1.
A LUTA CONTRA O PLÁSTICO
Podemos sonhar um mundo sem ele?
Impressionados com as imagens das gigantescas ilhas de plástico que povoam os oceanos e da fauna marinha a sucumbir nas malhas de objetos tão aparentemente inofensivos, muitos parecem ter despertado para o drama do plástico. Será possível uma vida sem ele, questionamo-nos?
Campanhas e vídeos apelando a uma irradicação deste material invadiram as televisões e as redes sociais, bem como reportagens de máquinas a sugar estas lixeiras dos oceanos e de anónimos a retirar o lixo das praias. Mensagens impactantes que fizeram crer que a atitude de cada um é decisiva neste combate. Mas uma atitude exigente, de fundo, capaz de implicar uma mudança profunda na forma de viver, de consumir e de estar.
Seja ou não sol de pouca dura, a verdade é que este problema tocou muitas pessoas, desinstalou-as e o discurso ambiental e da sustentabilidade do planeta saiu das franjas dos ativistas e começou a entrar na vida de muitos, até agora bastante alheados das questões ambientais. Aos poucos, foram evitando os sacos de plástico, eliminando as palhinhas ou fazendo escolhas diferentes na hora de ir ao supermercado. Mas será isto suficiente? Os especialistas dividem-se, e há quem afirme que para combater os plásticos é preciso uma revolução política à escala mundial.
Plastic Oceans – Organização que visa informar e consciencializar sobre o impacto da poluição provocada pelo plástico.
Trialler de documentário em Inglês.
2.
ACORDO DIPLOMÁTICO ENTRE A CHINA E A SANTA SÉ
Um sinal histórico ou uma ferida difícil de sarar?
O acordo diplomático entre a Santa Sé e o governo chinês poderá ficar para a História, mas não deixará de ser um dos pontos de interrogação do pontificado do Papa Francisco. Há indícios de reconciliação e encontro, mas também sinais de que as feridas da divisão entre diferentes comunidades cristãs precisarão de tempo para sarar.
A perceção chinesa do Cristianismo como ameaça estrangeira remonta aos séculos XVIII e XIX, no entanto, é com o primeiro-ministro Zhou Enlai, braço direito de Mao Tsé-Tung, que se dá a criação das Associações Patrióticas para as cinco religiões reconhecidas (Budismo, Catolicismo, Daoismo, Islão, Protestantismo). Estas associações pretendiam garantir a impossibilidade de autoridades estrangeiras terem influência no que se passava em território chinês. No caso católico, criava-se assim um estrutura eclesial independente de Roma e sobre a qual a Santa Sé não podia exercer autoridade. Na carta encíclica Ad Apostolorum principis, Pio XII expunha as razões pelas quais a Igreja Católica não aceitava esta situação.
A verdade é que em torno da Associação Católica Patriótica se constituiu uma estrutura própria de culto cristão paralela àquela que costuma ser a forma de organização da Igreja Católica: bispos, paróquias, seminários, etc. Nesta organização, a nomeação de bispos competia ao governo chinês. Quanto à Igreja Católica, ficou confinada à clandestinidade, sofrendo perseguição e correndo vários riscos.
O acordo provisório assinado a 22 de setembro entre a Santa Sé e a China é um passo significativo para o fim da divisão entre estas duas estruturas, como explica o P. Miguel Pedro Melo, sj num artigo do Ponto SJ. O início da superação do conflito entre Pequim e a Igreja de Roma implicou que Francisco anulasse a excomunhão de sete bispos nomeados por Pequim, reconhecendo a sua legitimidade. O texto do acordo provisório prevê que, daqui em diante, as nomeações de bispos sejam feitas por mútuo acordo, tendo o Papa direito de veto. O acordo garante que pela primeira vez todos os bispos da China esteja em comunhão com o Papa. No entanto, é um acordo provisório, com um período experimental de dois anos. Trata-se, assim, do início de um processo que pode ser gerador de comunhão e reconciliação, mas que não deixa de estar sujeito a múltiplas leituras, inclusivamente políticas.
Documentário sobre Igreja Católica na China (legendas em português).
3.
WEB SUMMIT EM LISBOA E POBREZA EXTREMA NO INTERIOR
Um país a duas velocidades?
Dez dias apenas separam dois acontecimentos que espelham duas realidades distintas de um mesmo Portugal. Uma cimeira internacional que acolheu o topo da tecnologia e a morte de uma família por inalação de monóxido de carbono no interior profundo. O país que acolhe a Web Summit e com ela a vanguarda da tecnologia é o mesmo que assiste incrédulo à morte de uma família inteira que, por viver nas mais miseráveis condições, sem luz, numa aldeia do interior transmontano, não foi capaz de se auto-proteger.
Ao mesmo tempo que os milhões investidos na tecnologia fazem crer na capacidade do homem em superar todas as dificuldades, há uma pobreza que mata porque é escondida e distante. No século XXI em que robôs como Sophia já conseguem expressar emoções e sentimentos, somos incapazes de nos deixar tocar pela fragilidade de tantos que vivem na miséria, ao ponto de nos mobilizarmos para acabar com as desigualdades. Ou, pior ainda, desistimos de acreditar num país justo e digno para todos.
Dias mais tarde, outro caso dramático demonstra a fragilidade das instituições e da própria missão do Estado de garantir o mais básico aos seus cidadãos: a segurança. Uma estrada em Borba é engolida por uma pedreira, levando vidas e ignorando responsabilidades, em mais uma tragédia anunciada.
Poderá um país tão pequeno como Portugal conter em si mesmo tantas distâncias?
4.
ALTERAÇÕES POLÍTICAS EM ANGOLA
Uma mudança que veio para ficar?
Os longos anos de poder de José Eduardo dos Santos em Angola contribuíram para que, sob a capa de uma democracia formal e aparente, se constituísse um regime incapaz de garantir e promover direitos fundamentais como a liberdade de expressão. Ao mesmo tempo, foi aumentando a corrupção e cimentando-se o tráfico de influências que favoreceu uma elite próxima do antigo presidente angolano. A economia foi em grande parte dominada pela família dos Santos.
Nas relações com Portugal, um discurso que muitas vezes alimentou o ressentimento mostrou incapacidade de lidar com princípios básicos da democracia: liberdade de opinião e separação de poderes. Por parte de diferentes responsáveis governamentais portugueses houve, demasiadas vezes, uma complacência subserviente e cúmplice.
A chegada ao poder de João Lourenço tem trazido sinais positivos: fim de privilégios da família de José Eduardo dos Santos; diálogo que alguns dos ativistas que o anterior presidente tinha hostilizado e perseguido, nova fase nas relações com Portugal expressa na sua recente viagem ao nosso país.
Mas aquilo que se foi estruturando e consolidando ao longo de tantos anos, não será facilmente transformado. Talvez o otimismo tenha que ser cauteloso para não deixar de ser vigilante e exigente.
5.
MIGRAÇÕES: UM FENÓMENO GLOBAL
Que solução para tamanho drama?
Para os que acompanham o fenómeno das migrações é claro que este é um processo global intimamente ligado a situações de desigualdade no acesso a bens e oportunidades e também a situações de violência e perseguição. Um fenómeno global desta magnitude requer, naturalmente, respostas globais que extravasam fronteiras e interesses particulares. Nas últimas semanas de 2018 duas notícias trouxeram motivos de esperança.
A aprovação, por parte do Parlamento Europeu, no dia 11 deste mês, de uma proposta que visa a criação de vistos humanitários foi uma dessas boas notícias. A serem implementados, irão permitir que os pedidos de asilo sejam feitos a embaixadas europeias no estrangeiro, tornando a Europa acessível sem risco de vida, uma vez que a viagem para este continente seria feita por meios legais. A Comissão Europeia deve agora dar uma resposta a este pedido dos eurodeputados. A resposta deve ser dada até 31 de março de 2019.
A outra boa notícia tinha chegado um dia antes, de Marraquexe, em Marrocos, onde foi formalmente adotado o pacto global para uma migração segura, ordenada e regular. Negociado entre os estados que compõe as Nações Unidas este acordo é apoiado pelo Vaticano e por organizações católicas de Portugal.
Há, no entanto, sinais contraditórios que transformam a crise migratória numa enorme interrogação: a proposta aprovada pelo Parlamento Europeu para a criação de vistos humanitários teve uma escassa cobertura mediática no nosso país. Também no Ponto SJ notamos que este tema começa a gerar desinteresse e indiferença, com textos significativos sobre esta temática a alcançar um impacto diminuto. Por outro lado, a reação dos EUA, em especial de Donald Trump, à Caravana Migratória que tem atravessado o México e o crescente número de países que se têm vindo a afastar do pacto adotado em Marraquexe devem também ser motivo de reflexão e inquietação.
Vídeo das Nações Unidas (legendado em português).
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* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.