2013: Desde que, naquela Páscoa, celebramos em família a Ressurreição de Cristo e recebemos a sua primeira Benção Urbi et Orbi na Praça de São Pedro, não podia imaginar que, 12 anos depois, esse seria o último gesto do seu pontificado antes de passar para a casa do Pai. Não poderia imaginar que, daí a 12 anos, eu viveria em Roma, como jesuíta em formação, e que celebraria novamente com a minha família e consigo a Páscoa na Praça de São Pedro. A verdade é que foi o culminar sereno e ressuscitador de um Pontificado que marcou as nossas vidas e marcará certamente o nosso tempo.
2016: Como não recordar com afeto a JMJ 2016 na Polónia? Foi lá que nos desafiou a sair do sofá, a calçar os sapatos e a caminhar com confiança em busca da vontade de Deus. Foi lá que nos perguntou, desinstalando-nos, se “visitávamos os nossos avós”. Era eu peregrino com as EJNS e foi nesse verão que comecei a pensar em ser jesuíta.
2017: Como não lembrar com comoção aquele silêncio orante – que pareceu uma eternidade – na Capelinha das Aparições em Fátima, na véspera da canonização de Francisco e Jacinta Marto? Era finalista do Colégio São João de Brito e estremeci com as centenas de milhares de portugueses que o ouviram gritar: “Temos Mãe”.
2019: Como não recordar com emoção a experiência do meu irmão Joaquim a caminhar lado a lado consigo na JMJ Panamá, representando a Europa e preparando o anúncio de que Portugal seria o palco da próxima Jornada? Foi nesse mesmo ano que parti para Buenos Aires para estudar por 6 meses e mergulhar naquele admirável “mundo novo”, o que também me fez conhecer o seu passado como jesuíta e arcebispo.
2020: Como não me arrepiar ao lembrar-me da oração na Praça de São Pedro, em plena pandemia? Desde aquela solidão corajosa, afirmou que “ninguém se salva sozinho” e que aquele era o tempo de “decidir o que conta e o que passa”. E foi mesmo. Poucas semanas depois, e do meio daquela calamidade, brotou em mim a graça da vocação – como chamamento íntimo e único de Cristo – que 4 meses depois me fez entrar na Companhia de Jesus.
2023: Já como jesuíta, tive o privilégio de o encontrar na capela do Colégio São João de Brito, onde estudei, juntamente com os companheiros portugueses. Como um avô conversa com os seus netos, lembrou-nos a importância da intimidade com Deus na oração e de cuidarmos dos frutos das JMJ. Recordo a reação comovida ao ser recebido por nós, enquanto entoávamos o cântico “O Bom Pastor”. Nesses dias de JMJ, naquilo que foi um regresso inesquecível à minha querida cidade de Lisboa, como foi belo acompanhar um campo de CAMTIL, sentindo-me um “aprendiz de pastor” por ter no Papa o grande capelão do campo e da “sua juventude”. Ficou a ecoar no meu coração aquele ternamente repetido “não tenham medo”, na missa final, como refrão que para sempre acompanhará a minha caminhada.
2024: Enviado a Roma para concluir os estudos de Filosofia, tive o privilégio de o receber como aluno na visita que fez à Pontifícia Universidade Gregoriana. Como foi significativo ouvi-lo desejar que a Universidade seja uma “escola do coração”, onde as inquietações da rua e da vida real das pessoas possam ser tidas em conta. Já no final do ano, em plena véspera de Natal, foi com emoção que acompanhei a abertura da Porta Santa em São Pedro, para o Jubileu da Esperança. Débil no corpo, mas convicto no espírito, escancarou-nos as graças que este ano jubileu tinha reservado para todos nós.
2025: Finalmente, reencontramo-nos para a despedida, 12 anos depois, no mesmo sítio e à mesma hora. No dia em que celebrávamos a Ressurreição de Cristo, o “tudo que abre a nossa vida à esperança”, o silêncio expectante que se fez na praça antes da sua entrada na varanda da Basílica foi para mim um pré-anúncio de uma vida nova. É preciso silêncio, tempo e desejo para contemplar o mistério. É preciso tempo para contemplar com gratidão a sua vida. Foi preciso silêncio para nos despedirmos. Desde aí, querido Papa Francisco, onde a Vida supera a contingência do tempo, continue a alimentar em nós o desejo de edificar esta Igreja-Hospital-de-campanha, como avô apaixonado pelos netos, como pastor ferido a cheirar a ovelha, como pecador, perdoado, enviado e conquistado pelo “prémio a que Deus lá do alto nos chama em Cristo Jesus”.