossos sentidos. Ao longo dos textos sagrados, podemos sentir as diversas reações de Jesus: umas causam incompreensão, outras dão azo a interpretações apetitosas ou até um encontro profundo com a pessoa que Ele é. Jesus revela-se sempre no mais autêntico, através da Sua vida.
Talvez a compaixão constitua o elemento mais expressivo dos relatos evangélicos. Vejamos… Depois da notícia da morte de João Baptista, Jesus retira-se num barco, diz a escritura que «sozinho», sendo, no entanto seguido pela multidão. E, ao desembarcar, Jesus vê essa mesma multidão. Cheio de misericórdia, cura os enfermos (cf. Mt 14, 14). Num outro momento, encontra a viúva de Naim a sepultar o seu único filho. Ela chora e Jesus compadece-se dizendo-lhe: “Não chores.” Aproximando-se, Ele toca no caixão, e os que o transportavam param. Diz então Jesus: “Eu te ordeno: Levanta-te!”. O morto sentou-se e, depois de falar, regressa pelas mãos de Jesus a sua mãe. (cf. Lc 7, 14 – 16). Noutra passagem, encontramo-Lo a percorrer regiões diversas e a ensinar nas sinagogas. Proclamava o Evangelho e fazia milagres, simplesmente. Esse mesmo Jesus que tudo criou é o Homem que se “enche de compaixão” pela viúva, quando a vê cansada e abatida, tal “como ovelhas sem pastor”. Em muitos outros momentos, Jesus revela a mesma compaixão pelo Seu povo (cf. Mt 9, 36).
Há, no entanto, um evento marcante da Sua vida, no qual Jesus se enfurece, ainda que misericordiosamente! Quase na vertigem da Páscoa dos judeus, sobe a Jerusalém e encontra no templo os vendedores de bois, ovelhas e pombas, bem como os cambistas nos seus postos. Então, fazendo um chicote de cordas, expulsa-os a todos do templo: “Não façais da Casa do meu Pai uma feira” (cf. Jo 2, 14 – 16).
Há, no entanto, um evento marcante da Sua vida, no qual Jesus se enfurece, ainda que misericordiosamente! Quase na vertigem da Páscoa dos judeus, sobe a Jerusalém e encontra no templo os vendedores de bois, ovelhas e pombas, bem como os cambistas nos seus postos. Então, fazendo um chicote de cordas, expulsa-os a todos do templo: “Não façais da Casa do meu Pai uma feira” (cf. Jo 2, 14 – 16).
O próprio Senhor, que nos consola de todo o choro – “Bem-aventurados os que choram porque serão consolados” (cf. Mt 5,4) –, é capaz de chorar como um Homem. Quando Maria, irmã de Lázaro, O informa da morte do seu irmão, Jesus vê-la a chorar bem como os judeus que a acompanhavam. Então Jesus começa também a chorar. Diziam os judeus: “Vede como era seu amigo!” (cf. Jo 11, 33-36). Jesus entra em comunhão connosco, com os nossos sentimentos; compadece-se com a tristeza dos Seus amigos e chora com eles. Noutra ocasião, chora sobre Jerusalém, mais concretamente pela falta de arrependimento do Seu povo: “quando se aproximou, ao ver a cidade, Jesus chorou” (cf. Lc 19, 41).
Ao expressar estes três sentimentos tão humanos que nós todos já experimentámos – a compaixão, a fúria e o choro da tristeza –, Jesus revela a sua humanidade: “tornou-Se verdadeiramente um de nós, semelhante a nós em tudo, exceto no pecado” (cf. Gaudium et spes, 22).
Em nenhuma parte do Evangelho vimos Jesus a rir! Mas será que rir é pecado? Ensina-nos a Santa Igreja que não e mesmo pelo exemplo de tantos santos que nos reforçam a alegria como traço identitário do Cristão! Diz-nos Jesus nas Bem Aventuranças, em S. Lucas, que sejam “Bem-aventurados vós, que agora chorais, porque haveis de rir” (cf. Lc 6, 21).
Tendo Jesus chorado pelo seu amigo, creio que juntos sorriram quando a vida lhe foi restituída pelo Pai… afinal eram amigos! Tendo Jesus chorado sobre Jerusalém pela falta de arrependimento do seu povo, seguramente que juntos sorrirão, nem que seja na eternidade.
Olhemos para um marco histórico da vida de S. Francisco Xavier, o grande missionário jesuíta, que tinha na sua capela do castelo onde nasceu uma representação de Cristo a sorrir na cruz: um sorriso que só é visível para quem olha bem debaixo da cruz, para quem alcança a humildade de se ajoelhar diante da Cruz do Senhor. Assim foi a alegria que inundou a vida deste Santo durante a sua missão, tal e qual como a alegria daquele Cristo que tinha no seu castelo no Seu trono. A alegria que não desaparece mesmo no momento de dor, a alegria do amor que se dá.
A sorrir na cruz? Mas como?! Não há qualquer ligação humana nesta relação… Na verdade não há, mas Cristo sorriu, seguramente sem hipocrisia, na autenticidade que caracteriza a Sua vida entregue livremente por ti e por mim.
A ilustração da cruz sorridente do castelo de Xavier revela a liberdade de quem cumpre sempre a vontade d’Aquele que O enviou, a vontade do Pai. Por Ele e com Ele, o Filho chora e crucifica-Se livremente para que tu e eu sejamos salvos. Quando rezava no Monte das Oliveiras, o Seu “suor tornou-se-lhe como grossas gotas de sangue, que caíam na terra” (cf. Lc 22, 44), gotas que revelam o sorriso de quem leva a missão confiada até ao limite dos limites, vivendo connosco para sempre.
Em Jesus encontramos o alimento da alegria e do sorriso. Em Caná, Jesus espera e diz que “ainda não chegou a minha hora” (cf. Jo 2, 4) porque quem não espera, desespera! Jesus é a “Ressurreição e a Vida” (cf. Jo 11, 25) e cumpre até ao fim a vontade do Pai, mesmo quando suplica “Pai, se quiseres, afasta de mim este cálice; contudo, não se faça a minha vontade, mas a tua” (cf. Lc 22, 42). Depois da Ressurreição, os discípulos foram para o monte na Galileia, tal como Jesus lhes tinha indicado. Diz a Escritura que alguns “ainda duvidavam” (cf. Mt 28, 17).
Ainda assim, Jesus envia-os, dizendo “Ide, pois, fazei discípulos de todos os povos” (cf. Mt 28, 19). Tudo na certeza que o próprio Jesus nos deixou: “Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos” (cf. Mt 28, 20).
Podemos viver hoje este mistério do sorriso eterno em cada Eucaristia onde estão «verdadeiramente contidos, real e substancialmente, o Corpo e o Sangue, juntamente com a alma e a divindade de nosso Senhor Jesus Cristo”, tal como reza o sagrado Concílio de Trento. O próprio Jesus terá dito: “Tomai e comei: Isto é o meu corpo” (cf. Mt 26, 26). Ali, lugar e tempo por excelência onde entregamos as nossas alegrias e tristezas, o que temos e o não temos, a eternidade acontece. Mais do que tudo, encontramos Cristo de braços abertos, sorrindo como sorriu no envio dos apóstolos e na Cruz de Xavier. Sobre essa Cruz Jesus suporta as nossas fragilidades.
Só quem não desespera….
Só quem vive o silêncio do peso da cruz…
Só quem experimenta o consolo da entrega…
Só quem bebe do cálice da salvação…
Só quem vence a morte, e vive para sempre…
… é capaz de sorrir verdadeira e eternamente!
E em todos estes momentos Cristo sorriu!
O sorriso de Cristo inspira-nos!
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.