Olhando para trás, parece que o nosso mundo não existiu sem os GBZ. A sério!

Mal nos lembramos de como era a nossa vida numa casa sem aplausos, sem “aqueles” cânticos, sem os relatos entusiásticos da loucura saudável trazida de uma “tarde fixe”, de um Mini-Campo ou de um campo de Verão. Sem o barulho saltitante das rodas gigantescas, onde sempre cabia mais um, e que enchiam todo o Largo de São João do Souto ou, mais tarde, a Praceta da Faculdade de Filosofia. Sem o afeto colocado nas histórias vividas com aquele outro gambozino, com uma experiência de vida completamente oposta e que muita riqueza traz às nossas vidas, certamente o principal dos tesouros recebidos. Sem a lembrança dos mimos da mamã, dos apelos do animador ou da condução do diretor. Sem o espanto provocado pelo conhecimento das perguntas feitas nos momentos culturais, para resolver a rir problemas que poderiam fazer miúdos chorar. Sem o desafio lançado no BDS e assumido com vontade, alegria e empenho, ou sem a partilha do lavar a louça ou das sornas feitas conversa, cantares ou simplesmente “pa’ estar”. Sem a ida até à “Ilha” ou assistir à “Super-produção”. Sem ter ido de Braga a Cascais sem outra razão que não participarmos, todos, no La Trina.

A sério! Quase não nos lembramos… Nós, que nunca estivemos numa “tarde fixe”, num Mini-Campo ou num campo de verão.

Porque ser Gambozino não é exclusivo dos nossos filhos. É algo que fomos, através deles, trazendo para o centro da nossa mesa, ali onde se cozinha o que de mais importante se vive em nossa casa. Por isso, é fácil para nós fazer desfilar nomes – muitos sem rosto, porque nunca os vimos, – jogos, novelas e imaginários, como se tivessem sido vividos na primeira pessoa. Tudo isso, para nós, se tornou familiar: parte da nossa casa e da nossa família.

É verdade que tudo nos chegou principalmente através dos nossos filhos e dos seus relatos entusiasmados. E deles pode sempre vir tanto ensinamento bom! Mas se no meio de tanto bem recebido tivermos algum mérito – para não dar todo o crédito à sorte – foi o de adotar tudo aquilo como nosso e o de nos permitir, mesmo já sem idade e “à revelia”, fazermo-nos também nós Gambozinos e darmos graças a Deus por isso. Porque numa casa em que todos o somos, há um monte de coisas que se tornam mais fáceis: principalmente a perceção que o mundo é injusto, mas que podemos fazer algo para que o seja menos; a constatação de que a diferença não é para esconder, mas sim para criar possibilidades de cada um ir mais longe, sendo fiel a si próprio, levando os outros nesse caminho de maior riqueza e diversidade; a certeza de que há um Deus que quer bem a cada um, com a sua história particular, carregada de incapacidades e dificuldades, mas também de alegrias e graça que é fundamental reconhecer; a confiança de que a natureza é a nossa casa, que nos acolhe e tudo nos dá, permitindo o descanso reparador e a harmonia silenciosa que nos calibra o corpo, a alma e os sentidos, e que por isso importa tratar com todo o cuidado e a pôr mãos à obra para construir um mundo de ecologia integral.

É assim que olhando para nós, família, percebemos que os Gambozinos foram e são uma parte importante do caminho que nos ajuda a definir e compreender, a cada um e em conjunto. E que olhamos à volta e vemos outras famílias como nós, que também são Gambozinos do primeiro ao último membro, com quem partilhamos este modo de olhar para o mundo. E, no meio de muita loucura e brincadeira, de uma alegria que reconhecemos vir do sítio certo, olhamos e vemos que tudo isto é muito bom.

Porque ser Gambozino é um assunto sério. A sério!

Catarina e Pedro

(Gambozinos adotivos)