A alegria da obediência ao ser enviado para a Beira Interior de Portugal

Durante o tempo passado na Covilhã, percebi que o Senhor nos pede toda a nossa pequenez, para nos alcançar a maior de todas as grandezas, a única grandeza, que é o seu Amor. Por Rui Silva, nsj

“O Senhor pede tudo e, em troca, oferece a vida verdadeira, a felicidade para a qual fomos criados. Quer-nos santos e espera que não nos resignemos com uma vida medíocre, superficial e indecisa.” (1)

A última Quaresma, passada na Covilhã, serviu para experimentar isto que diz o Papa, que, em troca, o Senhor “oferece a vida verdadeira”. Serviu para perceber que a Sua promessa é verdadeira! Que, na verdade, todos aqueles medos de me entregar à Sua vontade foram uma perda de energias, um gasto desnecessário de justificações irreais…

Durante o tempo passado na Covilhã, percebi que o Senhor nos pede toda a nossa pequenez, para nos alcançar a maior de todas as grandezas, a única grandeza, que é o seu Amor.

A Covilhã surgiu na minha vida e formação a meio do 2º ano do meu Noviciado. «O Noviciado corresponde à formação inicial de qualquer jesuíta. É um tempo de maior “recolhimento” com o triplo objetivo de ajudar o noviço a crescer no conhecimento da Companhia de Jesus, no caminho da oração e da “intimidade com Deus”, e no aprofundamento do autoconhecimento.

Durante este tempo, há quatro “provas” (experiências) que compõem o Noviciado:

Exercícios Espirituais de mês;
Mês num hospital psiquiátrico;
Inserção numa comunidade apostólica;
Peregrinação, a pedir comida e dormida.» (2)

Estive na Covilhã nesta terceira prova/oportunidade de inserção comunitária, em que fui enviado como apóstolo, em missão. Confesso que experimentei, pela primeira vez, a alegria da obediência ao ser enviado para a Beira Interior de Portugal, o que, no início, levantou em mim algumas resistências, fruto do desconhecimento e dos conceitos preconcebidos.

Admito também que essa deve ter sido a melhor condição para me abandonar à surpresa que Deus me reservou durante este mês e meio e, assim, estar disponível para O reconhecer e acolher em cada um e em cada uma que se abriu à Sua presença, possibilitando o fascínio por essa abertura e por Quem a provoca.

Admito que não poderá haver melhor “chegar ao fim do caminho” do que fazer o próprio caminho, como me escrevia a querida D. Conceição Torrão numa linda quadra (onde me falava da “longa estrada com espinhos superada com a força do Senhor”). Porque é no próprio caminho que a vida se vive e se experimenta. Porque é no próprio caminho que se cria e vive a saudade. E é no próprio caminho que nos cruzamos e amamos e não na chegada ao fim daquilo que desejávamos ter feito e não fizemos.

Durante este tempo em que estive mais dedicado ao Apostolado Paroquial e Universitário, comecei por falar do tema “Caminho” a uma catequese de 9º ano. E acabei a rezá-lo e a perceber a importância de o viver e valorizar, de o querer e de o amar em cada “Covilhã”, em cada “quadra”, em cada “até já”, crescendo na certeza de que vivemos – e, por isso, caminhamos – unidos neste Pai que ultrapassa o físico e o temporal e nos une na eternidade da existência. Assim, vamos além da distância física, que fica depois deste encontro, e unimo-nos no coração do Pai, na oração, que é a grande justificação e a satisfação da saudade.

“O jesuíta dá de graça o que de graça recebeu: o dom do amor redentor de Cristo.” (3)

(1) Alegrai-vos e Exultai, n. 1, Papa Francisco, 2018

(2) Noviciado, A formação de um Jesuíta, Ponto sj

(3) 34ª Congregação Geral dos Jesuítas, 1995

 

Rui Silva, nsj, abril 2018