A Política Interessa-nos. Este é o mote da iniciativa que lançamos no começo desta semana e que pretende fomentar a reflexão e o debate e ajudar os nossos leitores a exercer o direito de voto de forma mais consciente e informada. Para isso, enviamos aos partidos políticos que se candidatam às eleições legislativas em todos os círculos eleitorais um conjunto de questões sobre temas considerados prioritários para a Companhia de Jesus. Deste modo, as perguntas foram enquadradas e elaboradas pelas organizações da Companhia de Jesus que trabalham no terreno, em áreas como o ambiente (Fundação Gonçalo da Silveira), os refugiados (Serviço Jesuíta aos Refugiados), a pobreza e o terceiro setor (Centro Paroquial da Mexilhoeira Grande), a família (Pastoral da Família dos Jesuítas) e o interior do País (Jesuítas do Interior e do Sul). Os temas abordados refletem, assim, as preocupações de quem lida diariamente com a realidade, nas mais diversas áreas e zonas do país.
Depois do tema do Ambiente, das respostas às perguntas sobre Interioridade e das explicações dos partidos sobre a sua política migratória, seguimos hoje com o tema da Pobreza e do Terceiro setor. .
É este o contributo do Ponto SJ para uma reflexão sobre as eleições legislativas. A Política interessa-nos.
Pobreza e Terceiro setor
A necessidade de aumentar a rede de vagas para creches tem sido uma intenção manifestada pelos partidos políticos de forma a melhorar a vida das famílias e a promover o acesso à educação das crianças mais pequenas. Além disso, as vagas já disponibilizadas pela rede privada e não privada (terceiro sector) comportam mensalidades que não são acessíveis para grande parte das famílias com menores rendimentos. Esta tem sido uma preocupação sentida pelo Centro Paroquial da Mexilhoeira Grande, que vem agora perguntar:
Como defendem que deve ser feito o alargamento da rede de creches: através da criação de lugares públicos ou do reforço da colaboração com o terceiro setor?
Partido Socialista (PS)
As duas vias não se excluem. Nesta legislatura, investimos na criação de mais de 200 salas de educação pré-escolar, aproximando-nos da universalização para as crianças de 3 anos. A necessidade de alargamento de lugares de creche gratuitos é uma medida fundamental enquanto garantia de que as famílias, sobretudo as mais dependentes, podem ter filhos e conciliar a sua educação com os seus rendimentos. Pode e será feita tanto na rede pública, quanto através da colaboração com o terceiro setor.
O Governo assinou, em julho deste ano, o Acordo de Cooperação com o Setor Social e Solidário, fruto de um trabalho de cooperação muito produtivo com o terceiro setor. Este Acordo prevê uma redução da comparticipação familiar entre os 10% e os 20%, bem como a intenção de reforçar as creches em zonas de baixa densidade populacional, em cooperação com este setor, como medida de estímulo à fixação das famílias nestes territórios. O acordo prevê ainda um reforço de financiamento para as creches que integram crianças com deficiência, para além da comparticipação financeira que corresponde ao dobro do valor fixado no acordo. Dois aspetos fundamentais deste acordo são o aumento do valor do apoio, que, conforme reconhecido pelos representantes do setor, é uma resposta que permitirá atualizações salariais, e a criação de equipas de apoio e suporte técnico para as IPSS que indiciem risco de entrar em situação de desequilíbrio financeiro.
É, obviamente, fundamental que, tanto na creche como na educação pré-escolar, haja total transparência para as famílias sobre os períodos abrangidos pela gratuitidade, conforme previsto no Acordo de Cooperação.
Este Acordo é uma clara afirmação da tradicional capacidade que o Partido Socialista tem de trabalhar com o terceiro setor, sem lógicas de rutura e sem que isso signifique o abandono no investimento em serviços públicos.
Partido Social Democrata (PSD)
Não deixa de ser paradoxal o facto de termos cada vez menos crianças e revelarmos uma taxa de risco de pobreza das crianças e jovens superior à taxa média nacional. É precisamente no grupo etário com menos de 18 anos que o efeito das transferências sociais é mais reduzido. O PSD entende que o combate à pobreza infantil terá de passar por uma nova abordagem expressa numa nova geração de políticas para a infância. Os apoios dados à maternidade/paternidade e a gratuitidade das creches constituirão as medidas com maior impacto a médio e longo prazo.
Entretanto, teremos de considerar a pobreza infantil, quando enquadrada em contextos de pobreza extrema cuja abordagem terá de ser focada na ação e concertação locais, envolvendo os municípios e as instituições de solidariedade na identificação, monitorização e ação de proximidade.
O PSD quer garantir o acesso a uma Educação de qualidade, desde a primeira infância De acordo com a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, todas as crianças têm direito à proteção, provisão e participação nos serviços de ECEC (Early Childhood Education and Care), pois a pobreza infantil afeta gravemente o bem-estar das crianças, o seu desempenho educacional e a sua autoestima. A primeira infância corresponde a um período de desenvolvimento cognitivo crítico e crucial da criança. Uma educação de infância de alta qualidade é apontada como tendo efeitos benéficos no desenvolvimento inicial das crianças e no seu desempenho escolar subsequente em vários domínios, como no uso da língua, nas competências académicas emergentes – na literacia da leitura e na numeracia – e nas competências sócio emocionais, que potenciam o posterior sucesso académico e plena integração social, em particular nas crianças oriundas de contextos socioeconómicos mais desvantajosos.
Promover o acesso generalizado e equitativo a serviços acessíveis e de elevada qualidade de educação pré-escolar e programas de educação e cuidados para a infância, em especial para as crianças mais desfavorecidas, assume-se hoje como indispensável para ultrapassar défices de conhecimentos, de aptidões e competências que limitam o desenvolvimento pessoal e profissional. A Comissão Europeia tem vindo a alertar para a vantagem, em termos de eficiência e eficácia, de se privilegiar o investimento público nas primeiras fases da educação, pois os elevados custos de educação e guarda nos primeiros anos de vida podem constituir por si um entrave ao aumento da taxa de natalidade. Importa relembrar que, em Portugal, para uma família cujos rendimentos se aproximem do rendimento mediano pode ser hoje mais caro ter uma criança numa creche do que um filho na Universidade.
Conscientes da realidade atual de muitas famílias, em que pai e mãe trabalham sem poderem contar com qualquer suporte familiar, e das dificuldades que enfrentam para que as suas crianças tenham acesso a cuidados e educação desde a primeira infância com qualidade, comprometemo-nos a implementar as seguintes medidas:
- Universalização da creche e jardim de infância, dos 6 meses aos 5 anos, nas redes social e pública, através da criação de uma rede nacional de creches e jardins de infância tendencialmente gratuitos.
- Os parceiros de implementação da rede universal, as IPSS, devem estar preparadas para assinar protocolos de cooperação os quais serão objeto de escrutínio e monitorização por parte do Estado.
- Assegurar a colocação dos alunos através de uma plataforma central. Esta plataforma tem como missão receber as candidaturas efetuadas pelos pais, sendo-lhes conferida a possibilidade de colocar por ordem os 3 estabelecimentos da sua preferência. Por seu turno as IPSS devem manter sempre atualizado o número de vagas disponíveis. A plataforma colocará a criança no estabelecimento que primeiro tiver vaga, respeitando os critérios de acessibilidade claramente definidos. Existem em Portugal mais de 5.000 IPSS distribuídas por todo o território, o que se apresenta como um requisito relevante por forma a que uma medida desta dimensão não seja potenciadora de assimetrias regionais nem de discriminações de base social.
- Programa de incentivos ao estabelecimento de creches e jardins de infância por parte das autarquias, das IPSSs e das empresas ou associações de empresas, com recurso a fundos comunitários para construção e reabilitação de berçários, creches e infantários. Prevê-se a majoração da medida nos territórios do interior.
- Aumento das deduções com as despesas de Educação em sede de IRS, prevendo-se a majoração da medida nos territórios do interior.
- Implementar um Plano de rastreio da acuidade visual, auditiva e de saúde oral para todas as crianças até aos 5 anos, utilizando os meios já disponíveis na Administração Pública.
Bloco de Esquerda (BE)
A educação inclusiva começa na primeira infância. E chega a ser mais caro ter uma criança na creche do que numa universidade privada. Mesmo quando se trata de creches públicas, o valor das mensalidades pode representar metade do salário médio. Este quadro limita o acesso das famílias à resposta e ignora que a criança é um sujeito de direitos desde que nasce. O custo das creches relaciona-se com duas opções de política: a) as creches não estão inseridas no sistema de ensino, mas na Segurança Social, pelo que a oferta está nas mãos do setor privado e no setor social (IPSS); b) as creches são vistas como assistência às famílias e não no quadro dos direitos da infância, o que contribui para desresponsabilizar o Estado.
Neste sentido, a proposta do Bloco de Esquerda é clara: inclusão das creches (0-3 anos) no sistema educativo, garantindo a gratuitidade.
PCP – PEV
A proposta do PCP e da CDU é garantir a todas as crianças creche gratuita, ou soluções equiparadas, assegurando medidas transitórias até à implementação de uma rede pública que garanta a cobertura integral a todas as crianças até aos 3 anos. Isso passa, no imediato, pelo aproveitamento das respostas já existentes, nomeadamente do sector social, seja em valência de creche, seja de creche familiar, ou das amas da Segurança Social.
Defendemos que esta medida é necessária e possível de assegurar para os bebés que nascerão a partir de 2020. Pretendemos com esta proposta dar a certeza e a segurança a cada família que, a partir do final da licença de parentalidade, terá garantida, se assim quiser, uma vaga sem custos.
Pensamos igualmente que é necessário aprofundar o estudo sobre o conteúdo, a organização e os apoios pedagógicos adequados às crianças em idade de frequentar a valência de creche até aos 3 anos.
Centro Democrático Social (CDS)
Acreditamos um verdadeiro Estado Social de Parceria, que convoca todos os setores – público, privado e social – para a prestação de serviços na saúde, na educação ou no domínio social, das creches e jardins de infância aos centros de dia ou ao apoio domiciliário.
Como afirmamos no nosso programa eleitoral, o Estado tem de criar um regime de contratualização com o setor social e privado, para que nenhuma família fique privada de poder colocar os seus filhos em creches.
O Estado deve contratualizar com o setor social as vagas necessárias para universalizar o acesso às creches. Isso permitirá ter vagas mais depressa, e gastando menos do que construindo novas creches. É uma proposta que gasta menos do que as propostas das esquerdas nesta matéria. Se as vagas do setor social não forem suficientes, deve o Estado contratualizar com o setor privado as vagas em falta.
Queremos um Estado justo e eficiente e acreditamos um verdadeiro Estado Social de Parceria, que convoca todos os setores – público, privado e social – para a prestação de serviços na saúde, na educação ou no domínio social, das creches e jardins de infância aos centros de dia ou ao apoio domiciliário.
Para o CDS, assim faz sentido.
Pessoas-Animais-Natureza
De facto, as elevadas mensalidades das creches privadas constituem um entrave para as famílias com menores rendimentos. Tendo em conta a essencialidade destes serviços, consideramos fundamental o aumento da oferta pública de vagas em creches e jardins de infância, devendo ser garantida a universalidade da educação pré-escolar gratuita a partir dos 3 anos de idade. Deve igualmente ser revogado o princípio das crianças serem aceites nas creches apenas de acordo com as vagas referentes à sua idade. As crianças devem ser aceites no infantário desde que haja vaga para qualquer ano, devendo as creches tendencialmente promover a interacção entre todas as crianças.
Aliança
- A Aliança defende a liberdade de opção em matéria de Educação, por um lado, como, por outro, também defende uma articulação de meios e recursos entre o Estado e o Terceiro Sector, aliás, não apenas útil como necessária.
- Para a Aliança, o Estado, para prosseguir aquilo a que está obrigado pela Lei Fundamental, não tem de ser dono nem administrador de serviços cuja missão, como é consabido, o Terceiro Sector melhor prossegue, desde logo por estas instituições estarem historicamente vocacionadas para tal.
- Deste modo, a nossa opção é claramente de reforço da colaboração com o Terceiro Sector, onde as Paróquias e Misericórdias, entre outras, desempenham um relevante papel na capilaridade do trabalho social em Portugal, também por causa da sua proximidade e conhecimento dascomunidades, famílias e pessoas concretas.
Livre
Defendemos que as creches devem ser integradas na rede de escolas pública e que devem ser asseguradas vagas para as crianças a partir dos 4 meses de idade.
Iniciativa Liberal
Preferencialmente através da colaboração com o terceiro sector. Acreditamos que o terceiro sector é, em Portugal, um exemplo claro da forma como os cidadãos são capazes de se organizar para dar resposta às suas necessidades.
Tendo em conta a evolução demográfica de Portugal, o desenvolvimento societário, económico e tecnológico e um objectivo de sustentabilidade, presente e futura, aliada a uma gestão critérios de recursos será impossível não ter em conta a importância da económica circular. Assim, sabendo-se que estaremos perante um processo participativo, qualquer organização (como uma IPSS) que contratualize uma resposta supletiva (i.e., uma prestação de serviços em regime de subsidiariedade) e que execute essa resposta responsavelmente será indispensável.
Independentemente da forma jurídica e da natureza da entidade, o que está em causa é a responsabilização pela prestação de serviços, que desejamos seja boa, à população. Quem o fizer continuará a ser apoiado, quem não o fizer, deixará de o ser. Ou seja, o financiamento não será automático, mas arbitrário e sujeito ao cumprimento de critérios.
Partido Nacional Renovador (PNR)
A resposta do PNR a esta questão está incluída na temática que iremos apresentar amanhã.
Chega
Pelo reforço da colaboração com o terceiro sector.
Nota: A ordem dos partidos corresponde ao resultado do último ato eleitoral realizado em Portugal, as Eleições Europeias. O Chega não estava constituído como partido nesse momento e por isso é o último partido a aparecer.
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.