A exposição “A natureza detesta linhas retas“, de Gabriela Albergaria, reúne na Culturgest pela primeira vez uma antologia da obra da artista, tecendo uma narrativa sensorial em torno da relação do Homem com a Natureza e dos processos humanos que nela intervêm. A natureza representada pela artista não se manifesta nem exacerba o seu estado natural e selvagem; antes é apresentada e inventariada em modo intervencionado, manipulado e transformado, já como natureza feita cultura, apropriada e marcada pelo trabalho nela executado. As peças traçam um cuidadoso percurso de recolhas de matérias, que são como que detritos do mundo natural – ramos e pedaços de árvores minuciosamente encadeados são elevados a um estatuto de preciosidade. São glossário de diversidade estética, científica e geográfica. Uma coleção de troços de ramos é reparada através de enxertos com plasticina; uma árvore destruída é reconfigurada como escultura, os seus membros consertados com parafusos e ferragens de aço.
Há uma lente de explorador-recoletor apontada ao meio natural.
É evidente o contraste entre rural e urbano, matéria orgânica e industrial: o jogo de manipulação e de domesticação que Gabriela Albergaria estabelece com os elementos da Natureza vai percorrendo a fronteira entre o natural e o artifício. O modo como a artista se relaciona com o mundo natural evoca metodologicamente os modos de recolher, intervencionar, inventariar, catalogar e expor do naturalista, do jardineiro ou do botânico. É patente nesta exposição a mecânica desse levantamento; uma pesquisa que passa pela coleção de sementes e a sua representação em álbuns de recorte a laser, pelo registo desenhado a lápis de cor dos diferentes veios da madeira, pelo desenho de paisagens de floresta. Há uma lente de explorador-recoletor apontada ao meio natural. Destacam-se os desenhos em grande escala de florestas e copas de árvores, paisagens recriadas a meticuloso lápis de cor, em sequências encadeadas com fotografia, e que traduzem os ambientes naturais que representam, aparecendo como extensão experiencial desses mesmos lugares.
Em “A natureza detesta linhas retas” ouvimos o chamamento suave do mundo natural e percebemos a sua força e fragilidade face aos passos desajeitados do homem e das suas tentativas de dominação. Deixa uma interrogação subtil, um confronto com o nosso lugar na natureza e na ordem das coisas.
Exposição – A natureza detesta linhas retas
Até 7 de Março – Culturgest
Morada: Rua Arco do Cego, 50 – Google Maps
Horários e entrada – informação aqui
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.
Sugestão Cultural Brotéria
Esta secção é da responsabilidade da revista Brotéria – Cristianismo e Cultura, publicada pelos jesuítas portugueses desde 1902.
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