Em arte, há uma tensão contínua entre um olhar em direção às essências e um olhar que se perde nos infinitos detalhes do mundo. A cada momento o artista encontra-se face a movimentos estéticos que o colocam diante desta tensão. Sempre a mesma tensão, entre a abstração e o real. Quando Platão fala nas formas, é no sentido de nos fazer vislumbrar o que se passa no interior do artista.
A modernidade em pintura começa com o Impressionismo. Por um lado, o quadro seria o que o artista vê, a realidade; por outro lado, o que o artista vê é a impressão da realidade, uma impressão subjetiva. Mas depois vêm os triângulos, os rectângulos e os quadrados coloridos de Cézanne. O cubismo fará uma síntese entre a ideia de impressão, subjetiva e a ideia de Cézanne, objetiva. Mas para Picasso é a figura que tem que ser atacada, usando os instrumentos desta tensão. Nasce o cubismo e o retrato do homem moderno. O homem fragmentado… Pouco a pouco perde-se a possibilidade da figura… Mas com Mondrian perde-se de vez também a da paisagem. O ponto de vista é de cima e a paisagem, urbana, é vista como quem olha do Espaço – e vê o infinitamente grande, já sem medida humana… Com Paul Klee, dirigimo-nos no sentido oposto, para o infinitamente pequeno – mas sempre longe de qualquer medida humana… Com a aceleração tecnológica e a ocupação do território pelos media vem a estocada final, a pintura torna-se uma atividade de resistência (cet’art perimé de la peinture, dizia Bonnard).
Ainda é possível visitar a exposição de Ana Ruepp. Ainda nos é possível entrar numa realidade em que cada quadro, cada desenho, vão abrindo caminho dentro de nós, ponto por ponto, em direção à luz. Criando assim uma possibilidade de vida mais simples, que não vem de nós mesmos, mas das obras que acabámos de ver. Esta abertura do mundo é a poesia que a faz. É o que faz Ana Ruepp, que é pintora.
Ana Ruepp parece encarar esta resistência com felicidade. O seu apego às essências não a afasta do mundo. A resistência não a amargura. A sua pintura parece criar uma privacidade que deveríamos também encontrar. Como construir uma vida a partir desta lição? Uma arte assim tem um objetivo humilde. É apenas uma arte de viver.
Ainda é possível visitar a exposição de Ana Ruepp. Ainda nos é possível entrar numa realidade em que cada quadro, cada desenho, vão abrindo caminho dentro de nós, ponto por ponto, em direção à luz. Criando assim uma possibilidade de vida mais simples, que não vem de nós mesmos, mas das obras que acabámos de ver. Esta abertura do mundo é a poesia que a faz. É o que faz Ana Ruepp, que é pintora.
Este artigo integrou o caderno cultural da revista Brotéria
Todas as fotos cedidas pelo Gabinete de Comunicação da Sociedade Nacional de Belas-Artes.
Informações:
Exposição patente até dia 22 de agosto
Sociedade Nacional de Belas-Artes
Rua Barata Salgueiro, 36 – 1250-044 Lisboa (localização no Google Maps)
Tel.: 213 138 510
Email: [email protected]
Horário:
Sábado – 14h00 – 20h00
2ª, 3ª e 4ª – 12h00 às 19h00
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.
Sugestão Cultural Brotéria
Esta secção é da responsabilidade da revista Brotéria – Cristianismo e Cultura, publicada pelos jesuítas portugueses desde 1902.
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