A Principia já tinha feito um grande serviço ao publicar em 2009 a tradução portuguesa do grande Manual de Bioética – Fundamentos e ética biomédica de Elio Sgreccia, Cardeal, recentemente falecido (5.6.2019), presidente da Academia Pontifícia para a Vida e grande pioneiro desta área do saber e da prática. Agora, a Principia em colaboração com a fundação ‘A Junção do Bem’, oferece-nos este “pequeno” manual de Ética Médica, de autores portugueses, muito actualizado, rigoroso e esclarecido. Era necessário. Espero que se divulgue para fazer luz, com uma visão realmente humanista, sobre questões tão controversas e tão frequentemente tratadas ao sabor, não da ética, mas das pressões ideológicas e dos interesses políticos e económicos dentro da cultura individualista, tecnocrática e pós moderna.
Já nos anos noventa, um movimento que agregava médicos, cientistas, juristas, sociólogos, filósofos e teólogos e que em 1986 constituíram o CEB (Centro de Estudos de Bioética), publicou na editorial Verbo (1996) um manual: “Bioética”, coordenado por Luís Archer, Jorge Biscaia e Walter Osswald, com muitos outros autores portugueses. É lamentável que esta obra, ainda actual, não se tenha reeditado. Poucos anos depois, em 2001, o mesmo grupo, na Porto Editora publicou “Novos desafios à Bioética”, importante complemento, mas, igualmente, esgotado, não reeditado.
É claro que o conceito de Bioética é mais abrangente, mas inclui, como seu núcleo, a ética médica, as questões ligadas à vida humana, à sua dignidade e à moralidade em toda a prática da medicina. Ora esta realidade e seus desafios éticos, numa cultura tecnocrática, legalista, superficial e libertária que endeusa o apetecer individualista dos que têm dinheiro e/ou o poder das ideologias de moda, tende a ser substituída por pragmatismos ideológicos, políticos e económicos. A técnica permite, a lei não proíbe, logo é “bem”! Mas a reflexão sobre o que é mais humano e mais humanizante não se conclui a votos partidários sem reflexão antropológica.
Espero que [este livro] se divulgue para fazer luz, com uma visão realmente humanista, sobre questões tão controversas e tão frequentemente tratadas ao sabor, não da ética, mas das pressões ideológicas e dos interesses políticos e económicos dentro da cultura individualista, tecnocrática e pós moderna.
Toda a ética supõe uma antropologia. E como essa não se quer discutir, pois “cada um é que sabe o que lhe convém”, dificilmente se ultrapassa um “policiamento deontológico”. Até as orientações da OMS, por vezes, são reféns de pressões socialmente corretas, mais concluídas a partir das estatísticas do que de um verdadeiro debate científico e ético, humanista em prol do bem maior e do bem comum.
Este volume da Principia, “Reflexões sobre Ética Médica”, coordenação de Pedro Afonso e Miguel Cabral, tem a virtude de enfrentar e discutir, estas e outras questões candentes, sem o complexo de poderem ser, como acontece, descartadas como “opiniões religiosas” ou “ideias ultrapassadas da moral católica”. O que temos é a reflexão de uma nova geração de pensadores (20 autores), na sua maioria médicos, profissional e humanamente reconhecidos, abordando corajosamente as questões sobre a vida nos seus inícios, nos seus processos de crescimento, capacidades e doença bio-psico-sócio-cultural, os seus limites e relações humanas e os cuidados no fim da vida. Em particular, tocando a fundo as relações médico doente-e-família, bem como as práticas de justa e informação com formação, descodificada e adaptada a cada caso, verdadeiramente compassiva. E, por fim, nas últimas 15 páginas, o livro apresenta um notável trabalho conjunto de 7 médicos de várias especialidades, absolutamente urgente e necessário: uma Proposta de Código Ético para o Ensino e Prática da Medicina.
Reflexões sobre Ética Médica
376 págs., Principia, 2019
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* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.
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Esta secção é da responsabilidade da revista Brotéria – Cristianismo e Cultura, publicada pelos jesuítas portugueses desde 1902.
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