Um olhar histórico descritivo sobre o percurso da Companhia de Jesus em Moçambique

Moçambique pertence agora à Província da Companhia de Jesus da África Austral, onde está o P. António Virgílio de Oliveira e Costa que é atualmente o Sócio do Provincial.

Francisco Xavier e dois companheiros, o sacerdote Paulo de Camerino (italiano) e o estudante Francisco Mansilha (português) chegaram à Ilha de Moçambique, a caminho da Índia, em Agosto de 1541. Dedicaram-se à pregação, à administração dos sacramentos e tratavam dos doentes no hospital. Francisco Xavier ficou até 7 de Fevereiro de 1542 e os companheiros até Agosto.

1º Período

Em 1560, os Padres Gonçalo da Silveira e André Fernandes e o Ir. André da Costa, da Província jesuíta de Goa, começaram a primeira missão no interior de Moçambique: reino de Tongue (Inhambane) onde baptizaram, com apenas 07 semanas de preparação o Rei, a Rainha e cerca de 400 súbditos e reino do Monomotapa onde o P. Gonçalo baptizou, após 25 dias de preparação, o Rei, sua mãe e cerca de 300 súbditos. Foi martirizado de 15 para 16 de Março de 1561. Em 1562 os Padres Luís de Góis e Pedro de Tovar, estavam, em Moçambique, preparados para seguir para o Monomotapa, mas foram desaconselhados. Em 1569 o P. Francisco de Monclaro acompanhou Francisco Barreto, como mentor espiritual, da expedição contra o Monomotapa. Acompanhavam-no o Padre Estêvão Lopes, o Escolástico Gonçalo Dinis e o Irmão Domingos Gonçalves. A expedição não resultou e, em 1574, o P. Valignano, de passagem por Moçambique, com um grupo de 42 companheiros, não acreditando na possibilidade de fundar a missão, levou os Padres Monclaro e Lopes para a Índia (os outros tinham falecido).

2º Período

Estende-se de 1610 até 1759. A missão dependia da Província de Goa. Durante estes cerca de 150 anos estiveram para cima de 230 jesuítas em Moçambique. Alguns estiveram pouco tempo e outros por mais de um período. Começaram por fundar três residências: em Quelimane, em Sena e em Tete. O P. Gaspar Soares, primeiro superior da missão, dizia ao P. Geral Cláudio Aquaviva, em 1611, que era necessário fundar três Colégios que seriam três Centros de irradiação apostólica. O Colégio de Jesus, em Sena, em 1614, já tinha 70 alunos. O mais conhecido, cujo edifício ainda se pode apreciar, na ilha de Moçambique, o Colégio de S. Francisco Xavier, funcionava regularmente e enviava alunos para o Colégio de S. Paulo, em Goa, já com cursos de ensino superior. Ligado à residência do Espírito Santo, em Tete, existia uma escola.

Os Jesuítas evangelizaram os povos ao longo do vale do Zambeze, enfrentando muitas dificuldades. Era considerada uma missão difícil, mas nunca faltaram missionários. Para além de Tete, Sena e Quelimane, mantiveram postos missionários em Marângue, Caia e Luabo. Junto à ilha de Moçambique e ligada ao Colégio de S. Francisco Xavier, administravam a paróquia da Cabaceira Grande, em terra firme.

Na altura da expulsão, em 1759, havia nove jesuítas a trabalhar em Moçambique: na ilha de Moçambique, Colégio S. Francisco Xavier, estava o P. Jerónimo de Lemos, reitor, e na paróquia da Cabaceira, o P. Francisco Storione; em Sena, os Padres José António, visitador, José de Anchieta e José Mauttner, encarregados das igrejas; em Marângue os Padres Maurício Thoman e João Baptista Douranceaux,; em Tete o P. José dos Santos e em  Quelimane o P. José Pinto, párocos.

3º Período

Os Jesuítas regressaram a Moçambique em 1881, integrados na Missão da Zambézia. A criação desta Missão insere-se no âmbito do ressurgimento missionário que caracterizou o século XIX. Inicialmente estava excluído da Missão da Zambézia. Paiva de Andrade, adido militar na embaixada de Portugal em Paris, conhecedor do propósito colonizador das potências europeias e a vontade que tinham de se servirem das Congregações religiosas, foi falar com o P. Geral, pedindo que estendesse a Missão da Zambézia a Moçambique. Conversou com os Padres Beckx (Geral) e Weld (Assistente e organizados da Missão) e deixou uma boa impressão.

No dia 8 de Março de 1881, Paiva de Andrade, partiu de Nápoles, com o francês, P. João Baptista Dejoux (ex-missionário na Kabylia, Argélia), rumo a Quelimane. O P. Provincial de Portugal, enviou, para Tete, o P. Francisco Antunes e o Ir. António Ferreira. O P. Dejoux chegou a Quelimane em 13 de Abril e no dia 26 chegaram os Padres Manuel Gabriel (polaco), Fernando Heep (originário de Nassau) e o Ir. José Dowling (irlandês). Instalaram-se em Mopeia.

O sonho do P. Weld era fundar uma grande missão no Zumbo. O P. Manuel Gabriel enviado para lá, em 1885, faleceu no caminho. Em 1885 o P. Dejoux tomou conta da paróquia de Sena e o P. João N. Hiller começou a missão de Boroma.

Em 1890 a Missão da Zambézia foi dividida em Zambézia Superior, entregue à Província Britânica e Zambézia Inferior, entregue à Província Portuguesa.

A partir de 1890 fundaram missões em Coalane (1890); em Milange (1890, transladada para Tumbini em 1891 e destruída pelos Ajauas em 1894); em Inhambane (fundada em 1891 em Nhamussua (Bembe), trasladada para o Móngue em 1893); no Zumbo (Ricico, 1892, trasladada, em 1897, para o Miruro); na Chupanga (1895); e em Lifidzi, no planalto da Angónia (1908). Em Quelimane fundaram o Colégio do Bom Jesus (1882).

Os missionários contribuíram para o avanço das ciências com registos e estudos meteorológicos e a recolha e classificação de plantas e insectos pelos Padres Ladislau Menyhárth, húngaro, que se correspondia com cientistas austríacos e o P. Luís Lopes, português, que coleccionava cecídias e lepidópteros, estudados pelo P. Cândido Mendes, em Portugal. Publicaram gramáticas, dicionários, livros de orações e histórias locais nas diferentes línguas (Sena, Nyungwe, Nyanja e Chuabo). O P. Júlio Torrend compôs uma gramática pondo em comparação 24 línguas banto.

A primeira República Portuguesa expulsou os Jesuítas de Portugal e domínios ultramarinos. Em 1910 havia na Missão 40 Jesuítas sendo 17 portugueses. No total estiveram 117 e faleceram 44.

4º Período

Os Jesuítas voltaram em 1941, continuando a chamar-se Missão da Zambézia. Instalaram-se em Lifidzi, a seguir em Boroma (1943) e começaram a Escola de Formação de Professores (1945). Fundaram missões no planalto da Angónia, tomaram paróquias em Tete, Beira e Quelimane e abriram um Lar universitário em Lourenço Marques.

Em 1965 tomaram a paróquia de Nª Sª das Graças, em Vila Coutinho, fundaram a missão de S. Inácio de Msaladzi e abriram, na missão da Fonte Boa, o Colégio Azevedo Coutinho. Em 1966 receberam a missão de Nª Sª da Conceição do Zóbue e em 1967 a orientação escolar e educativa do Seminário do Zóbue.

Vice-Província de Moçambique

Por decreto de 03 de Dezembro de 1966, do P. Geral, Pedro Arrupe, a Missão da Zambézia, passou a designar-se Vice-Província de Moçambique, dependente da Província Portuguesa. Trabalhavam nessa altura na missão: 26 sacerdotes, 07 escolásticos e 17 irmãos, mas estavam fora em estudos: 04 sacerdotes, 07 escolásticos e 02 irmãos. Pertenciam à missão 69 Jesuítas.

Em 1972 receberam a missão de S. Benedito da Manga (Beira) e em 1973 fundaram a missão de S. Pedro Claver do Dómue. Adquiriram, em Matacuane, um edifício que recebeu o nome de “Casa do Estudante”. Foi Lar para candidatos à Companhia e Cúria Vice-Provincial. Em Outubro de 1974 abriu, na missão de S. Benedito da Manga, o Noviciado com 03 Noviços.

Em 1975 o povo moçambicano celebrou com júbilo a independência do país. Devido às nacionalizações os missionários tiveram que deixar as missões. Em 31 de julho de 1977 as Irmãs e os Padres deixaram a Fonte Boa e foram viver para Satémwa. Os Padres Domingos Isaac (Moçambicano) e Manuel Gama deixaram a missão de Lifidzi em 08 de julho de 1978 e foram para o Chabwalo. No dia 19 de Novembro de 1978, o P. Domingos Isaac foi preso. Passou pelas prisões de Tete e de Lichinga e esteve em dois campos de reeducação. Em 14 de Setembro de 1980 conseguiu fugir para o Malawi e integrou-se na Província da Zâmbia-Malawi. A igreja de Lifidzi foi encerrada em 18 de Fevereiro de 1979.

O Seminário do Zóbue foi transformado num Centro de Formação de Professores. Os Irmãos José Coelho e José Lima prestavam uma belíssima colaboração no Centro e viviam na residência paroquial do Zóbue.

Os Padres Ezequiel e Cirilo trabalharam na Conferência Episcopal de Moçambique, como directores do Secretariado, entre 1975 e 1983. Em 1979 o P. João Valente Cabral recebeu a paróquia de Nª Sª do Amparo na Matola, Maputo e abriu a residência de S. Inácio, reforçada com mais dois companheiros em 1982 e 1983 que colaboravam na formação do clero. Em 1985 comprou-se uma casa no Maputo que veio a ser a Cúria Regional.

Em Setembro de 1983, foi reconstituída a comunidade de Lifidzi, na residência de Chapotera, com os P. João de Deus Kamteza e Sílvio Moreira. O campo de trabalho compreendia 64 aldeias: 40 da zona de Lifidzi e 24 da zona de Chabwalo. Os Padres João de Deus e Sílvio foram brutalmente assassinados em 30 de Outubro de 1985. O Papa João Paulo II inscreveu-os no role dos mártires do século XX.

A RENAMO (Resistência Nacional Moçambicana) raptou, no planalto da Angónia, Padres e Irmãs ficando a Angónia sem assistência religiosa. Em Maio de 1991 o P. Domingos da Silva foi para Vila Ulóngwe. O P. Luís Gonçalves juntou-se-lhe depois da assinatura do Acordo de Paz (04 de Outubro de 1992).

O Noviciado reabriu, na residência de Matacuane, em 08 de Setembro de 1984, com um Noviço Escolástico.  Em 1989 interrompeu-se mais uma vez o Noviciado que voltou a abrir, na Manga, em 1990.

O P. Cirilo, Vice-Provincial, preparou, em 1989, com o Sr. Bispo de Dedza (Malawi) um protocolo para acompanhar os refugiados Moçambicanos, a partir da paróquia de Santa Ana, em Ganya, cedida aos Jesuítas de Moçambique.

Região Moçambicana da Companhia de Jesus

A Vice-Província de Moçambique, em 1993, por decisão do P. Geral, Peter-Hans Kolvenbach, passou a designar-se Região Moçambicana da Companhia de Jesus, continuando dependente da Província Portuguesa. Havia em Moçambique, em 1993, 32 jesuítas: 19 Padres, 06 Escolásticos e 07 Irmãos. Moçambicanos eram 12: 03 Padres; 05 Escolásticos (03 noviços e 02 Juniores, a estudar no Brasil) e 04 Irmãos (02 Irmãos formados, um Junior, a estudar no Brasil, e um Noviço).

A reabilitação da missão de Lifidzi começou nos fins de 1993. O culto na igreja  foi retomado na Páscoa de 1993. Em 1994, as Irmãs de S. José de Cluny foram viver para a missão, assim como os Leigos para o Desenvolvimento. Os Jesuítas foram em 18 de Outubro de 1995.

O P. Giovanni Salomão, Regional de 2002 a 2008, fundou o Juniorado que começou na paróquia de S. João Baptista do Fomento (Maputo) tendo como Reitor o P. Vicente Zorzo. Em 2003 passou para o Maputo.

Em 24 de Maio de 2008 foi nomeado Superior Regional o P. Virgílio Arimateia Domingos que deu grande impulso ao Centro de Espiritualidade de Satémwa e iniciou a construção da Escola de Msaladzi (ESIL, Escola Secundária Inácio de Loiola). A 04 de Janeiro de 2009, a Região celebrou, jubilosamente, o centenário da missão de Lifidzi.

Província Zimbábwe-Moçambique (ZIM)

Em 07 de Dezembro de 2014 o P. Geral, Adolfo Nicolás, suprimiu a Região Moçambicana da Companhia de Jesus e uniu Moçambique à Província do Zimbábue, para constituir a Província Zimbábue-Moçambique (ZIM). O Catálogo de 2014 apresenta 46 Jesuítas, a residir em Moçambique: 19 Padres, 19 Escolásticos e 08 Irmãos e 21 a residir fora, a estudar. Eram ao todo 67. Os Moçambicanos eram: 10 Padres, 36 Escolásticos e 04 Irmãos.

Província da Companhia de Jesus da África Austral ou Southern Africa Province (SAP)

O P. Geral, Arturo Sosa, por decreto de 08 de Junho de 2020 anunciava a criação da nova Província da África, constituída por nove países: África do Sul, Namíbia, Lesoto, Botsuana, Suazilândia, Zâmbia, Malawi, Moçambique e Zimbábue. Foi nomeado Provincial o P. Peter Leonard Chiti, Zambiano. Tomou posse no dia 25 de Março de 2021. O P. António Virgílio de Oliveira e Costa, português, foi nomeado Sócio do Provincial. Os Jesuítas residentes em Moçambique, em diversos trabalhos apostólicos, são 26 (15 Padres, 08 Escolásticos e 03 Irmãos), assim distribuídos: na Angónia 13 (Escola Secundária Inácio de Loiola, Centro de Espiritualidade de Satémwa e missões de Lifidzi e Fonte Boa; na Beira 04 (paróquia de Matacuane, Centro P. Cirilo, residência da Manga e Centro de Espiritualidade P. João de Deus Kamtedza) e no Maputo 09 (residência de S. Inácio e paróquia de S. João Baptista no Fomento). O P. David Ferreira da Silva é o único Jesuíta Português a residir em Moçambique. O P. Manuel Ferreira encontra-se em Portugal a tratar da saúde e o P. Virgílio Costa reside em Lusaka.

Segundo o Catálogo da SAP residem na Província 296 jesuítas e fora, 55, que eleva o total para 351.

Artigo da autoria do P. Francisco Correia, sj