P. José Alves Martins

17.07.1941 – 14.03.2022

Biografia

O P. José Alves Martins nasceu a 17 de julho de 1941 em São Romão de Neiva, Viana do Castelo. Entrou para a Companhia de Jesus no Noviciado de Soutelo, em Braga, em 1958 e estava em Timor-Leste como missionário desde 1974. Chegou um ano antes da ocupação indonésia do território e nunca mais saiu, mantendo-se sempre ao lado da população local nos seus momentos mais difíceis. Faleceu ontem ao começo da tarde num hospital de Vila Franca de Xira, onde estava internado desde quinta-feira na sequência de uma queda que lhe provocou a fratura do colo do fémur.. Em Timor era considerado um herói nacional.

Fez os estudos secundários na Escola Apostólica de Macieira de Cambra de 1953 a 1958 e entrou na Companhia de Jesus no dia 07 de Setembro de 1958, na Casa da Torre, Soutelo, Vila Verde.

Depois do Noviciado estudou Humanidades e em 1963 foi para a Faculdade de Filosofia de Braga, onde se licenciou em Filosofia, em 1966. Fez a etapa do Magistério (estágio apostólico) no Colégio da Imaculada Conceição, Cernache, Coimbra, onde foi Prefeito e Professos durante três anos.

Em 1969 ingressou na Faculdade de Teologia da Universidade Católica, em Lisboa, onde fez o primeiro ano de Teologia. Foi para Roma em 1970 e licenciou-se em Teologia Espiritual na Universidade Gregoriana, em 1974. Foi ordenado Sacerdote no dia 09 de Julho de 1972, na Apúlia, Esposende, Braga.

Foi destinado, como missionário, a Timor Leste, para onde partiu no dia 17 de Setembro de 1974. Começou por ser Professor e Diretor Espiritual no Seminário Diocesano, em Díli. No dia 07 de Dezembro de 1975 o Seminário foi bombardeado pela aviação indonésia. Conseguiu escapar com ferimentos ligeiros, mas viu a morte muito perto. Refugiou-se com outros companheiros numa colina perto do Seminário e tiveram que abrir buracos para se defenderem dos morteiros.

Foi viver para Díli que ia regressando à normalidade. Em 1978 reabriu o Seminário perto de Díli. Fez a Terceira Provação (etapa conclusiva da formação dos jesuítas) em Roma de 1 de janeiro de 1985 a 17 de Maio. Fez os últimos votos no dia 22 de abril de 1986, em Díli.

Exerceu o cargo de Reitor do Seminário de 1985 a 1991. Exerceu diversos cargos a nível diocesano. Foi diretor da Casa de Exercícios de Dare e orientador de Exercícios Espirituais.

Em 2000 foi nomeado Superior da residência Loyola, Taibessi (Díli) e Conselheiro do Bispo de Díli. Foi Coordenador da formação permanente do Clero e presidente da Santa Casa da Misericórdia.

Apesar da saúde abalada, por tantas tribulações que passou, continuava a trabalhar com muita dedicação. Vinha, por vezes, a Portugal para tratamentos médicos.

Em outubro de 2020, escreveu um testemunho sobre a sua ação missionária em Timor partilhada com o P. João Felgueiras, sj que completou 100 anos em junho de 2020.

A 9 de junho de 2004 foi condecorado pelo Presidente Jorge Sampaio com o Grau de comendador da Ordem de Mérito.

A 11 de maio de 2016 foi condecorado pelo Presidente da República de Timor Leste Taur Matan Ruak com a Medalha de Mérito.

A 27 de março de 2019 foi-lhe atribuída pelo Papa Francisco a medalha Pro Ecclesia et Pontifica como reconhecimento pela sua ação apostólica em Timor. Recebeu essa medalha das mãos do Bispo de Díli, na presença do secretário da Nunciatura Apostólica.

ESPECIAL OBITUÁRIO DO P. JOSÉ ALVES MARTINS

Um coração frágil mas inteiramente dedicado à missão

P. José Alves Martins foi missionário em Timor quase 50 anos. Apesar de nunca ter sonhado lá ficar, a guerra e a dedicação ao povo timorense fizeram-no permanecer ao lado dos que mais sofriam, a lutar pela independência. Morreu aos 80 anos.

Em acção de graças

Testemunhos

João Inocêncio Piedade, sj

Não tenho palavras para expressar a minha grande dor e pesar pelo falecimento do nosso irmão e amigo Padre José Alves Martins. Para além daquilo que já se conhece em Portugal em relação à pessoa do Zé Martins e à sua presença missionária por muitos anos em Timor Leste através dos meios de comunicação, desejo apenas dar o meu modesto testemunho pessoal sobre este grande jesuíta português e timorense que foi meu mestre e formador no Seminário Menor de Nossa Senhora de Fátima em Dare-Díli antes da invasão da Indonésia e mais tarde meu irmão e amigo na Companhia de Jesus.

A figura do Zé Martins captou-me logo no princípio da sua permanência connosco em Outubro de 1974 no período em que nós os jovens estudantes recomeçávamos o novo ano lectivo. Marcou-me desde o início a profundidade do seu pensamento, a lógica do seu raciocínio, a clareza e lucidez na exposição do conteúdo das disciplinas que ensinava e sobretudo o grande amor ao Senhor e à Companhia de Jesus no espírito de fidelidade à missão junto do seu amado povo de Timor Leste nos anos tenebrosos da invasão e ocupação indonésias e nos anos a seguir à independência do País até o último momento em que o Senhor o chamou para Si.

Após ter vivido na própria carne toda aquela tragédia nas primeiras semanas da invasão por todo o território de Timor e especialmente em Dare em que o edifício do Seminário foi bombardeado pelas tropas indonésias, e, o próprio Zé foi atingido por um estilhaço, continuou a acompanhar alguns dos seus estudantes dispersos, de modo particular a mim e mais outro meu companheiro também jesuíta e ambos residentes em Díli, propondo-nos de fazer sob a sua direção os Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loyola na vida quotidiana. Aquela experiência espiritual profunda levou-me a tomar a decisão de entrar na Companhia de Jesus. Entretanto, o então bispo da diocese de Díli (única diocese em todo o Timor), o falecido Dom José Joaquim Ribeiro enviou-nos num grupo de 11 seminaristas para a ilha das Flores para aprender a língua indonésia com o objetivo de prosseguir os estudos superiores no seminário maior diocesano de Ritapiret. Foi naqueles meses de estudo da língua indonésia que amadureceu em mim o desejo de entrar na Companhia.

A Providência quis que durante a nossa estadia na ilha das Flores viessem a visitar-nos os nossos formadores e amigos de Dare, o Padre João Felgueiras que atualmente tem mais de cem anos e o saudoso Padre José Alves Martins. Aproveitei da ocasião para comunicar-lhes o meu desejo de ingressar na vida religiosa na Companhia de Jesus. Ambos apoiaram sem uma sombra de dúvida a minha decisão e o Zé Martins sugeriu-me para escrever ao então provincial da Indonésia. Foi o que fiz, apesar da relutância em ir viver num País que invadiu e destruiu o meu País. Contudo, o espírito universal da Companhia de Jesus fez-me superar esta barreira e ser capaz de atravessar igualmente fronteiras “inimigas”. Meses depois o Provincial da Indonésia comunicou-me que fora aceite no Noviciado Girisonta em Java Central.

No dia da minha ingressão no noviciado em fins de Dezembro de 1977 tive a agradável surpresa de encontrar o Padre João Felgueiras como hóspede na casa do Noviciado. Estava à minha espera para dar-me força e coragem neste primeiro passo na vida religiosa. Passados dois anos, precisamente no dia em que pronunciei os primeiros votos, o Zé Martins esteve presente e celebrou comigo e com toda a comunidade do noviciado este grande evento. É escusado mencionar outras experiências pessoais com Zé Martins ao longo dos meus anos na Companhia de Jesus porque são muitas. Quis salientar apenas aqueles primeiros anos em que a presença do Zé Martins foi tão decisiva no meu percurso ulterior como jesuíta e primeiro jesuíta timorense, fruto do trabalho dos jesuítas portugueses em Dare e de modo especial do Zé Martins e do Padre João Felgueiras.

Desejo neste momento de despedida eterna do Zé Martins agradecer a sua vida, a sua longa e fiel presença no meio do nosso Povo que ele sempre amou e defendeu, arriscando a própria vida. Com muita gratidão quero agradecer a Província Portuguesa da Companhia de Jesus que nos deu este grande jesuíta, nosso irmão e amigo.

E por fim os meus agradecimentos vão à toda a família do Zé Martins em São Romão de Neiva, em outras partes de Portugal e no estrangeiro. Recordo de uma maneira especial a família da sua irmã Dona Ana da Silva e seus filhos e netos que conheci e tornou-se minha família nos meus anos de estudo em Paris. Igualmente agradeço a família da sua irmã Dona Rosa e seus filhos e netos que conheci em São Romão de Neiva. O Zé Martins também foi muito amigo da minha família em Díli e esteve presente no momento em que meu pai e sucessivamente minha mãe deram o último suspiro enquanto eu me encontrava fora de Timor. No meio da dor e da tristeza, paradoxalmente vivo uma grande alegria em saber que doravante temos um grande intercessor junto do Senhor que pede por nós especialmente nos momentos mais difíceis da nossa vida.

Manuel Morujão, sj

Jesuíta timorense de alma e coração

É duro ver partir alguém que, desde há mais de meio século, sempre foi um irmão da família, a quem estive muito ligado. A causa da libertação de Timor mais nos uniu. Felizmente a fé diz-nos que o P. Zé não desapareceu com a morte corporal. Apenas mudou de residência e para imensamente melhor, para a Casa do Pai nosso. Agora transbordando vida em abundância, muito mais vivo do que quando estava na terra.

Que recordo dele, sobretudo das várias visitas que fiz a Timor, uma ainda sob o domínio do exército indonésio e várias outras já na Terra Prometida em liberdade?

Era um missionário de alma e coração, inteiramente dedicado à causa da boa nova de Cristo. Pregava e dava retiros e exercícios espirituais, mesmo de mês; acompanhava sacerdotes e comunidades religiosas; foi diretor diocesano do Apostolado da Oração; presença apostólica de relações próximas e amigas, desde o nível mais popular até aos grandes da política.

Sem ter pedido para ir para as “missões” de um país longínquo, soube inculturar-se, ser um com aqueles a quem foi enviado. Assim aprendeu tanto o Tétum como o Indonésio. Fui testemunha da grande consideração e estima que tinham por ele. Era um dos seus. Estou certo que se morresse em Timor tinha um rio de gente a louvor a Deus pelo tesouro da sua vida missionária. Isso mesmo acontecerá, apesar da ausência em Portugal.

Missionário de Cristo, sofreu com o povo a sua subjugação a um brutal poder invasor. Chegou mesmo a ser ferido, quando bombardearam o seminário de Dare. Acreditou que era um imperativo de consciência apoiar a causa de libertação de um povo maltratado. Tenho por certo que a sua atitude e do P. João Felgueiras, atitude firme e perseverante em nome do Evangelho, foi fundamental para que o povo de Timor pudesse vir a respirar o oxigénio da liberdade independente.

Que recordação conservarei sempre do José Alves Martins? Uma pessoa bondosa e amiga, um homem tão meditativo quanto bem-humorado, um profeta firme e decidido, um ser humano que respirava espiritualidade.
Inesquecível.

Francisca Assis Teixeira

Conhecemo-nos em 2000, numa Díli que ainda cheirava a fumo. Em Taibessi, onde a nova casa dos jesuítas estava a acabar de ser construída, aguardavam-nos o Irmão Ornelas e o P. José Martins, na altura superior da comunidade de jesuítas que, juntamente com o P. João Felgueiras, foram os três jesuítas portugueses que permaneciam em Timor-Leste desde que era colónia portuguesa. Viveram a guerra civil e a brutal invasão indonésia, o massacre de 12 de novembro em 1991, o referendo de 1999 e a barbárie que se lhe seguiu, não hesitando em permanecer fiéis junto ao povo que os acolhera, mesmo que, para isso, a sua vida corresse perigo.

O objetivo da nossa viagem era fechar a missão que as fragatas indonésias tinham impedido de concluir, colocando a coroa de flores no Cemitério de Santa Cruz. No entanto, rapidamente, a pedido dos padres jesuítas e dos jovens timorenses, percebemos que não podíamos encerrar por ali a missão. Com o Padre Martins, com quem trabalhámos intensamente durante os anos seguintes, comprámos um terreno, construímos o Centro Juvenil Padre António Vieira, criámos um programa de formação, cívica, cultural e espiritual que marcou aquele tempo e que permanece vivo, 20 anos passados. Em tudo isto esteve o Padre Martins, arguto, disponível e sábio conselheiro. Quantas horas de reuniões, de conversas, de histórias da resistência na primeira pessoa, da chegada dos indonésios e o bombardeamento do seminário de Dare, do transporte de um rádio que deveriam seguir para a resistência nas montanhas, ou das armadilhas e escutas dos indonésios e a forma como as contornavam, da importância do ensino da língua portuguesa como língua da resistência, da fuga, novamente para Dare, em 1999…

Nos últimos anos estivemos mais longe, mas a admiração por quem soube estar ao lado de quem precisa e de quem sofre, tendo tido a opção de não o fazer, é um testemunho que não esqueceremos nunca e que deixará muita saudade e admiração.

Até sempre, Padre José Martins. Descanse em Paz.

João Caniço

O nosso Padre José Martins partiu para o Pai, com o pensamento na sua amada Igreja de Timor… Ainda há poucos dias, desabafando comigo, me confessava acalentar ainda um sonho que lhe não saía da cabeça e em que contava com a minha colaboração.

Como meu colega de curso e amigo ao longo da vida, partilhávamos muitas das suas vivências missionárias em Timor (precisamente 50 anos, 24 dos quais em ambiente de guerra civil), em sofrimento heróico, pela tensão do ambiente, pela ausência de liberdade e pela impotência de meios humanos.

Foi professor e orientador de exercícios espirituais, durante muitos anos, orientando e aconselhando milhares de pessoas, entre casais, estudantes e seminaristas, sacerdotes, religiosas e religiosos. Para muitos (tantos!), foi um Pai, em momentos bem difíceis da vida.

Deus tenha Consigo a sua bela alma, agora a interceder por nós.

Comunidade jesuíta em Timor-Leste - ORIGADU BARAK

Caríssimos,

Acaba de nos deixar e partir para o repouso do Pai Criador o nosso irmão Pe. José Alves Martins, SJ. Faleceu em Lisboa sofrendo de vários problemas de saúde. Partiu de Timor, sua Pátria de coração, no ano passado, com destino à sua terra natal, para tratar da anca. Más depois seguiu o caminho para a Terra Prometida, a Pátria Celeste.

Após a operação à anca, quando já estava a recuperar, e se esperava o seu desejado regresso para Timor nos finais de Abril, teve uma queda e partiu o fémur. Foi também infetado com o vírus da COVID19 e, como se tudo isso não bastasse, entrou em crise e teve ao mesmo tempo falência cardíaca, pulmonar e renal. Faleceu ao fim da tarde do dia 14 de Março de 2022. Conhecido em Timor como “Padre Espiritual ou Amo Martins”, o P. José Alves Martins foi muito amado e respeitado. Juntamente com o P. João Felgueiras, contribuiram imensamente para Timor e para os Timorenses, através da educação dos jovens, formação do clero e religiosos/as, acompanhamento espiritual, e assistência ao povo na sua luta pela liberdade.

Durante 48 anos viveu intensamente as palavras do Senhor, que o Padre tinha escolhido como o lema do seu ministério sacerdotal: “Eu estou entre vós como aquele que serve” (Lc 22,27). Tanto bém fez pela Igreja e pela sociedade que deixou uma memória inesquecível, uma ‘marca’ Jesuíta no nosso país, na nossa época. Nos conflitos mais violentos de 1975, decidiu (juntamente com o P. João Felgueiras e o Irmão Daniel Coelho de Ornelas) dar ouvidos ao velho sábio: “neste tipo de situação, os Jesuítas são os últimos a partir”. E permaneceram. E ele experimentou a dor de Timor desde o mais íntimo. Sofreu muito no coração, com um duplo problema: o da doença cardíaca em si, que ia aumentando com a idade e com a carência dos serviços de saúde neste país; e o de aguentar e suportar as malícias da guerra, da violência, do desencontro, das insatisfações após a independência. Mas não abandonou nunca Timor!

A mim como irmão e como superior, confidenciou, mais do que uma vez, o desejo de regressar a Portugal. Regressar vivo, caminhando sob os próprios pés. No ano passado, no início do corrente Ano Inaciano para comemorar os 500 anos da conversão de St. Inácio de Loyola, lembrando o coxo Iñigo atingido pelo ‘canon ball’, coincidou com o aumento dos problemas da anca de que o Padre Martins sofria.

Assim como Inácio em Loyola, partiu para Portugal, caminhando coxo, como um soldado de volta da guerra. Não encontro uma palavra suficientemente adequada para expressar o quanto nós os Timorenses estamos profundamente orgulhosos e gratos. E muito mais nós, os Jesuitas, os seus irmãos na mesma Companhia. O Senhor Deus, na sua divina providência, quis enviar o seu servo José Alves Martins para o meio de nós nesta terra longinqua por dois anos (com um bonus de 46 anos!).

Somos muito agradecidos a Deus, por tudo que o nosso querido Padre José Martins fez em Timor através da sua presença, do afecto, da oração, da amizade, do testemuho de vida consagrada, e do ministério sacerdotal, da valentia, da riqueza espiritual. Em nome da Comunidade Jesuita em Timor Leste – e também dos Timorenses-, envio o nosso mais sincero agradecimento à familia do nosso Amo Martins, na pessoa da D. Rosa, única irmà vivente, e aos amigos e benfeitores de Portugal. Também dirijo a mesma gratidão à sua familia espiritual, a Província Portuguesa da Companhia de Jesus, na pessoa de P. Miguel Almeida SJ, Provincial. Não posso deixar de agradecer ainda aos amigos e colaboradores leste-timorenses ao longo destes 48 anos.

Em nome de toda a Comunidade Jesuíta em Timor, agradeço a todos os que amaram e cuidaram do P. Martins: amigos, ex-alunos, colaboradores, médicos, governantes, vizinhos, sacerdotes e religiosos, benfeitores de Singapura e muitos outros. Sem a mínima intenção de desestimar outros, gostaría de mencionar os nomes de Mana Rosalina e Mana Cassiana e toda a Comunidade Amigos de Jesus e do Centro Juvenil Padre Antonio Vierira, Me. Rosa Sarmento FdCC e sua familia, D. Terezinha e seus filhos, Hna. Estrella HCarm, e todos os mais pertos colaboradores ao longo de toda uma vida. O nosso missionário Amo Martins tinha deixado a familia inteira em Portugal, mas encontrou outra em Timor, numa vivência duradoura, intensa, frutuosa, não sem desentendimentos, passando por anos difíceis da violência e da ocupação.

Nada pôde derrubar esta vivência fundada sobre a fé e o amor. Em nome do nosso Amo Martins, gostaria de pedir perdão por todos os momentos de desencontro, desentendimento, de falta de caridade cristã nas atitudes, palavras, e ações. Agora acompanhamo-lo com a nossa oração a entrar no repouso divino, a vida eterna, onde não há mais morte, como canta o Salmista “Creio firmemente vir a contemplar a bondade de Deus na terra dos vivos” (Sl 27,13). Obrigado e Adeus Senhor Padre José Martins. Aqui em Timor recitamos para si as palavras do Salmista em Latim “Timor Domini sanctus permanens in aeternum” (Sl 18,10).

E também cantamos em ação de graças, no nosso Tetum, a oração de nosso fundador e mestre, St. Inácio de Loyola, “Tomai Senhor e Recebei”.

“foti bá, Na’i, no simu bá
ha’u nia liberdade tomak
ha’u nia hanoin
ha’u nia matenek
no ha’u nia hakarak tomak
buat hotu nebe ha’u iha no ha’u nian
Ita Boot haraik tiha ona buat sira ne’e mai ha’u
ba Ita Boot, Na’i, ha’u hasa’e fila fali
buat hotu Ita Boot nian,
uza buat hotu bá, tuir Ita Boot nia hakarak
haraik mai ha’u Ita Boot nia domin no rahun diak
ne’e to’o ona ba ha’u”

(St. Inácio de Loyola, ExEsp. [234])

Muito Obrigado.
P. Joaquim Sarmento SJ Superior dos Jesuitas
Timor Leste

[Em formato PDF]

Isabel Amaral Guterres, Embaixadora de Timor Leste

Mensagem de amor e gratidão ao Reverendo Padre José Alves Martins

Reverendo Padre Provincial, Sr. Padre Miguel Almeida e a todos os padres Jesuítas aqui presentes, Reverendas Irmãs, Sra. Embaixadora Dra. Marina Ribeiro, Sras. Diplomatas, Sr. Adido e assistente adido de defesa, os nossos Combatentes da Libertação Nacional, irmãos e irmãs timorenses, caríssima Família e amigos do Padre José Alves Martins, hoje é um dia doloroso e triste para todos nós que acompanhamos com amor e gratidão a despedida para a eternidade do nosso Padre José Martins. Mas é também um dia de uma eterna gratidão pela grandeza e pela humanidade do nosso querido missionário. Todos estamos suspensos e interrogamos no nosso coração o porquê da sua partida para Deus Pai.

Estou aqui como representante do governo de Timor Leste e de todos os timorenses que amam e amarão sempre este nosso querido missionário que deu a vida por todos nós. Nunca o esqueceremos. Nos momentos mais difíceis e perigosos do tempo da ocupação Indonesia, os dois padres portugueses, Padre João Felgueiras e Padre José Alves Martins, ficaram e arriscaram a vida várias vezes para ficar ao lado do povo timorense. São os nossos heróis, fiéis e amigos. Para o povo timorense o padre José Alves Martins é um pai, um conselheiro, uma vida cheia de generosidade, que acolhia a todos sem distinção. Sei que muitos pobres ate há pouco tempo procuravam-no para pedir pequenas ajudas e o padre José Martins do pouco que tinha ajudava a todos com amor, dizia com frequência: “Não posso ficar indiferente, são pobres”. Para Timor Leste o padre José Martins era um defensor, um lutador pela independência e respeito pela liberdade, sempre preocupado com a estabilidade e a paz entre todos. Um sacerdote que transmitia Deus, amor, com um sorriso de ternura que nunca vamos esquecer.

A minha vida fica marcada profundamente pelo Padre José Martins que me salvou, ajudando com segurança a que fosse possível eu sair de Timor no tempo do Invasão, para que não fosse morta pelos militares Indonésios. Foi uma experiência difícil até chegar à Austrália, passando por Jakarta, Singapura, Malásia e Tailândia e depois finalmente em Melbourne-Austrália, tudo graças à intervenção do nosso Padre José Martins. Estou eternamente grata por ele salvar a minha vida, arriscando também a sua própria vida.

Como muitos sabem, o padre José Alves Martins juntamente com o padre João Felgueiras e o falecido Irmão Ornelas tiveram de fugir várias vezes para a montanha de Dare, acima de Dili, onde ficavam escondidos dos Indonésios porque eram procurados por defenderam a independência de Timor Leste. Eram tempos difíceis e incertos, mas em nenhum momento o padre José Martins e os seus companheiros abandonaram a nossa terra de Lorosae deixando o povo a sofrer, permaneceram firmes, corajosos, marcados pelo dom da fé e do amor a Cristo a e a Timor Leste.

Do seu último livro: “Verbo Amar: Amei, amo, amarei” que o padre José Martins tinha desejo de apresentar em julho de 2022 em Timor Leste por ocasião do seu aniversário natalício e cito: “Senti várias vezes momentos de dor física, mas sobretudo de dor moral e psíquica. Estava à beira dum abismo, fundo e escarpado, e não tinha nada a que me agarrar se para lá caísse. Surgiram sempre mãos misteriosas que me seguravam, me deram esperança, embora não estivesse consciente vivendo como num limbo boiando. E, depois de uma luta desigual, surgiu uma nova vida.” E nosso Padre José Martins vive agora a Nova e Eterna Vida em Deus. Peço-lhe que interceda por nós, por Timor, pela sua família que chora e sofre e por todos os seus amigos e toda a companhia de Jesus, em especial na nossa terra que agora lhe prestam homenagem em profunda Gratidão e unidade. Portugal e Timor juntos a enaltecer a grandiosa vida do nosso grande amigo Padre José Alves Martins.

E termino citando o mesmo livro do Padre Jose Alves Martins: “o amor é o começo de tudo o que não tem fim. Apenas há etapas que se vivem e quando sentimos que chegamos ao fim, desejamos continuar a viagem”.

Boa viagem Querido Padre José Martins, Deus o receba no seu reino de amor eterno e cuide de nós! Obrigada pelo seu amor e total doação a Timor, à Igreja, a Deus.

Isabel Amaral Guterres
Embaixadora de Timor Leste
Portugal

Presidência da República Portuguesa

Presidente da República lamenta a morte do Padre José Alves Martins
14 de março de 2022

O Presidente da República lamenta a morte do Padre José Alves Martins, figura marcante da Companhia de Jesus que dedicou quase meio-século da sua vida a servir a população de Timor-Leste.

O Presidente da República apresenta sentidas condolências aos familiares e amigos do Padre José Alves Martins, Comendador da Ordem do Mérito.

Xanana Gusmão, Líder resistência Timorense