Na Sexta-Feira Santa, parece que tudo acabara com a morte de Jesus na Cruz, quando Ele, depois de pronunciar as palavras: “Meu Deus, Meu Deus, porque me abandonaste”, expirou. Então, depois de rolada uma grande pedra a tapar o Sepulcro: “um grande silêncio cobriu a terra e uma grande solidão, porque o rei dorme… Deus adormeceu segundo a carne e despertou os que dormiam há séculos… Deus acordou a região dos mortos…” (Duma antiga homilia do Ofício de Sábado Santo). Com essa grande pedra, colocada na frente do Sepulcro e o piquete de guardas posto de plantão para guardar o Sepulcro, pensávamos que tudo isto iria calar, para sempre, aquela voz que um dia começou a ressoar na Galileia e chegou até Jerusalém, o centro do poder político e religioso. Mas não. Começa o primeiro dia e, com ele, o primeiro dia da Nova Criação, significado por uma grande tremor de terra. É como se um mundo velho se desmoronasse para dar lugar um Mundo Novo. E o Céu confirma esta Nova Criação com um sinal: o anjo do Senhor desceu do Céu, faz rolar pedra do Túmulo e senta-se em cima, uma bela imagem que proclama a vitória sobre a morte e o pecado. Então, essa voz silenciada, por um tempo, começou de novo a ouvir-se por intermédio do Centurião que havia assistido à sua morte e que confessou: “este homem é verdadeiramente o Filho de Deus”. Depois, é a vez das mulheres que haviam ido ao sepulcro e que diziam que Jesus estava vivo pela mensagem do Anjo. Tudo, pois, começou por um rumor, por uma notícia que se tornou num burburinho constante que não mais deixou de se ouvir até aos dias de hoje. Esse burburinho foi-se alargando e chegou até nós como Boa Notícia, como Evangelho. O conteúdo dessa notícia passada de boca em boca, de ouvido em ouvido, de coração a coração, tinha e continua a ter como pano de fundo um acontecimento que se transformou, dia a dia, nessa Boa notícia: Jesus morreu e ressuscitou, está vivo e é vida para nós. Vós procurais Jesus. Ele ressuscitou. Esta é a Boa Notícia que muda tudo. Este anúncio transpõe as fronteiras de Jerusalém, ressoa na Galileia, na Samaria e chega até aos confins do mundo. Esta Boa notícia é de tal maneira Boa e tão cheia de esperança que contagiou e continua a contagiar muitos povos com as culturas mais diversas, que se deixaram recriar por ela. Pela Ressurreição, Jesus passa da vida “terrestre” para vida de Deus. Nele, Deus se fez homem para que o homem se faça Deus. Aquele de quem nos quisemos apoderar pelo pecado e desconfiança, recebemo-lo no amor, o amor que vai até o dom da vida. A Ressurreição de Cristo inclui a nossa ressurreição.
Ninguém viu Jesus surgir da morte. Os discípulos e Maria Madalena apenas viram o Túmulo vazio. A voz de Maria Madalena ressoa como um soluço: “Levaram o Senhor do Túmulo e não sabemos onde o puseram”. Surpreendidos por este soluço de Maria Madalena, acorrem ao Sepulcro Pedro e João. Para ambos os discípulos, o Sepulcro vazio é motivo de fé: para Pedro, que havia atraiçoado o Senhor e para João, que havia estado ao pé da Cruz juntamente com Maria a contemplaram Jesus agonizante. Para os demais discípulos, a fé na Ressurreição exigiu também um percurso, um caminho, um tempo. De João, se diz” viu e acreditou”
Para nós, neste dia de Páscoa: pedimos ao Senhor a graça de acreditarmos na Ressurreição, uma graça que é preciso pedir e pedir sempre, porque são mais visíveis os sinais da morte do que da Ressurreição. Acreditamos com mais facilidade na Cruz que se levanta diante dos nossos olhos, nas diversas crucifixões e mortes causadas pelas guerras e violências do que na vida nova de Jesus. Mas, se Cristo não ressuscitou, diz Paulo, toda a mensagem evangélica cai por terra e é vã a nossa fé (Cor.15,14) e nós, diz ainda Paulo, ficaremos encerrados para sempre nos nossos pecados.
E como é que tudo isto acontece? Não temos argumentos racionais para explicar esta transformação, porque a Ressurreição não se demonstra por um silogismo filosófico. Paulo em 1 Cor.15, 35 fala da passagem dum Corpo psíquico a um Corpo espiritual. Parece que é, para ele, uma coisa semelhante ao que diz João acerca do grão de trigo: semeado na terra, morre, mas renasce grão de trigo que deixa de estar encerrado na escuridão, das fronteiras do corpo actual e se tornar comunicação universal pelo Espírito, o grande dom da Ressurreição.
P. José Augusto de Sousa S.J.