Quando tomei a decisão de ir viver para a Islândia, fui parar a Akureyri uma pequena cidade de aproximadamente 19000 habitantes, localizada a norte da ilha no fiorde de Eyja. Rapidamente me integrei na pacata comunidade católica, na sua maioria composta por emigrantes. De facto, os islandeses, à semelhança dos outros vizinhos nórdicos, não tem grande tradição católica. O catolicismo é praticado na sua grande maioria por emigrantes que encontram um espaço com quem partilhar a fé.
Foi num Domingo de Novembro que, após a missa, as irmãs carmelitas me sugeriram ir visitar a casa-museu de um padre islandês “conhecido”. Quando lá cheguei, percebi que o padre se chamava Jón Sveinsson, sj. Fiquei intrigado, contudo o “sj” não deixava margem para dúvidas. Tinha de perceber quem era aquele homem e como é que havia um jesuíta naquela terra remota.
Jón Stefán Sveinsson mais conhecido por Nonni, foi um jesuíta e escritor de contos infanto-juvenis que o popularizaram na primeira metade do século 20. Nonni nasceu a 16 de novembro de 1857 na quinta de Möðruvellir em Hörgárdalur no norte da Islândia. Por aí viveu os primeiros anos da sua vida com a sua família até se mudar para Akureyri para uma pitoresca casa de madeira escura que hoje é o museu em sua honra: a Nonnahús – Casa de Nonni.
Após a morte do pai, um fidalgo francês oferece-se para pagar a educação a Nonni. Esta oportunidade implicava que Nonni teria de ir para França estudar deixando a família. Assim, aos 12 anos Nonni navega rumo ao “Velho Continente” sem saber se alguma vez mais iria regressar à sua ilha natal ou ver a família outra vez. Nas despedidas, entre outras recomendações, a sua mãe pede-lhe que reze todos os dias, e que se lembre dela e da família durante as suas orações.
Os anos da sua juventude na quinta e em Akureyri tiveram um o grande impacto na vida de Nonni. De facto, os seus contos infantis têm uma matriz autobiográfica muito forte, fruto das experiências vividas durante esse período. As suas histórias têm detalhes fascinantes das paisagens e da cultura islandesa que Nonni recorda sempre com muita saudade.
Antes de conseguir ir para França, Nonni fica retido em Copenhaga, devido à Guerra Franco-Prussiana. É nesse período que trava conhecimento com os Jesuítas, entrando para um colégio da Companhia administrado por jesuítas alemães e dinamarqueses. É nessa época que Nonni começa a sua conversão do luteranismo para o catolicismo.
Em 1871 entra na Latin School em Amiens. Nos anos seguintes, Nonni adapta-se a uma realidade completamente distinta à que estava habituado. Faz muitas amizades e, inclusive, trava conhecimento com o famoso escritor de histórias Júlio Verne, onde este lhe pergunta muitas coisas sobre a Islândia.
Em 1878 Nonni entra para a Companhia de Jesus e, durante esse período vai estudar filosofia, literatura e teologia em diferentes universidades europeias (França, Bélgica, Holanda). Em 1883 vai para o colégio de Ordrup, na Dinamarca, onde trabalha como professor. Finalmente, em 1888, vai para Inglaterra estudar Teologia e aí é ordenado padre jesuíta.
Volta a estabelecer-se em Ordrup como professor, contactando de muito perto com jovens começa a perceber a sua afinidade missionária e de contador de histórias. Após lecionar quase 2 décadas, Nonni retira-se do ensino e começa a dedicar-se inteiramente à escrita. As suas histórias contam as aventuras de Nonni e do seu amigo e irmão Ármann (Manni), estas sagas rapidamente se popularizam entre o público juvenil sendo um sucesso mundial. Os livros, inicialmente, escritos em alemão, foram traduzidos para mais de 30 idiomas e com cerca de 6 milhões de exemplares impressos.
Durante o resto da sua vida, Nonni tem a oportunidade de viajar e dar conferências aos jovens acerca da sua vida. Com 80 anos viaja sozinho até aos Estados Unidos e Japão a fim de contactar com os leitores e outros interessados na sua obra. Acaba por morrer em Colónia aos 86 anos no final da Segunda Guerra Mundial.
Nonni é considerado uma figura literária islandesa que construiu a sua obra missionária longe do fiorde de onde nasceu, porém isso nunca o impediu de se lembrar de onde vinha. Nos seus contos é possível identificar as bases da espiritualidade Inaciana e de como esta espiritualidade pode ser um caminho a seguir. Coincidência ou não, a vida deste jesuíta cruzou-se com a minha, lembrando-me que a Igreja é missionária e universal, até nos lugares que pensamos serem remotos.
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.