Músicas de Santas e Santos: pequenos teatros sonoros

Músicas de Santas e Santos: pequenos teatros sonoros

É costume dizer-se que “uma imagem vale mais que mil palavras”. Acho que podemos dizer o mesmo do som. O som é uma espécie de ninja que se infiltra nos nossos ouvidos, mesmo quando não estamos à espera. E, por vezes, depois de entrar, chega até a conquistar o nosso corpo e põe-nos a fazer movimentos involuntários: mexemos a cabeça, depois os ombros e, quando demos por ela, já estamos feitos concorrentes do “So You Think You Can Dance” a dançar no meio da sala [1].

Sempre gostei muito de música. Quando acampava com os meus amigos, nos escuteiros (sim: eu cresci antes de os GBZ existirem…), havia sempre alguém com uma guitarra para nos entretermos depois do jantar. A experiência diz-me que, às vezes, nada melhor do que uma música para nos fazer rir, para nos tirar a timidez, ou até para nos pôr a pensar na vida.

Em 2018, o guião dos campos sugeria, entre outras coisas, que se usasse o testemunho de santos. Ora, quando começámos a falar disso, entre animadores, fez-se um clique cá por dentro, e pensei: se calhar, com umas músicas, isto seria mais fácil. Falo por mim: tenho muito respeito pelos santos, mas nem sempre atino com a maneira como nos contam as suas histórias. É que os livros mostram uns santos “tão perfeitinhos” que se torna difícil para mim (que sou um imperfeito com provas dadas) sintonizar com eles. Talvez fosse possível contar essas histórias de outra maneira: com algum humor, com menos “incenso”, e com um groove que trouxesse aquelas vidas para dentro das nossas.

A estratégia da equipa era simples: todos os dias, durante o campo, tínhamos os 15 minutos dos santos, logo a seguir à sorna (antes do jogo da tarde). Uns animadores faziam de banda musical enquanto outros faziam uma mímica (normalmente a resvalar para o cómico, há que confessar, como era suposto!). Depois, um animador dava um testemunho sobre o santo do dia e, no final, toda a gente cantava. Na missa, ao final da tarde, acrescentávamos o “ícone-caricatura” do santo, na capela: era a nossa maneira de tentar imaginar o céu na terra.

A maioria das músicas apareceram-me antes do campo; outras, como a de Santa Rafaela, da Madre Teresa ou de São João Paulo II, foram feitas já em campo, com a colaboração da Maria Portela e do Diogo Couceiro (o outro “mano” jesuíta que fazia parte da equipa).

Antes de pensar nas músicas, tentei imaginar cada um dos santos: a Madre Teresa a percorrer as ruas de Calcutá; Francisco de Assis com um estilo meio “hippie”, a admirar as plantas e os animais; a força e o drama de Bakhita, a escrava que encontrou a liberdade; Inácio de Loiola num ambiente ainda meio medieval; os sons da Polónia onde Karol Wojtyla (Papa João Paulo II) cresceu. Ainda sem palavras, queria que as próprias músicas, pelo seu estilo e ambiente, ajudassem a “ouvir” o mundo (interior e exterior) onde cada um dos santos viveu. De algum modo, queria que fossem pequenos teatros sonoros.

No que toca às melodias, propriamente ditas, nasceram nas circunstâncias mais variadas, nos dias que antecederam o campo: a Bakhita surgiu quando estava a entrar em casa; a música sobre Francisco de Assis ocorreu-me à saída do metro de Telheiras; Inácio “veio ter comigo” na biblioteca da Brotéria; mal desliguei o despertador, de manhã, pensei na música para Maria Madalena. Para estas músicas, o método foi simples: pegar no gravador do telemóvel e trautear a melodia. Depois foi só escrever os textos.

O último capítulo da história destas músicas foi mesmo o das gravações onde, com a ajuda de vários amigos, pudemos completar as diferentes faixas. Basicamente, foi uma desculpa que encontrámos para prolongarmos o campo mais uns tempos! [2]

É sempre um enigma, o que cada um de nós sente e pensa ao ouvir uma música. Neste caso, se as músicas conseguissem despertar uma gargalhada, pelo menos, já seria incrível. O riso é uma ferramenta capaz de muitos mistérios.

 

[1] “So You Think You Can Dance” é um programa de televisão norte-americano onde os concorrentes tentam mostrar que sabem dançar.

[2] Um abraço muito especial ao Miguel Fontes, ao Pedro Castro, ao José Blanco, ao Manuel Oliveira e ao Tomás Magalhães por nos terem “emprestado” o seu enorme talento. Para já não falar da trupe de GBZ que se juntaram para as gravações, na biblioteca da comunidade jesuíta da Brotéria.

Rui M Fernandes sj

Saiu o novo CD, É Tudo Isto Ser Gambozino!

Saiu o novo CD, É Tudo Isto Ser Gambozino!

O novo CD dos Gambozinos está finalmente nas bancas! Para quem acompanhou relativamente de perto as várias etapas de produção, é muito gratificante! Tudo começou em 2018: à data tínhamos músicas desde há 8 anos de campos de verão à espera de serem eternizadas. Nesse mesmo ano, para além das músicas normais de campo, surgiram também 8 músicas originais de Santas e Santos, algo que nunca antes tinha acontecido. Surgiu então a ideia de aproveitar este novo reportório e fazer um CD- dois em um!

Depois de escolhidas as 15 músicas que iam entrar no CD, improvisámos um estúdio de gravação, com a preciosa ajuda do Cubo Music Studio. Apesar do esforço logístico que envolve cruzar horários e disponibilidades, as gravações foram essencialmente momentos de encontro entre várias gerações de animadores para criar algo capaz de mostrar, nem que seja um bocadinho, aquilo que é ser Gambozino.

Agora que podemos ouvir e tocar no produto final, é incrível como este CD representa tantas coisas diferentes para tantas pessoas. Para alguns transporta-os para um campo, para outros recorda uma memória, um sentimento ou uma pessoa. No final o que esperemos que transmita a todos os que o ouçam é a alegria de ser Gambozino.

O nome: (não poderia ser de outra forma) É Tudo Isto Ser Gambozino.

Madalena Ravara

Fala-nos do Gancho

Fala-nos do Gancho

No início deste ano de atividades, tudo começou de forma atípica, uma vez que nos habituámos a viver por detrás dos ecrãs.

Em novembro, pude estar presencialmente com os animados do meu concelho e foi sem dúvida uma enorme motivação para continuar esta missão com ainda mais alegria e com um sentimento renovado do verdadeiro sentido de família gambozínica.

Em dezembro, voltávamos à nova realidade, tudo se encontrava novamente fechado. Contudo, não podíamos desistir tão facilmente, não podíamos baixar os braços. Agora mais sábios, sabíamos como dar a volta ao “problema” que é o confinamento, porque este é o tempo favorável! Claro que sempre acompanhados de diversas dificuldades, tais como encontrarmos uma hora e dia em que todos os animadores se pudessem reunir e contribuir de alguma forma para que a atividade fosse inesquecível e a melhor de sempre. Propusemos então uma atividade para durar cerca de hora e meia, mas o sucesso foi tal que durou mais de três horas, tudo graças ao entusiasmo dos miúdos.

Querendo superar as expectativas do mês anterior, sugerimos juntar os dois grupos a nível nacional (Gancho e GAP). Desta vez, não fizemos nem uma, nem duas atividades, mas sim três atividades com dois grandes objetivos que se estenderam por dois meses. O primeiro objetivo era passar tempo de qualidade com a família, em que propusemos verem um filme, escolhido por nós, durante a semana. O segundo era fortalecer laços a nível nacional, conhecerem e/ou reverem gambozinos dos outros núcleos, já que só se veem nos campos, durante o verão. Os objetivos foram cumpridos e de atividade para atividade, notou-se um crescendo de alegria, uma dedicação e entusiasmo inimagináveis de ambas as partes. Num lado, os animados, que semana após semana nos mandavam mensagem a perguntar quando é que iriam receber novamente um filme para poderem vê-lo em família e nos perguntavam, também, quando é que seria o jogo relacionado com o filme. Muitos deles ocupavam as tão famosas salas de espera do Zoom 15/20 minutos antes da hora da atividade. No outro lado, nós, os animadores, desolados por não os podermos ver, nem conversar com eles presencialmente, mas acima disso tudo, alegres e motivados para percorrer este caminho com eles e mostrar-lhes que Deus existe nestas pequenas coisas, nos filmes em família, nas salas de espera do Zoom, nas atividades de três horas, etc etc etc.

Neste mês que passou, quisemos dar-lhes algo palpável, algo onde eles se pudessem lembrar dos Gambozinos e d’Aquele que morreu por nós na Cruz, para nos salvar. Fizemos então chegar a casa de cada um dos animados do Gancho um calendário da Semana Santa, onde cada dia tinha a sua proposta para os ajudar a ver Deus em todas as coisas, até nas mais pequenas, desde pequenas orações, a aprender a fazer receitas em família.

Neste mês que começa agora, abril, não é como costumam dizer “abril águas mil”, de chorar por coisas insignificantes estamos todos nós fartos, queremos agora limpar os olhos dessas lágrimas que nos impedem de ver quem realmente é Deus, de O ver em todas as coisas! E é seguindo estas linhas de fundo que eu, o Gancho, o Núcleo Norte e os Gambozinos nos vamos encontrar com Ele diariamente!

Zé Maria Matos

Meio ano de GEMA

Meio ano de GEMA

Começou em dezembro. Reunimo-nos uma vez por mês, durante umas duas horas que passam a correr, e somos convidados a participar em inúmeras atividades. Muitas vezes antes de entrar confesso que me dá alguma preguiça, mas no final até me sinto parva por ter pensado em faltar porque saio com outra motivação, mais uma perspetiva diferente, com uma força de vontade ainda maior e também muito mais animada! Apesar de ainda não termos tido a oportunidade de viver uma reunião de GEMA presencial, e com muita pena minha, aquelas que já passaram foram gratificantes. A transbordar de simplicidade, de curiosidade porque nunca sabemos o que aí vem, de vontade de viver a fé juntos, decifrar um bocadinho daquilo que é ser animador e de partilhar tudo e mais alguma coisa. Tem sido ótimo para fugir da monotonia que invadiu a minha rotina nos últimos meses e rever pessoas com quem já não estou há muito tempo, seja porque vivem longe (sim, porque este ano o GEMA é NACIONAL!) ou porque simplesmente não foi oportuno devido à pandemia.

Embora nunca tenha tido a certeza de que queria animar, prometi a mim mesma que não iria dizer que não sem antes experimentar e, fazendo o GEMA parte desse percurso claramente não podia deixar passar. Também não queria de todo deixar os Gambozinos, portanto tinha mesmo de me inscrever no GEMA. Foi uma ótima decisão! Como já falámos numa das reuniões, tem sido super positivo uma vez que me tem ajudado a desconstruir a ideia fixa que eu tinha sobre o que é ser animador através dos testemunhos e até jogos/BTS/conversas que me fizeram sair da minha zona de conforto. Uma das coisas que os gambozinos sempre me influenciaram foi voltar a focar no essencial, e o GEMA não tem sido exceção! Estou extremamente ansiosa para que seja possível deixar de ver as pessoas em quadradinhos, e aproveitar o bom que é estarmos todos juntos!

Kika Bustorff

Fazer das tripas coração

Fazer das tripas coração

Reza a lenda que, no início dos Descobrimentos, os portuenses decidiram encher os barcos rumo a Ceuta com toda a carne da cidade, deixando apenas na cidade as tripas dos porcos. A partir destas, os habitantes do Porto reinventaram a sua alimentação e transformaram um prato execrável numa das iguarias da cidade – as “tripas à moda do Porto”

Nos dias de hoje, a penitência foi-nos imposta, muito antes de haver Quaresma. O confinamento, o isolamento social, a impossibilidade de ir aos bairros, os gambozinos que apenas vemos através de um ecrã, apenas demonstram que as tripas já as temos, sem que tenhamos decidido por elas. (cf. texto do P. José Frazão no Ponto SJ)

Por isso mesmo, abre-se aqui uma janela de oportunidade para “fazer das tripas coração”, ou seja, para transformar a renúncia num movimento de doação e fazer um verdadeiro sacrifício. Ora, à letra, sacrifício significa “um feito sagrado”, por isso fazer um sacrifício significará algo como “tornar sagrado aquilo que se faz”. Se a quarentena nos impõe o que fazer, cabe-nos a nós torná-lo sagrado!!

Para isso, apercebi-me estar a meio de um caminho de Quaresma, que me pode levar à conversão da renúncia em doação através de 3 movimentos e ajudado por 3 padroeiros. Convido-vos a juntarem-se a mim!

1.º ACOLHER – S. José

A renúncia está já presente, não há como escapar, nem há necessidade de criar muitas outras. Tal como aconteceu a S. José, as nossas vidas e planos foram trocados e desiludidos. Por isso, há que agarrar a vida e acolher a realidade, confiado que “a vontade de Deus, a sua história e o seu projecto passaram também através da angústia de José. Assim ele ensina-nos que ter fé em Deus inclui também acreditar que Ele pode intervir inclusive através dos nossos medos, das nossas fragilidades, da nossa fraqueza.” (Patris corde, Papa Francisco)

2.º AGRADECER – S. Inácio de Loyola

O Peregrino, que sonhava viajar e ficar por Jerusalém, acabou os seus dias limitado a Roma, onde, devido ao seu cargo de Geral, passava a maior parte do tempo sentado à secretária a escrever cartas para toda a Companhia de Jesus. Ainda assim, de duas em duas horas rezava o Exame, começando sempre dando graças, confiado de que esta sua missão era para a maior glória de Deus. Agradecer o que custa, custa, mas é porta de entrada para a Graça de Deus.

3.º DAR – B. Francisco Gárate

“A partir da portaria de um instituto de ensino, este jesuíta (…) tornou presente a bondade de Deus pela força evangélica do seu silencioso e humilde serviço” (Papa João Paulo II). Na verdade, o extraordinário da vida do Irmão Gárate foi a sua capacidade de fazer da doação de si mesmo, o sacrifício contínuo de uma “vida ordinária”. Não é preciso complicar! Há que me pôr ao serviço daqueles que me estão próximos, em casa, ou pegar no telefone e fazer-me próximo!

 

Acolher, agradecer e dar. Restringido ao ordinário de casa, estes são 3 movimentos que podem ajudar a “fazer das tripas coração”, com o custo que isso inevitavelmente traz. Convertendo a renúncia em doação, seguindo o exemplo destes 3 santos caseiros, podemos assemelhar-nos a Jesus, que “tomou o pão (o seu corpo), deu graças e deu-o aos seus discípulos”, encaminhando-nos para a glória da Ressurreição Pascal.