«Sempre tereis pobres entre vós» (Mc 14, 7): estas palavras foram pronunciadas por Jesus, alguns dias antes da Páscoa, por ocasião duma refeição em Betânia na casa de Simão chamado «o leproso». Como narra o evangelista, entrou lá uma mulher com um vaso de alabastro cheio de perfume muito precioso e derramou-o sobre a cabeça de Jesus. Este gesto suscitou grande estupefação e deu origem a duas interpretações diversas.
A primeira delas é a indignação de alguns dos presentes, incluindo os discípulos, que, ao considerar o valor do perfume (cerca de 300 denários, equivalente ao salário anual dum trabalhador), pensam que teria sido melhor vendê-lo e dar o produto aos pobres. Segundo o Evangelho de João, é Judas que se faz intérprete desta posição: «Porque é que não se vendeu este perfume por trezentos denários, para os dar aos pobres?». E o evangelista observa: «Ele, porém, disse isto, não porque se preocupasse com os pobres, mas porque era ladrão e, como tinha a bolsa do dinheiro, tirava o que nela se deitava» (Jo 12, 5-6). Não é por acaso que esta crítica dura sai da boca do traidor: é a prova de que, quantos não reconhecem os pobres, atraiçoam o ensinamento de Jesus e não podem ser seus discípulos. Recordemos, a este propósito, as palavras fortes de Orígenes: «Judas, aparentemente, estava preocupado com os pobres. (…) Se, agora, ainda houver alguém que tem a bolsa da Igreja e fala a favor dos pobres como Judas, mas depois tira o que metem lá dentro, então tenha parte juntamente com Judas» (Comentário ao Evangelho de Mateus 11, 9).