Ainda me lembro da primeira vez que fui para um campo de gambozinos: chegar à estação e não conhecer ninguém, as dores de barriga na noite anterior de tanta ansiedade, o olhar à minha volta e ver pessoas tão diferentes (achava eu) e, no fundo, não saber o que esperar desta aventura que me propunham. Com o passar dos anos, para além da novidade inerente a todo o contexto do campo de férias, o que me foi surpreendendo nestes 10 dias por ano passou a ser sobretudo o quanto podia levar dali para a minha vida “normal”, em particular, a consciência de que, por mais que as aparências façam crer o contrário, somos todos iguais na essência e a certeza de que é muito mais o que nos aproxima do que as pequenas divergências na forma de pensar e de agir.
Este campo, desta vez de serviço, não foi diferente nesse aspeto. Aliás, ficou marcado, desde o primeiro dia, pela entrega conjunta tanto dos animados como dos animadores, quer pelo compromisso em sair da zona de conforto quer pela procura do serviço, tantas vezes na sua forma mais plena, isto é, impercetível pelo resto do campo. Em primeiro lugar, foi um tempo e um espaço propício a parar, a acalmar, a fazer um ponto de situação nas nossas vidas, já que a realidade que nos envolveu foi a do rescaldo de um ano e meio de pandemia, que também esteve presente no contexto do campo, não obstante o enorme esforço coletivo (com muito sucesso, diga-se de passagem) para impedir que o campo fosse lembrado como o “Campo da Covid”. Em segundo lugar, foi um grupo sempre disponível para acolher a diferença e no qual senti que consegui dar uma parte de mim aos outros que não achava ser capaz, como, por exemplo, um momento de entrevistas de futebol após a Gamboliga ou uma homenagem aos Gato Fedorento com a representação de um sketch. Além disso, animados e animadores fizeram por eliminar as barreiras que pudessem existir entre os escalões, fazendo com que todos contribuíssem para um fim comum: o serviço. Por fim, posso dizer que saí do campo de coração cheio, porque estes dias me fizeram compreender o que é amar e ser amado, que amar e servir é uma escolha e que, por isso, podemos amar não só quem gostamos, como também quem não gostamos e, sobretudo, que esta entrega aos outros que fazemos em plena liberdade não depende das circunstâncias, não depende de onde vimos, não depende se é feita em Lisboa, em Braga, no Pragal ou no meio do campo perto da aldeia de Maladão.
Assim, ao avaliar o meu último campo como animado, no qual pude dar os primeiros passos a servir e a retribuir tudo o que os Gambozinos me foram dando ao longo dos anos, percebo que o sentimento que está por trás do desejo de querer ser animador é o de ter recebido tanto dos campos, atividades e encontros, que preciso também de levar tudo isto aos outros e que, por esse motivo, é uma alegria enorme poder continuar nos Gambozinos, agora como animador, a aprender cada vez mais a servir e a deixar-me ser servido.
Manuel Sérgio