O adiamento de qualquer evento importante das nossas vidas pode gerar frustração ou até uma grande desilusão. Qualquer um de nós já o sentiu com aquela conversa, reunião ou viagem importante que foi adiada, ou até mesmo desmarcada. A consequência desta desilusão muitas vezes leva-nos a baixar os braços, a descomprometer-nos com o que é importante para nós e/ou para o mundo ou revisitar as nossas prioridades, deixando aquele tema no fundo da nossa gaveta ou da nossa to-do list. Falamos em concreto do adiamento do encontro de três dias em março de 2020 na cidade italiana de Assis, “Economy of Francesco”. Um convite único do Papa Francisco, inspirado em S. Francisco de Assis. Os convidados são jovens até aos 35 anos, economistas, gestores, investigadores, empreendedores e change-makers. Este encontro mundial pretendia lançar as bases de uma transformação económica virada para o cuidado do nosso planeta, a nossa “casa comum”, com a Pessoa Humana no centro: eu, o outro e todos nós. Dada a pandemia foi inevitavelmente adiado de março para novembro de 2020, e de formato presencial para digital. O encontro começa hoje.
Mas pode um adiar ser na verdade a possibilidade de um salto inesperado? Para nós, claramente este adiamento surgiu primeiro como um impedimento que levemente se transformou numa oportunidade. E como tantos outros movimentos que arrancam no mundo, este “salto leve” só foi possível porque conseguimos viver isto em comunidade. Porque, em vez de nos sentirmos sozinhos a viver a desilusão do adiamento nos juntámos em pequenos e grandes grupos, e assim reajustámos o plano ao contexto de incerteza. Ao refletir na nossa experiência, reconhecemos que foi realmente a força do coletivo que nos fez transformar o tempo e os sinais adversos numa oportunidade. Mas quem de nós/vós nunca sentiu o mesmo em relação a algo adiado que tenha já antes desejado?
Este encontro mundial pretendia lançar as bases de uma transformação económica virada para o cuidado do nosso planeta, a nossa “casa comum”, com a Pessoa Humana no centro: eu, o outro e todos nós.
Efetivamente, contra muitas expectativas e envolvendo um rollercoaster emocional típico deste contexto de pandemia, este adiamento foi na realidade um antecipar dos trabalhos. Uma consciencialização de que estes 2.000 jovens, aos quais se somaram entretanto mais 3.000, são na realidade os atores desta mudança à qual o Papa deu voz: o movimento da Economia de Francisco. E criou-se, contrariamente ao esperado, um sentimento de urgência. Quantos de nós, ao ver os valores de poluição na China reduzir drasticamente nesta pandemia (fonte DN: https://www.dn.pt/mundo/nasa-mostra-como-a-poluicao-diminuiu-drasticamente-na-china-depois-do-virus-11875307.html), percebemos ou já não pudemos ignorar o quão relevante é questionar o atual modelo económico e o peso que este tem na sustentabilidade do nosso planeta? A covid-19 foi um wake up call para a nossa interdependência, um ponto de viragem para estarmos mais atentos e sermos mais críticos e construtivos sobre o atual papel dos países, das empresas e dos indivíduos, e da mudança necessária em todos os níveis individuais e coletivos.
Destacam-se três fatores para o sucesso deste salto:
1 . O movimento da Economia de Francisco está estruturado em 12 villages, cada uma com um tema e vários sub-grupos internacionais que se organizam através de plataformas de conferências digitais e pastas de documentos partilhados para criar projetos de investigação, empresas, webinars, conteúdos e as mais diversas iniciativas e propostas. Utilizamos todos ainda a App Mighty Networks para comunicar as diferentes atividades que acontecem em todo o mundo e partilhar artigos e informação interessante. A comunicação a nível mundial tem dois benefícios: combate o isolamento e cria um banco mundial de ideias com futuro;
2. Através das plataformas digitais emergem lideranças inesperadas. A partilha de ideias é mais democrática, os talentos dos diferentes perfis têm mais oportunidades de se conhecer, nomeadamente pela escrita e pelo trabalho colaborativo, e os que mais participam mais legitimidade conquistam. O julgamento visual da pessoa é menos acelerado e somos convidados a ouvir mais e mais lentamente;
3. O poder da replicação manifesta-se mais rapidamente – surgem chapter locais a um ritmo mais acelerado. Em Portugal, a Acege Next montou um curso de 6 sessões para 50 jovens interessados, que depois teve continuidade noutro segundo curso de 6 sessões com 40 jovens, e rapidamente criou-se o chapter português Economia de Francisco Portugal (para todos os que queiram acompanhar vejam o site (economiadefrancisco.org).
Cada um de nós que participa no encontro acredita numa economia mais humana que parte da ecologia integral para procurar o bem comum. Parecem palavras feitas, mas a partilha e a ilusão da caminhada destes meses permitem-nos sonhar. Fazemos parte do maior movimento mundial a pensar e repensar os modelos económicos e em breve chegaremos a todos os que sentem, como nós, esta urgência. Ao começar o nosso encontro com pequenos passos digitais sentimos aquele friozinho na barriga do inesperado, da magia do movimento coletivo. Não sabemos o que vai emergir, sabemos apenas que nos guia a missão de transformar o digital em passos concretos, do global para o local e sobretudo para o real das vidas de cada um de nós. E assim conseguiremos levar o sonho de Assis, o sonho dos dois “Franciscos” para todo o mundo.
Como é que tu, que nos estás a ler, individualmente, podes participar neste movimento coletivo que a Igreja oferece ao mundo?
4 sugestões:
- Rezar por estes jovens do movimento da Economia de Francisco e pelos líderes em todo o mundo
- Juntares-te ao movimento da Economia de Francisco Portugal https://economiadefrancisco.org/
- Conheceres mais sobre a Economia de Francisco, por exemplo acompanhando o canal Youtube https://www.youtube.com/channel/UCVKz5pM4geof3NvZO7GOylw
- Trazer o espírito do movimento para a tua realidade local: trazer inquietações, perguntas e metodologias colaborativas com outros jovens para a realidade da tua paróquia/comunidade
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.