Já comemorou 20 anos de carreira. Como resume este tempo, quais os principais momentos, dificuldades, desafios? E o que acha que ainda lhe falta alcançar enquanto músico?
Foram 22 anos que valeram a pena. Não foi um mar de rosas. Os primeiros 10 anos de carreira foram marcados por enormes sacrifícios pessoais e por uma luta diária que poucas vezes deu frutos no imediato. O reconhecimento público chegou 10 anos depois, com o álbum Acústico. Nesse álbum recuperei temas dos primeiros 3 álbuns que foram re-gravados em formato acústico. Esse álbum foi 8 vezes platina. Os dias menos bons fizeram com que vivesse os bons de uma forma mais feliz, agradecendo essa dádiva e nunca esquecendo que não há direitos adquiridos.
Disse numa entrevista que algumas pessoas têm uma imagem de si que não corresponde à realidade e que, por ser reservado, é por vezes visto como distante e até vaidoso. Mas na prática, o André é um homem de causas e da solidariedade, tendo por exemplo, sido reconhecido recentemente pelo Presidente da República pela sua ajuda às vítimas dos incêndios. O que o leva a ser assim?
A homenagem foi uma iniciativa da Câmara Municipal de Oliveira do Hospital, mas foi o Presidente da República que teve a amabilidade de me entregar essa distinção. Não o fiz à espera de nada. Naquele momento, como em tantos outros, avanço por se tratar antes de mais, de um imperativo de consciência, uma forma de retribuir o que me dão. A realidade dos incêndios mexeu e mexe muito com as minhas mais profundas convicções.
Que valores subjazem a esta entrega ao próximo? Têm alguma motivação espiritual ou religiosa? Ou apenas uma convicção humanista e no bem que o ser humano (também) é capaz de fazer?
A motivação espiritual pode em muitos casos ser a motivação para ajudar o próximo. Contudo, já me cruzei na vida com algumas pessoas que pregam mas não praticam. Acho por isso que a educação que recebemos em casa pode ou não ser profundamente inspiradora. Tive uma educação que me faz em cada dia ter uma consciência social e um papel na sociedade. Esse papel não se deve medir ou quantificar. Cada um fará o que pode… eu tento fazer a minha parte.
Teve uma educação religiosa?
A minha avó materna foi responsável pela minha educação religiosa. Foi ela que me passou esses valores e essa formação. Curiosamente quando fui à missa pela primeira vez, bati palmas quando o padre acabou de falar… espero ter sido perdoado! No fundo, devo ter achado que deveria levar para a missa os aplausos dos espetáculos que sempre me fascinaram…
Como integra a vida de músico e de empresário com a vida familiar?
É animada a minha vida! Requer uma grande capacidade de concentração e foco no trabalho para poder ter tempo de qualidade para a família. Aprendi ao longo do tempo a não sobre valorizar os problemas do dia a dia. Dessa forma não vivo tanto o stress.
Acho também que estou a encontrar o ponto de equilíbrio. Não quero mais grandes projectos porque o meu maior projeto é criar os meus filhos.
O que tenta passar aos seus filhos?
Tento passar valores, respeito pelo próximo, consciência social, muito mais. Gostaria também que tivessem hábitos de trabalho e noção que nada nos cai do céu.
Neste sábado, vai fazer um concerto no Colégio São João de Brito. De onde vem a relação próxima com os jesuítas?
Eu abri recentemente um hotel em Coimbra- o SAPIENTIA Boutique Hotel, instalado em edifícios da Província Portuguesa da Companhia de Jesus (PPCJ), onde em tempos estiveram sediados o noviciado e o Centro Universitário Manuel da Nóbrega (CUMN). Esses edifícios foram alvo de uma profunda reabilitação. Durante o processo de reabilitação, estive em contacto com várias pessoas da PPCJ, em particular com um homem que muito estimo e respeito – o P. Francisco Rodrigues. Juntos fizemos da adversidade a oportunidade e construímos mais do que um hotel. Sinto que tenho hoje amigos na PPCJ e que existe uma enorme relação de respeito, compreensão, entre ajuda e amizade. Diria que é raro no mundo dos negócios…Estou muito grato à PPCJ e este concerto não é mais do que um gesto simbólico de agradecimento.
Fotografia: Paulo Segadães.
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.